segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

A pirata invisivel [repost]

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1.
A pirata invisivel encontrou um maleiro negro
com dois metros de olhos bem grandes e verdes
com cinquenta e um camelos monstros mais quatro helicópteros,
quatro bicicletas voadoras quatro porcos a andar de bestacleta com asas

2.
Uma tarde de sol e praia na balada
um bom drink uma boa conversa uma boa piscina
P'ra tudo acabar bem:
umas lentes azuis para ser gémea com ela

3.
Visitar museu, conversar na galeria, comprar lotaria
de corrida de cavalos para apostar.
Quando chegava a hora dela chegar
                                             eu dizia:
-- Eu faço teatro mas eles não me dão o papel,
    vou tomar banho e vou embora e volto depois.

4.
Quando ela descobriu e ele descobriu
eu disse: - Batatas para o trabalho!
Ele o maleiro negro de olhos verdes a mim escolheu
Eu tive a desforra e ela não mais comigo falou

5.
Balada todos os dias
A vida que ela não teve
Mas eu pensei no menos que havia no mais,
limusine mandada vir para me controlar?, disse:
- Jesus jenésio cachorro cash
Onde é que eu estou?
Pá, quero a minha liberdade!

6.
É por isso que eu vejo muito filme de terror
Se achaponou dansou
Aqui se faz aqui se paga
Foi ela quem dansou
Mas eu me lasquei no fim
Ele foi para debaixo da campa
e eu estou aqui de penico cheio p'ra contar a história.
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Anónim@ do século 23

quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

sábado, 18 de dezembro de 2021

As camisas de dormir

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19h 38min

Acabo de jantar, tomei café de cápsula e quero escrever mas, hoje e agora, não tenho tempo, tenho de sair daqui a pouco para trabalhar, tenho de escrever um pouco sobre a cega dona A, ela não o será de nascença, terá cegado por causa dos diabetes, a cega vai-se embora, o quarto que lhe está prometido noutro lado fica vago no fim do mês, ela ameaçava sempre que se iria embora mas chegava ao início de um novo mês e renovava a mensalidade, desta feita, há três dias, o patrão da casa, senhor Ja, depois de eu entrar ao serviço, disse-nos para o acompanharmos e bateu à porta da dona A, disse-lhe e nós ouvimos: 
-- Dona A, os meus funcionários recusam-se a ajudá-la mais, a senhora tem-nos acusado injustamente, tem incomodado os outros hóspedes com a sua voz alta, tem feito queixa de nós à vizinhança... por isso, peço-lhe que a partir de amanhã procure um novo sítio para ficar e a gente devolve-lhe o dinheiro que já pagou.
-- Não posso sair amanhã, a senhora que me prometeu quarto diz que só depois do fim do ano, e não é verdade que eu tenha falado mal ontem: só queria que me tivessem ligado a televisão!

Aqui, precisaria do tempo, que agora não tenho porque tenho de sair e caminhar para a paragem do autocarro, para explicar como se chegou a uma expulsão a prazo e por mútuo acordo: 
Numa manhã, às seis horas fui acordá-la como habitualmente batendo-lhe à porta, ela respondeu-me num tom de voz agressivo, talvez tivesse dormido mal, pensei. Às oito na hora de lhe aquecer o leite com cevada, ela reclamou que estava frio e recusou que eu lho fosse reaquecer, disse que o ia deitar fora, recusou que eu lhe guardasse no esconderijo a cevada e disse-me para eu lha dar para a mão, ela própria a guardaria, depois repararei que ela nos estava a acusar de lhe termos roubado as camisas de dormir.
-- As camisas de dormir... ó dona A, quem lhe quereria as camisas de dormir?
Para ela foi o limite, já se havia queixado que lhe roubaram um casaco, e que lhe tentaram arrombar o cadeado de um saco, outras vezes queixava-se da falta de limpeza e pedia-me para eu lhe pôr lixívia na sanita, e se do saco se pode dizer que estava super cheio e que se estragara devido ao modo como nele pegam... do casaco nem sinal, nunca se soube se não seria um que ela lá tinha e estava a inventar um casaco roubado ou se ele estaria perdido num esconderijo qualquer, ninguém lhe quereria nem o casaco nem as camisas de dormir.
Contei o que se passou à senhora Ai quando ela chegou para me substituir, ela disse que a dona A teria de se ir embora, que já nenhuma pensão a aceitava. Fui para casa descansar e voltei à noite, fui ao seu quarto ver se ela precisava de alguma coisa, ela berrou Não, que tinha comido a sopa fria, berrou para que eu lhe apanhasse a roupa da corda e lha pusesse na janela. Como passava um hóspede no corredor, eu deixei-a a berrar sozinha, fechei-lhe a porta na cara e fui apanhar-lhe a roupa, ela queria como muitas vezes a porta aberta e ficou ainda mais fula, eu voltei com a roupa seca para lha entregar e ela não me abriu a porta, vingou-se e mandou-me colocar a roupa na janela do seu quarto que dá para as traseiras onde a roupa seca, sempre aos berros, aqui eu não disse nada, fiz o que ela mandou mas fiquei a pensar que ela é má, que não pode berrar aos funcionários nem aos outros hóspedes, que ela está a retaliar, a abusar da confiança que lhe dou: não a ajudo mais nem que esteja a morrer!, pensei. Voltei ao pouco serviço, terminado este sentei-me no sofá a ouvir rádio. 
Por volta da meia-noite, comecei a ouvi-la de novo aos berros, decidi ignorar mas o sr. Ju ligou para a recepção dizendo: sr. Ru, cale-me esta mulher. Obrigou-me a tomar uma atitude e eu fui calá-la, como estava fodido com ela, primeiro ameacei chamar o patrão e ela disse que ia fazer queixa na polícia, depois disse que ela não deixava os outros hóspedes dormir e ela disse que eu só dormia, até que só resultou à bruta: berrar mais alto que ela, sem a insultar calei-a, mas senti-me mal porque fui obrigado a ser autoritário.
( Depois continuo...)

21h 27min

Já estou ao serviço, estou sentado no novo sofá de descanso, hoje nada tenho para fazer além de eventualmente receber novos hóspedes, com a covid a casa está quase vazia, por isso tenho tempo para terminar o texto, ia no ponto em que recorri ao grito para calar a cega, ela dizia que o W é que era bom para ela e eu berrava o mantra: a senhora pode falar mais baixo!, ela dizia que eu dormia e eu repetia o mantra, ela abria a boca e eu berrava o mantra, até que ela desistiu e calou-se e deixou a casa em paz.
De manhã quando o chefe chegou para verificar as contas eu disse o que se havia passado, que não ajudaria mais a cega, que lhe havia dito: eu não sou seu criado.
-- O senhor disse isso? Fez muito bem, diga tudo à minha filha quando ela chegar. Foi o que fiz, ela falou que o W roubava o patrão, que a dona A teria que ir embora de vez, eu disse antes de sair do trabalho: a dona A é mal-agradecida, mal-educada e mentirosa.
À noite, o patrão foi ao quarto dela e falou-lhe, disse que ela tinha de sair, ela disse sim e defendeu-se dizendo que só bebe uma garrafa por noite, lá lhe chamaram à atenção sobre o efeito do vinho, ela disse que só tinha querido que lhe ligassem a televisão. 
Passaram-se três noites e não me senti muito bem comigo próprio, até comentei com o sr Ju que saio à minha mãe quando quero ajudar alguém mas que saio ao meu pai quando me zango. Não a ajudei mais, as minhas colegas de trabalho do turno do dia começaram a fazer alguma coisa mais pela cega e a não deixar tudo para à noite eu fazer, o patrão ia-me falando que era uma obra de caridade eu ajudá-la, até que ontem, a cega chama por mim às onze da noite.
Sem nada para fazer e para ela deixar os hóspedes descansar, fui ter com ela e ver o que ela queria. Ela estava a pedir para lhe ligar a televisão, falou baixinho, depois pediu que eu a voltasse a acordar de manhã e lhe levasse o leite e a levasse à rua pois ela tinha uma consulta. Lá fiz tudo isso, hoje até lhe fiz uma visita guiada: agora está a passar no coberto onde se põe a roupa quando chove, agora está a passar à frente da sua janela, a sua roupa fica sempre em frente da sua janela, o portão é agora, cuidado com o degrau, chegamos ao passeio, eu entrego os taparuéres, logo à noite voltarei para ver se precisa de alguma coisa.
Hoje à noite, disse à colega que eu substituo à noite: voltei a ajudar a ceguinha, ela falou de modo educado. Ao chefe e patrão sr Já disse: eu estava com um pouco de remorso. Ele respondeu: ela é mazinha, ela vai até onde a deixarem ir, não deixe que ela abuse.
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Claudio Mur

terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Um agradecimento sincero

A pessoa em questão sabe que lhe agradeço, transcrevo de um livro que ontem me ofereceu:

"O artista só é artista se for duplo e se não ignorar nenhum fenômeno da sua dupla natureza"
Charles Baudelaire em "A essência do riso"

No livro "Doble" de Saguenail na editora Exclamação

Um dia haverá exposições de flores no nevoeiro, preveniu-me numa k7 a voz do Cesariny

sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

Navegação e floresta

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Ainda fica por apontar a possibilidade de um erro -- estamos a pensar na confiança na imaginação pura. Conceda-se que ela conduz à vitória espiritual. Mas isso não pode depender da fundação de escolas de yoga. E, no entanto, é essa a ideia não só de numerosas seitas, como também de uma espécie de nihilismo cristão, que dá a coisa de barato. Não, podemos, contudo limitar-nos a reconhecer o verdadeiro e o bom nos andares superiores, enquanto na cave a pele é arrancada ao próximo. E também não o podemos fazer, quando nos encontramos espiritualmente não só em posição mais segura, como também numa posição superior, e isso porque o sofrimento inaudito de milhões de escravizados brada aos céus. O fumo das cabanas dos algozes ainda está no ar. Coisas destas não se encobrem com farsas.
Não nos é dado, por conseguinte, demorarmo-nos na imaginação, mesmo que seja ela a dar a energia fundamental às acções. Uma uniformização das imagens e uma decadência das imagens precede a luta pelo poder. Esta é a razão pela qual nos instruímos com os poetas. Eles iniciam a subversão e também a queda dos Titãs. A imaginação, e com ela o canto, pertencem ao passo da floresta.
Vamos regressar à segunda das imagens por nós irmanadas. Quanto ao mundo histórico em que nos encontramos, ele compara-se a um veículo que se move rapidamente e que ora mostra sinais de conforto, ora sinais de horror. Umas vezes é o <Titanic>, outras o Leviatã. E é porque aquele que é movido é enganado pelos olhos que, para a maior parte dos passageiros do barco, continua a ser um segredo pertenceram ao mesmo tempo a um outro reino, no qual prevalece a tranquilidade perfeita. O segundo destes reinos é tão superior que conteria em si o primeiro à maneira de um brinquedo, como um daqueles casos cujo número é infinito. O segundo reino é porto, é terra natal, é paz e segurança, que cada um traz em si. Chamamos-lhe a floresta.
Navegação e floresta -- pode parecer difícil unir numa imagem duas coisas tão longínquas. A oposição é mais familiar no mito, assim Dioniso, raptado pelos barcos tirrénicos, faz as videiras e a hera cativar os remos e brotar pelos mastros acima. Da sua mata espessa irrompeu o tigre, que despedaçou os raptores.
O mito não é uma pré-história; é uma realidade intemporal, que se repete na história. Conta-se entre os bons prenúncios o facto de o nosso século encontrar de novo sentido no mito. Também hoje o ser humano é arrastado por vigorosas potências até ao alto-mar, até ao fundo do deserto e do seu mundo de máscaras. A viagem perderá o seu carácter ameaçador, se ele se lembrar da sua força divina.
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Ernst Jünger
em 'O passo da floresta", páginas 50 - 51
Tradução de Maria Filomena Molder
Edição BCF Editores

segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Últimas palavras atribuídas a manuelle biezon

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Eu justifico-me ou com as melodias em papel areia de gudrun dh virgin prune lawrence ou com as palavras do blixa: mein kopf ist ein labyrinth mein leben ist ein minenfeld.

A minha violência é sobretudo mental, sou mais parecido com um cão que ladra do que com um cão que morde, eu sublimo a violência do tó desabafando ao papel, não me fico pelo oral insulto gratuito de expulsão quase vómito, passo para o papel e envio por carta registada às vezes em linguagem de insulto, às vezes em registo formal conforme a emoção do polícia interno de folga. Se sou doente maluco não me escondo na doença dizendo que não me lembro do que fiz. Claro que não me posso lembrar de tudo, aliás produzo a prova, a evidência do meu próprio acto, do meu erro perante a lei, posso não gostar da lei mas não me faço vítima dessa lei. Boicotemos a cultura do chui e comecemos pelo nosso superego!

Sei hoje em que lado da barricada poderei estar quando um bófia reprimir as verdades e os desejos de um futuro e em que café estarei quando um serviço de ordem de um sindicato reprimir as verdades e os desejos de um futuro.

Sei que, às vezes, não é possível aceitar o contrato social.

Sei que, se fosse bajulador, talvez vendesse livros brochados e pudesse ser considerado um «escritor a sério».

Sei que poderia ter muitos amigos se os que em mim procuraram mel não tivessem sido mandados à merda.

Sei que a minha técnica é fraca. Sei que me vão faltando ideias absurdas para livros onde falta a conveniência pessoal.

Sei que sou o possível que posso ser, sei que tentarei ser qualquer coisa mais e sei que prefiro ter uma cana de pesca do que jogar na lotaria para tentar Ser.

Não sou pedinte por enquanto, vendo um produto quando preciso de ir ao supermercado mas não me quero sentir um produto, apenas um produtor e não apenas um dealer de techno em timbuktu ou em qualquer derza deste planeta.

Sei que posso não ter uma razão científica para o que penso, para aquilo que escrevo parecer replicado com nuances em realidades que se tornam conhecidas pelos mass media.

Sei que tento fugir à noção hermética «algo de bom acontece e algo de mau se replica».

Sei que assumindo-me como zmb o zumbi, transcendo esta definição de morte a cada momento que vivo e que se eterniza pelo uso daquilo que chamam de aspirinas para reescrever ecos de um passado não tão distante assim.

Alguém que parece personagem de filme, ecos de uma casa que renasce a cada momento, a ilusão numa fé ou qualquer outra espécie de esperança, em algo vindo de dentro e expandindo-se para ti num local onde respiramos em comum, um local cheio de estrelas…

moon shine and moon landing, estrelas e asteróides em constelação dizendo ser possível viver cada momento como se este fosse único,

ecos de memória como se esta existência não tivesse fim, tigre! tigre!,

a cada momento perdido no tempo e deslocalizado recebendo feedback sem destinatário assumido e quão ilusório é ser comentado.

Às vezes, não passo de um potencial instrumento jogado na arena a bel prazer conforme as circunstâncias.

Antes de ser pó, gostaria da gratificação pela possibilidade do dia eterno. Depois de verdadeiramente pó, serei apenas pouso de abutres, um hobo sem qualidades de futuro acesso livre no archive ponto org.

Eu sou mais que a minha função mesmo que, às vezes, perdendo a minha noção de função, pense que não existo porque quem não aparece não existe, eu não pertenço nem aqui nem a ti, pertenço à grande nação zumbi vinda de marte, como eu prisioneira do verbo liberdade, das facas esquizóides do indivíduo e dos gunas dependentes do social.

A verdade é que nunca ouvi vozes dizendo-me para esfaquear, a minha violência é mental, sou apenas um cão que ladra e, entre eu levantar a saia da marlene na caixa do minipreço em pensamento e o acto de efectivamente o realizar, vai uma distância que só estudando bem o objectivo tal alguma vez se concretizará, eventualmente, a canábis tem a sua função de divindade, de intoxicação, de quality time imaginal. Se imagino não preciso de o fazer. Poderei não ser aquilo que escrevo mas escrevo a maior parte das vezes o que quero volver.

Desde que se descobriu que deus não era um só e podia ser qualquer um de nós, desde que a verdade se relativizou democraticamente, não me desejo vítima nem de mim próprio. Serei talvez um género em evolução dentro de mim próprio.

A sequência da minha narrativa pode começar em alhos e terminar em bogalhos dando a ilusão de um artifício começando no nome de um morto-mas-vivo, aquele estado tanto dentro tanto fora da realidade, da sociedade. A psicose de sentir o imã do meu próprio ser faz-me intuir talvez que me desejas numa passerelle de jet set literário mas opto apenas por passar ao lado nem que, por causa disso, te não tenha.

Eu não sou um anjo nem um santo nem um profeta tendo a ilusão de vir salvar o teu mundo, eu não sou já nem resistente nem desistente, apenas resiliente: eu sou apenas eu e sou já alguma coisa vencida a culpa, o remorso, o ressabiamento.

Tenho uma causa, um programa privado, pessoal e de consciência psicológica e social, eis o manifesto de um só subscritor: às vezes, ponho-me a pensar se as minhas palavras não são escutadas pela percepção do cliente regular. Às vezes, sinto que transmito as minhas mais secretas ideias através de telepatia inconsciente julgando pelas palavras recebidas através do regularmente diário feedback. Às vezes, é difícil sobreviver a coincidências estranhas no que digo passado e observo futuro mas… encontro já a saída e começo a ver a luz. Não me sinto já influenciado por ninguém que não eu próprio, afasto-me do feitiço mesmo que ninguém que não eu próprio o tenha lançado. Não acredito, apenas porque não o sei explicar, mas escrevo que a minha mente é uma onda cool de rádio emissora e retransmissora, um tributo à get-out-of-bed radio, toda uma literatura já escrita, não sonhamos todos com um ficheiro secreto? A verdade é que posso psiquicamente intuir o manifesto que the shamen me oferecem aos ouvidos então com dezoito verões, partilhá-lo mesmo contigo: my kind is yours omega amigo for you I will always have time.

De igual modo se, por acaso, virem no vosso bairro o tone malaiko vendendo qualquer zine ou mesmo uma boneca insuflável — para que cada cruco tenha o seu mur — troquem com ele uns ossos e a moeda, vá lá!, como taxa de sacrifício. Ele saberá como muitos rir-se de ter perdido o medo de viver fragmentado, de lhe chamarem de louco ou drogado ou até mauricinho, estes ding an sich são sempre úteis mas relativos, absoluta será a moeda para nós, os tones. Claro que assim, ele ou mesmo eu poderei ir buscar o meu genuíno meio conto de kenga e, para tudo o que verdadeiramente interessa, haverá sempre fêmeas que me completem. Se não as houver, inventá-las-ei pela imaginação: uma fêmea será sempre uma fêmea, uma mulher invisível um dia tornar-se-á real. Fiesta! Um desejo imortal.

Oub’lá filho se eu, teu pai fantasma sideral e adoptado, posso até nem ser descendente de qualquer raça mítica ou mitómana, a verdade é que não sendo cigano sou tratado como cigano apenas pela aparência de inteligente mas com um modo de vida pouco esperto. Num país que não gosta dos amigos de jacques leonard, eu posso até tentar adaptar-me a esse mundo porque preciso de trabalho mas este mundo só me aceita quando eu consentir em deixar de ser quem sou, e quem sempre quis não parecer, para simplesmente passar a parecer um deles porque um escravo nunca é, apenas parece e quem não aparece não existe, está nos livros.

Por isso, meu filho aprendiz de fantasma, como disse a doninha em celebração no hard club há muitos anos num anterior fim-do-mundo: se queres respeito puto dá-te ao respeito [,respeita] e assim terás o respeito a que tens direito.

Quidditas?, haecceitas. O que é? É isto.

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manuelle biezon

sábado, 4 de dezembro de 2021

Código de conduta

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Acaba de tocar à campaínha o novo hóspede, um cliente antigo chamado J, abro-lhe a porta e, lembrando-me do comentário quase desabafo da dona A na noite anterior, digo:
-- Sr. J, se o senhor a meio da noite ou a qualquer hora quiser beber uma cerveja e eu estiver a dormir... o senhor chame por mim, não há-de ser por eu estar dormitando que você não vai beber, chame por mim, eu atendo-o e vendo-lhe a cerveja, ok?
-- Ah, sr. Ru, obrigado, ainda ontem... devia ser meia-noite... estava sem sono e apeteceu-me... mas depois pensei: o sr. Ru deve estar a dormir...
-- Oh, sabe como é, são muitas horas, a gente encosta a cabeça, os olhos fecham, passo pelas brasas. Mas eu estou aqui para trabalhar, dormir durmo quando saio e chego a casa.
-- O sr. mora aonde?
-- Agora voltei para casa dos meus pais, morei dez anos em Derza em quartos, cansei-me das rendas e da solidão...
-- E então... e a mulher?
-- Não, mulher não tenho, o mais parecido com namorada é uma amiga especial que eu tenho...
-- Filhos tem?
-- Nenhum, sou livre!
-- O senhor sabe inglês?
-- Sei.
-- Vá-se embora daqui!
Eu percebo que ele quer dizer que eu sou sobre qualificado para este trabalho e digo: -- Não! Eu estou bem aqui, há dias falou das condições fracas do meu descanso, o sofá, o frio e tal, não se preocupe, eu estou aqui bem!
-- Olhe, eu há dois anos estava em Inglaterra e desde então... já me divorciei, já namorei, já casei, já fui ao Brasil... quando lá vou fico no hotel do money, aquilo é que é, tem prái 100 quartos, bons pequenos-almoços, foi em Fevereiro, telefonei de lá para a dona A pedindo um quarto e depois cheguei a Lisboa, não tinha telefone mas tinha a reserva...
-- Por isso lhe digo, sr. J, e já aconteceu antes: o sr. chegou, fez um pouco de barulho e eu acordei e servi-lhe a cerveja... por isso, se precisar, pode até... não, claro que não, ignore a minha sugestão de me dar um pontapé, chame por mim: sr. Ru, se eu não ouvir chame de novo e eu acordo, ok?
-- Estava em Inglaterra e a mulher disse que me ia deixar e eu disse tá bem que sa foda vai-te embora, não havia trabalho, veio a pandemia e eu disse: vou visitar a família, estive aqui dois meses, depois arranjei uma namorada da Covilhã mas ela já pensava em casar e coisa e tal, até que estava numa garagem maior que este hotel, numa festa em casa da minha irmã, cerca de vinte homens a dizer asneiras e eu disse que sa foda, vim fumar um cigarro e encontrei-a, casei, ela até já dormiu aqui e tudo.
-- O sr. sempre vai querer uma cerveja?
-- Sim, quer uma para si?
-- Não, obrigado, mas não bebo em serviço.
-- Se eu lhe pagar a cerveja, isso não significa que vou dizer ao patrão...
-- Claro que não, mas a gente tem de ter duas caras, aqui no trabalho não bebo, lá fora é outra coisa, é o meu código de conduta.
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Claudio y

quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Entrada dia 26, 10h 24min

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Hoje, escrevo a esta hora da manhã porque estou sem sono, recebi no autocarro há meia hora um telefonema do meu último vizinho em Derza, ele perguntando como fazia eu para pagar a conta da luz, expliquei e aproveitei para lhe perguntar por um quadro em pano cru: O Aprendiz, não o encontro comigo aqui e talvez o tenha deixado lá na mudança, ele confirmou que eu o deixei mas não garante que ele, quadro, ainda exista, após a minha saída o quarto recebeu obras e agora está ocupado por um casal de activistas trans, ele disse que ia ver e que depois informa, tentei saber de um burrofone Nokia que também me falta mas ele não se recorda.
Enfim, se não me avisaram até agora, e já passaram quase dois meses, que lá deixei um quadro na parede, também deram sumiço no burrofone que já funcionava mal nem tinha cartão sim, mas tinha mensagens e números de telefone e era ainda um gravador de áudio, dava jeito não o ter perdido, ocorre-me que ainda não verifiquei todos os bolsos dos vários sacos de viagem, quem dera que lá estivesse, talvez sim talvez não, senão mais um dano colateral da década em Derza, a saber: um minidisk, uma máquina fotográfica, um caderno A4 inteiro com desenhos a pastel, um computador, tudo roubado, e agora, mais um telemóvel e um quadro em pano cru, roubado ou desaparecido: kill yr ídolos, rob them, mata os ídolos e rouba-lhes a glória, era a juventude e a sua ideia, quando novo alguém até me contou que apalpou os guizos do Burroughs velho em A'dam quando ele lá ia abastecer. Agora, mais velho, verifico que já me estou tornando um ídolo, ou pelo menos um trouxa com alguns valores mobiliários apetecíveis para serem esmifrados, sinal dos tempos: de miúdo de rua a tio na mata: mudei mesmo de vida.
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Claudio Mur

terça-feira, 30 de novembro de 2021

The Valley of Fear, after AOS

 


«The Valley of Fear»

desenho a caneta-pena de preto permanente

sobre papel de 350grms e colorido com pastel de óleo

50cm por 70cm

2021

ZMB a partir de 

2 desenhos de Austin Osman Spare (AOS)


sábado, 27 de novembro de 2021

sexta-feira, 26 de novembro de 2021

Um momento de trabalho

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Terminei o trabalho regular do turno, estou agora sentado no sofá de descanso junto à recepção, de trabalho extraordinário tenho o chá de cidreira grátis e a roupa seca na máquina de secar que vou levar daqui a uma hora à ceguinha, a dona A. A razão porque faço este trabalho off-the-record é ter começado a chover e ela precisa da roupa seca amanhã de manhã. A razão do chá é para a compensar de ontem, fiz hoje a paz com ela, ela disse que ontem chorou depois da zanga, eu disse que hoje só consegui adormecer por volta do meio-dia após o fim do turno, disse hoje que ela ontem parecia a minha mãe, sempre a querer ajudar, a fazer-se solícita, a dar mais do que a gente precisa, ela ainda insistiu mas já com um tom moderado para eu levar uns iogurtes que lhe deram, eu disse não, outra vez, disse:
-- Para bem da nossa saúde, eu não quero zangar-me mais com a senhora, por favor, eu sou aqui funcionário, a senhora é uma hóspede, não tenho que aceitar prendas, compreenda...
Depois, ela falou do Sr. J do quarto ao lado, eu disse: -- Foi-se embora hoje, não era boa rês.
-- Ele entrava-me no quarto e roubava-me o vinho.
-- Por isso lhe tinha dito para fechar o quarto com a chave.
-- Foi o que passei a fazer...
-- Pronto, dona A, passo daqui a uma hora com o seu chá mais o taparuére lavado, até logo.
Há dias, comentei com a sra. A: -- A dona A quer ir-se embora, diz que arranja mais barato e que o quarto é frio.
-- Ainda ontem mandei pôr lá um cobertor...
-- Eu disse-lhe: Além da janela aberta onde põe a roupa para a gente pôr na corda, a dona dorme com a porta aberta para o corredor, faz corrente de ar, ainda apanha uma constipação; e depois, sra. A, disse à dona A assim: as personagens, os outros hóspedes no corredor não precisam de a ver dormir, por isso, feche a porta durante a noite, sim?
-- Sim, sr. Ru, fez bem, é difícil, a dona A é complicada.
-- Ela diz que se vai embora mas o problema é o dinheiro, senão ela ficava aqui bem.
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Claudio Mur

quinta-feira, 25 de novembro de 2021

Coil ‎– Circulating


boa tarde mundo, de volta aos clássicos: 

«I am the queen of the circulating library 
I am here to answer your enquiry 
You cut down trees to make paper disease 
Return The Book of Knowledge 
Return the marble index, 
the mothership and the fatherland 
Words Words Words»

terça-feira, 23 de novembro de 2021

Corim Coriscos Carreiros, um lugar de lembrança


Com música de Xano Cigano e Cidália Moreira. * "O lugar é, por fim, necessariamente histórico a partir do momento em que, conjugando identidade e relação, se define por uma estabilidade mínima. Histórico, pois que aqueles que nele vivem aí podem reconhecer pontos de referência que não têm de ser objectos de conhecimento. O lugar antropológico, para eles, é histórico na medida exacta em que escapa à história como ciência. Este lugar construído por antepassados («Mais me agrada a residência que os meus avós construíram...»), que os mortos recentes povoam de sinais que é necessário saber esconjurar ou interpretar, cujas potências tutelares um calendário ritual preciso desperta e reactiva a intervalos regulares, está nos antípodas dos «lugares de memória» dos quais Pierre Nora escreve, em termos tão justos, que neles aprendemos essencialmente a nossa diferença, a imagem dd que já não somos. O habitante do lugar antropológico vive na história, não faz história." Marc Augé em «Não-Lugares», página 50 - 51, tradução de Miguel Serras Pereira edição (em Portugal) da Letra Livre

quarta-feira, 17 de novembro de 2021

Reconhecer o fascismo dentro de
[insert name]
e reconhecer a própria maldade,

 comunicá-la violentamente e logo reconhecer a estupidez ou a loucura ou a doença, saltar fora finalmente após receber a ajuda de um músico-filósofo que me leu e respondeu, usar uma experiência de género para me tornar tolerante, e escrevê-lo desde a raíz para que alguém me compreenda mas não siga os meus passos para a cruz:

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Um palhaço guna adicto social, feio, já sem dentes ou aparência, mistura factos e verdades de outros com a sua própria merda e cura-se!

Curo-me quando descubro iguais como eu, só vendo iguais me aceito aceitando-os, os irmãos que nunca tive e dos quais sempre desconfiei por me cheirarem a falos de autoridade. Recebo resposta que, a seu tempo, me faz compreender e libertar do meu fascismo sexual, afinal o resultado torna-se importante, libertam-me as palavras da genealogia adoptada, as quais à ofensa não responde com outra ofensa, transcrevo as palavras deste loving gentleman: 

«Hi irab It seems to me your memories of the past with this person are messing with your head. Forget him. Let it go. He’s no longer important. Enjoy the present moment, reading this message. Play music that makes you fell good, not sad. Later tonight, fuck or be fucked by the people you love (whatever colour, size, gender, you prefer). Believe me, It’s much nicer. Have fun.»

Esta honestidade, que não deve ser confundida com qualquer emoção sexual futura, liberta-me. A verdade é que há uma capoeira que diz que a saudade pode matar, a saudade de uma terra natal que na música se diz «amigos e família» e que na realidade não passa de: esquema e classificação. O real de um mundo em que um troglóbio como eu se tem de inserir nem que seja à força… a verdade é eu posso aceitar uma terra não cartografada e visitá-la sem nunca aderir ao seu programa, sem nunca ter saudade. Assim e a partir do momento em que o compreendo finalmente, a gata negra manuelle biezon morre, aqui hoje, verdadeiramente após ter escrito tão somente um poema, uma ode às borboletas em versão meio puccini meio cronenberg. A ela lhe atribuí uns quantos  textos mais por afinidade: imaginei o necessário.

Talvez seja agora possível reduzir o consumo desta aspirina, desta experiência metafísica de género que usei como alívio do stress pós-catástrofe.

Sabendo que se fosse essa a minha orientação, se o quisesse, se fosse mesmo esse o meu desejo, essa minha vontade poderia tornar possível a experiência.

«Sou livre», uma pessoa respeitou as minhas palavras mesmo sendo elas psicóticas, uma pessoa deu-me o conselho mais útil que poderia ter recebido. Poderei ser aceite se ainda for possível o mundo aceitar-me e comigo fumar o cachimbo da paz, se ainda for possível imaginar e, por força da vontade, inventar uma terra, um covil, um ser com quem me unir… no mínimo partilhar uma intoxicação momentânea: azul-de-terra.

Este amor está acima do género sexual, é simples convívio ou amizade, respeito, aceitação, a comunidade de indivíduos em igualdade, cada um com o seu fetiche, o seu peculiar modo de mandar o mundo à merda. Somos todos boas pessoas se nos deixarem estar em paz no nosso canto, um canto abre sempre um ângulo para o mundo. Amigo, às vezes partilho um charro e a tua dor. Amiga e mulher, o riso é terapêutico, fuma comigo, olha que serei um cruco adorável se verdadeiramente me procurares, far-te-ei sempre uma vénia quando me vieres visitar.

Descubro a minha causa, o meu pau de bandeira e fé, sei já qual é a minha fé a utilizar, começo a opinar em defesa da causa, digo panfletário: 

Não vejo problema em ser-se choné, quanto a parecer será talvez uma questão de preconceito, eu nos meus melhores dias não pareço e sou, pelo menos o diagnóstico é esse. Visto que me identifico muito com a narração na primeira pessoa ponho-me muitas vezes em confronto com essa ideia, e da minha boca sai uma ideia que dialoga num espelho imaginário com uma boca dizendo, nem sempre, uma contra-ideia. Não acha que devia haver uma máquina que escrevesse momento a momento o nosso pensamento? Uma máquina com um botão ON/OFF para termos uma pausa para um cigarro e tudo o mais. Os poucos cigarros que pedi desde a chonézação foram pedidos ou com alguma vergonha por não ter dinheiro ou foram cravados com algum brilho nos olhos em noite de borga, nem sempre com dinheiro no bolso. Agora estou melhor visto que trabalho e dinheiro para onças e papéis conquistador não faltam nunca. Fumar é para mim um prazer. O maravilhoso de se ser choné é que muitas vezes não precisamos de mais ninguém para fazer a festa. O problema é lidar com o excesso de informação — daí a importância do botão on/off. 

Tentem rir do absurdo, existe algo que não pode ser dito... existe algo que só a poesia pode dizer… existe algo que só a loucura pode admitir… existe algo que leva as pessoas a ter medo de dizer… existe algo que pode levar as pessoas à loucura, à prisão... existe algo que só os loucos e a poesia podem admitir e dizer e querer dizer e querer explicar a verdade. E que verdade é essa? Procurem na poesia… procurem na loucura… procurem na música… procurem na cabeça radiotransmissora de shostakovitch. Procurem na electricidade, no éter, na rádio, na tv e pensem no que poderá significar «iluminado». Quando descobrirem enviem relatório para este ateu esquizofrénico e para que se prove a existência de deus e 90% viva das esmolas! Oh and by the way, I am not an islamist but yes I am interested in sufism and that’s just one part of world philosophy, that’s all.

Todo o louco é fascista sem o saber, todo o homem é um grande paneleiro e reprime o medo de o ser, toda a mulher gosta de crucificar o amante mas desfalece viúva e raivosa sempre que o amante faz planos de seguir o seu caminho sem ela e ou por causa dela, todos nos insultamos fascizoidemente. Até o homo normalis é fascista quando manda trabalhar os outros mas… como dá de comer a alguns desgraçados toda a gente assobia para o lado e culpa o desgraçado por ter fome: somos a borra do café. O grande, ao ver que o vimos na rua, vira-nos as costas com indiferença. O remediado inveja a liberdade e diz que cada um tem o que merece. O pequeno rosna ao pensar que lhe vamos roubar o arroz de moelas da caridade.

Só se sai admitindo esta verdade, indo ao fundo mas dizendo-o a si próprio antes de o escrever, antes da terapia de ex-anónimos para que alguns o possam compreender, para que outros sintam conforto em sentir as suas estórias choradas com palmadinhas ou oferta de lenços de papel, este falhanço e esta culpa de existir, a lucidez vem por si, há dialectos que dizem: os paneleiros foderam-me o cabedal, e se esta expressão é racista conservadora, o que no facto quer dizer na maior parte dos casos é: o polícia passou-me uma multa, o estado roubou-me o subsídio, o cabrão despediu-me, ou seja, de tanto significar a palavra tornou-se quase um insulto gratuito, seu paneleiro do caralho axantra a mula, sem sentido que só leva a contra-respostas: não te trates que eu não quero. Vai-te tratar. Cheiras mal, estás cego!

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manuelle biezon

terça-feira, 16 de novembro de 2021

Resumo das últimas semanas

 Pois é, arranjei emprego num hostel, turno da noite. Estou a sentir-me bem e realizado: os patrões gostam do meu trabalho, as minhas colegas dizem que eu sou boa pessoa, os hóspedes até já deram feedback positivo no booking-ponto-com ao senhor do turno da noite (eu). Este Domingo, uma senhora moçambicana ao fazer check-out às 7h da manhã perguntou-me se eu conhecia castanhas moçambicanas, eu disse não e ela ofereceu-me um saco delas. Cheguei a casa e mostrei ao meu pai, é outra novidade: cansado das rendas altas no Porto voltei para casa em Rio Tinto e estou-me a sentir como um filho pródigoo, sobre as castanhas o meu pai fez-me rir, ele disse «é preciso ter cuidado, pode ter veneno...» Lá está, o medo do Outro, o meu pai ouve dizer que há terroristas em Moçambique e pensa todos por igual. «Mas ó pai, ela deu-mas para agradecer o meu serviço, afinal chamei-lhe um táxi mais barato que a uber e servi-lhe chá de cidreira várias noites às 4h da manhã, lá todos os hóspedes gostam de mim!»

E é isto, comprei um novo caderno de desenho, em baixo os 3 primeiros dibujos:





sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Reading manuelle biezon to the sound of rádio paralelo online

 


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«… e a certeza de ser já só meia psicose meia neurose e difíceis condições de vida, queremos viver depois de termos desaparecido da grid socioinstitucional, de termos morrido como pessoas úteis, já velhas para o trabalho, há muito tempo a tentar a entregar o cartão de sócio do partido dos desadaptados da sociedade de consumo…»

Por isso, desejo voltar trinta anos depois mas verifico o erro, é tarde demais. Não consigo deslocalizar a grande obra sem deixar danos como debris na auto-estrada, um assassinato por embriaguez da imagem de nós dois transformando-se num pensamento em espiral descendendo desde o divino até à mais rastejante malícia que me chega na forma de uma gata negra mura pedindo alimento, o espírito realizado como carne pedindo comida:

uma lata de sardinhas bom petisco hein?!, o melhor que a minha alegria consegue realizar. Foges abrindo cirurgicamente um buraco como se uma assaltante de bancos sejas ao fim de uma noite de mios e vais à procura de novo dono, eu não quero ser dono de nenhuma, só gosto é de não ser pau mandado de vampiras de bigodaça invisivelmente neurótica, pau mandado da santa anamnese recolhendo sem o desejar informação para os moinas do curral de moinantes e brochistas caloteiros de clio sessenta e cinco fora do registo oficial de viaturas em circulação. Chegam e perguntam quem na varanda de janela aberta pia como um pintassilgo da raça marguerita. Ficamos todos pasmados. Como é possível? Não tem qualquer utilidade dizer-lhes que não existe tal espécie de pintassilgo mas é fácil de adivinhar: fumam o produto apreendido. Fazem mesmo dinheiro com ele. Merz.

Ouço babi yar, a décima terceira do vitch shostakov e fumo um grande cagalhão.

Vejo um padre verde azul pensando em foder a freira. Vejo o flinstone, o católico comunista e cadastrado, pensando que vive ainda na idade média. Sempre todos os junkies andam de táxi, eu que o sou ando a penantes e, às vezes, aproveito a comissão que cobro e compro uma lata de salsichas e misturo-a num arroz de ervilhas. Acho que pedro foi crucificado numa cruz invertida. Os romanos tentaram esmifrá-lo. Ponto. Talvez não tenham tentado esmifrá-lo. Talvez sim mais ou menos talvez tenham tentado esmifrá-lo com um clio sonic cinzento ou, pelo menos, é o que me parece na associação. Não estou uma vez mais lá e, às vezes, esta patológica incapacidade de estar lá, e ser até o mártir simulado de quem todos se demarcam, faz-me pensar que nunca ninguém contará a minha história zeligiana. Eu, às vezes, suspeito que essa história existe de verdade, «suspeito nos porquês nos vossos olhos e nas vossas palavras e vozes e suspeito também quando suspeito que sou o único que rema de encontro à praia», sinto-me às vezes único, não sou poeta mas talvez seja louco e por isso às vezes sinto-me mau.

«Nur narr! Nur dichter!», cona minha?!, porque não consigo cumprir a totalidade do ditirambo e também não ser loco loco loco?, o diagnóstico condena o meu ser e diz que sempre fui, sou e serei loco como el tigre para todo o sempre miséria ah… por isso, complemento a sequência e incorporo a história universal da desgraça em mim porque parece que a minha não me é suficiente. Tenho alguns sentimentos masoquistas como jesus e num desejo de assim se integrar nalguma comunidade, este jesus transforma-se em ficção e fugas de informação não confirmadas, este jesus explode-se em mil fragmentos de desgraça, as palavras chegam e sabem a armas disparadas por este zé-jesus-ninguém.

«Uma só bala de cobre numa paragem de autocarro, autocarros deslocalizando a todo o momento a minha residência, o destino são velas de cera consumindo-se com a ajuda da assistência social. As palavras, suicidas no formato roleta russa ou homicidas no formato píton com vontade de atacar.»

A minha vontade é enfrentar o cão e dele não desviar os olhos, devolver-lhe a raiva autoritária como um boomerang. A minha falta de medo sinaliza o fdp do perigo de insurgência social e ele convoca funcionários extracomunitários «para acções de formação em contexto de trabalho não extraordinário».

O bófia bostique atira-me contra a traseira do carro e espreme a minha zurrapa para dentro de um depósito de gasolina, amanhã alguém vai ganhar mais uma hora extraordinária porque atestou o depósito, poderá haver mais um carro patrulha a mandar circular hobos como eu, penso que ainda existem alguns como eu, é essa a minha vaidade, às vezes topo-os no nosso olhar de bicho troglóbio das cavernas, são esses a minha causa. No fundo, este é o meu livro, um livro sem honra. Somos muitos mas não somos uma nação, não temos alma colectiva, não temos consciência de classe. Hoje fumo um charro e tenho um orgasmo de oito mega. É a minha recompensa por cinquenta cliques de trabalho alimentar. Amanhã tenho de comprar bolachas de chocolate, preciso de cartão para filtros.

«Sei que tenho um vício acrobata de te roer a rata.» O artifício, a simulação descredibiliza, a tevê precisa de novos e verdadeiros mártires para os anúncios darem lucro. Eis o porquê do desespero e do medo da injecção de substâncias coercivas no cérebro, como que a dizer «if you’re a gabber i spike you some gaba e torno o teu cérebro num vegetal rígido e hipertónico.» O veneno bloqueia os teus circuitos neurais e impede-te de viajar e ter alucinações visuais, bloqueia-te o pensamento e a imaginação. Os médicos dizem que assim te protegem de caíres na ilusão de não saberes talvez o que é real ou irreal, eu digo apenas que te impedem de ver pensar e sentir coisas lindamente fabulásticas que de outro modo não verias.

O taxista ouve que talvez apenas tivesse sido apenas «como se», e então de mental passas a criminal e aqui talvez a lei te envie para o quadrado de barras de chocolate, baldes higiénicos sobrelotados, expatriados morrendo por convicção em greves de fome. Eu, uma vez mais não estou lá, vejo na televisão holandesa cartazes e bombeiros mascarados, fora do horário e off the grid pondo no contentor todo o ginásio, todo o livro antes donativo, agora um bloco de cimento, agora desperdício radioactivo e uma vez mais devoluto. Toda a época tem a sua fogueira, a sua queima do judas. O rio há-de ir pelo ralo de banheira da terra oca abaixo, esperarei as novidades, o que fará ele depois? Hum talvez um ministro senhor sim…

A caminho da anyday para o capuchino herbáceo matinal, vejo yvette shakti vestida de lingerie branca afastando as cortinas da janela, sopro-lhe um beijo de homenagem e ela sorri, terá quarenta anos, loura. Ela a heroína criativa, dela nasce a sociedade, esta sleep chamber profissional torna-me consciente de que todos os padrões e fenómenos da existência hão-de ser dilacerados por hordas de criminais poéticos. É só esperar as novidades, será o cavaquistão pendurado como uma alma penada no purgatório da taxa moderadora?, será o seu alzheimer passível de isenção?, que dizer da quinta do coelho com um gigantesco agá para pteros com hélice para lá do allgarve na ilha do sal?

Na antiguidade não se faziam auto-retratos, tinham medo das ficções. Os indivíduos não se comparavam a deus. Era mais importante a obra que o artista. Viemos a saber muito mais tarde que deus tinha morrido mas toda a gente sabe que ele vive com o nome de capital. Crowley disse que cada homem e cada mulher é uma estrela, portanto cada um pode ser deus. Mais agricultor, o meu avô alimentava a queijo um rato chamado death posture. Num certo sentido, sou deus mas apenas em potência, dado que não necessito muitas vezes de acreditar em deus. Faço auto-retratos mas não me reconheço neles. Para se ser deus é preciso executar e terminar todo um ritual. Diz-se que se tem de castrar o ego e ser apedrejado.

Já dentro da coffee shop, o empregado diz-me que o meu habitual capuchino é hoje por conta da casa e assim ganho moral para imaginar escrever uma carta à shakti que me sorri: cara yvette, ouço invokações sonoras a brian jones por entre fumos de hash afghan border, beats e cordas de guitarra, imagino-te trabalhando o símbolo, a máscara e a androginia dos teus clientes, sei que são desviantes as carícias de papel trocado quando se culpa mãe e pai, sei que é um grito de ipiranga abandonar a mãe-casa, ofereço-te, querida yvette minha mãe, nuvens de vozes étnicas, espirais e esta má prosa como recompensa do teu sorriso, é claramente apenas uma tentativa de complementarmos a cor, atingir a quinta-essência, a tua descrição psicológica, tu mulher como obra de arte, peça de teatro, representação, falsificação ou simulação da realidade, uma foda, um livro que se abre dentro de um livro porque incompleto, fragmentado, com páginas em branco e quando abro a boca minto por omissão, procuro o teu clitóris, a negação do eu, não me livro do remorso na missa de catedral mas fundir-me-ei contigo meu lado feminino, o ouro e a prata, não desejarei alguém mais, a stroke with romance, negar o eu é um caminho para a invisibilidade, eu debaixo de todas as camadas de personalidade sou um vazio cebola de lágrima no olho, vivendo cada máscara em função do momento agora, o azul e o verde do narcisismo, o único e a sua propriedade, venho-me por fim nas tuas mamas, a escrevidão tem utilidade.

«Louco lúcido, eu não vivo, analiso-me. And if you were kim I could now write over your skin: I love you sugar gordon.»

Tudo, uma descrição de um sonho acordado. Curto o lost highway, gosto das imagens, da cor, das sombras, da noite, das personagens estranhas, da confusão de identidades, uma das minhas maiores alegrias é ir à festa pelo santo no bairro vizinho e pedir uma sandes de chouriço, sentar-me no meio da multidão gemendo como todos pela ana malhoa, abrir os cantos de maldoror numa página com insectos aleatórios e enxotar esse português roberto muito leal, vê-lo substituído por um grupo de ciganos cantando à minha maneira, all along the watchtower, iiéee!

Tenho de cair no ridículo, tenho de morrer a fim de viver. «A escrita é um miserável substituto», escreveu-o fernando r. de la flor. Terei eu de traficar techno em timbuktu para comer por muito retórico que seja este ponto de interrogação? Já dizia bataille: o erotismo é na consciência do homem aquilo que o leva a pôr o seu ser em questão, a minha condição de macho, se eu não me amar não te poderei amar minha querida yvette shakti prostituta de lingerie branca, por isso anular o meu ego leva-me ao absurdo do qual fujo: essa claudia mura, mulher vestida de ganga e botas doc martens, pintada e lenço de cigana, a irmã assustada, a tia aparecendo com o bebé… «essa mura não passa de mim próprio disfarçado e uma projecção do meu narcisismo, isto ou a verdadeira pulhice tem neste mundo uma forma corpórea que não eu… amar-me a mim próprio yeah for sure mas não fisicamente.»

Esse absurdo suicida-me a cada momento yvette, quero as tuas coxas ellen yvette, quero regar-te o rego com vinho verde, comer broa e lamber-te os bicos, arrancá-los fora mesmo, adoro-te desejo-te mas quero amar-te também. Agora ellen shakti yvette puta icata, dá-me a fome.

Que falta de educação!

Tens tempo para fumares um cigarro? Não, tenho de trabalhar!

Vivo dias sem vento, uma onda frontal de calor, as sementes secam, a minha cabeça seca. Migro para norte mas abafo mais aqui do que se tivesse migrado para a cidade vermelha do sul. Aqui estou mais perto da lua do meio-dia. Saio da anyday e procuro almoço. Sei que perto da boudisque ahahah i am the green child sabes?, sei que tu até gostas do meu sorriso, da minha loucura metafísica do não-ser, sei que gostas que eu te enterre funda na mente, sei que vais além da profissão mas eu sei que agora tenho fome, encontro um turco e entro.

Agora ellen digo-te ao comer um kebab de cinco euros que tenho muito poucos amigos, sei que eles seguem as suas vidas, sei que eles dizem que me perco no caminho, sei que faço opções conscientes baseadas no processo, sei que sempre quis fazer o que penso e não o que me contam, sei que não tenho de apoiar a causa de ninguém também porque ninguém apoia a minha, sei que a falta de conveniência social me leva para a mata, e mata que se faz tarde, sei que tenho um amigo que se perde bêbado na estrada secundária e é mandado parar pela gnr, fica sem carta, diz-se bêbado e encena rebelde a esquizofrenia no hospital, dão-lhe uma dose de cavalo e detêm-no. Sabes ellen que tudo isso me dói. Porque será que, como muitos de nós, também eu ganho subitamente coragem e represento a vida «live: ao vivo e em directo» mas erro sempre a audiência? [actores falhados talvez], sabes yvette que hoje lhe escrevo, e ao analisar o seu caso é como se ele seja eu, a prosa é péssima, truncada e tendenciosa mas tentarei dizer-te algumas palavras de cada frase e de má prosa sair abjecta poesia: psiquiatra psicótico bravo! moralista repressão e supressão criança sexual gadjo louco gadja a primeira vez matar o amor verdade perversão apologia eutanásia cristão cristo hipócrita madalena pistola treta mania de ser mau psicopata de filmes purgar missão azulejo na estação de comboios não gostas de ti treta insulto provocação todos os homens são paneleiros estúpido louco bêbado zangado sádico e masoquista refúgio droga esquecer sofrimentos e misérias desejo regresso ao berço ninho casa doce teta mãe terapia de substituição dinheiro capital comprimidos treta criança que gatinha pela vontade da mente.

Voltando a ti digo-te minha musa yvette ellen shakti puta, há muitas coisas que gostaria de fazer contigo, casamento não romantismo sim, jantar de malmequeres com arroz de pata com laranja e eu, macho a proteger-te da infâmia da calúnia e inveja. Os psiquiatras são os polícias da mente, os padres os polícias da alma. A mãe ama-me, o pai não é herói. Não te suicides, não mates ninguém. Procurar-te-ei quem sabe ellen talvez… ou talvez não, que agora sinto o estômago confortável e a minha vontade é ser um paxá.

Mas digo-te puta minha shakti ellen icata, digo-te que quando recebo as notícias de lá, desse ninho tão distante, ao procurar uma cabine telefónica asseguro que estou bem aqui, sim mãe estou bem, vou vivendo enquanto tenho dinheiro, não dá para enterrar dinheiro na yvette nem ir ver o gogh van, dá pelo menos para um kebab e thc do mais barato, dizem os agora yupis moralistas que um charro tem thc em grande percentagem que origina psicoses irreversíveis, até poderei dizer que pode, de facto, influenciar mas tu que uma vez foste rebelde hipi na altura não sonhavas com a moca colossal?, mas vou vivendo mais ou menos com estas opiniões dejectas discutidas em talquechuis, olha diz ao pai que o respeito por ser meu pai mas… ele nunca foi o meu herói, heróis tive outros, todos os que ele não gosta, e no entanto tento moldar o meu mundo na tentativa desesperada de ele reconhecer eu estar no caminho certo, ainda assim dilacerar-me com essa impossibilidade porque somos todos os que ele não gosta e chama-nos de maus porque assim nos descrevem na tevê, os maus, aqueles que fazem greve, os que não aceitam a coerção e a coacção. Sabes mãe yvette?,

na juventude amo a vida, positivista sou e o zaratustra é o herói, nego a religião, a música é catártica, a revolução pretende desconstruir mentalidades e valores hipócritas mas sabes yvette puta madre?, que os anos passam e a destruição deixa de ter sentido, o cru veste-se com refinados elixires de filosofia e moralidade para as quais vou sendo convidado de vez em quando em apertos de mão. E sabes shakti ellen que esse medo perdura desde sempre, os rebeldes de ontem tanto se podem perder no vício e em alguma história mitológica ou podem agora avôs odiar tudo o que cheira a diferença, acredita mãe que me custa saber que há pessoas fazendo techno em timbuktu por uma malga de leite e meio quilo de fígados de porco e este rio — uma albufeira larga de milhões de borracha pichosa para a populaça apreciar a festival rádio nas corridas, abaixo rua abaixo no marginal do rio, pipocas e algodão a um euro! Porque, meu amor, se meu pai não estudou alemão e presidente se elegeu ou se não tinha cintos com fechos falsos escondendo neve branca e delator do filho rebelde e poeta se fez; porque, meu amor, se meu pai guardou ovelhas com seis anos de idade, não pode então pensar que os futuros rebentos netos, que o tio escreve piratinha, possam vir a fazer o mesmo oitenta anos de ditadura depois, lá há-de haver alguma evolução nas condições de vida, depois dos sapatos e vestidos do vale do ave abrirem falência para o dono comprar um ferrari será necessário voltar a ser escravo? Hoje puseram cimento em todo o espaço, só faltou partir as telhas ou talvez as tenham mesmo partido, tudo para o contentor, vejo o medo na face de soldados do povo, até os punks são humanitários, a doença atinge os rios, a velhice chega, a mulher anda meia desligada, a religião salva, há quem pague a salvação futura na caixa de esmolas, negarei [?] todo o passado para me enforcar ao lado de cristo [nosso?] redentor, a redenção da hipocrisia, iludir a dor, enganar o enfado, gente oprimida de destino absurdo.

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manuelle biezon

quarta-feira, 10 de novembro de 2021

Irab lembrou-se e despediu-se de duas antigas deusas escrevendo-lhes pela mão da manuelle biezon
Hoje Ru sends them music and old regards

 

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Olá, espero que gostes, tem duas músicas cantadas pelo anthony. Espero que sintas gozo em experimentar com a pintura. On a more personal note, lamento teu silêncio. Sinto que te afastaste de mim, que falei demais, reciclei uma vez mais o meu passado contigo, como éramos tão inocentes há dez, doze anos atrás, cheios de vida e agora, o que resta? A minha ingenuidade destes últimos meses, eu quis-te beijar no carro quando cá estiveste, quis sentir a tua pele, e depois dizes-me coisas duras como «baixa qualidade», não querer pensar e tal, como argumento de defesa contra mim, insensibilidade, tentativa de anestesia (deves ter sofrido muito, chegado a conclusões terríveis acerca de ti própria, do mundo, dos homens e das amigas. Todos nós chegamos e todos temos de lidar com isso, chama-se a isso adaptação ao meio). Eu não desejo negar a sensibilidade e já passei a fase da anestesia, descobri o ponto de fuga na pintura, as tuas papoilas que pintaste poderiam ser um novo princípio para ti, se o quisesses claro, eu quando estou a pintar não penso em mais nada e depois paro, sento-me, fumo um cigarro e aí penso, analiso, chego a conclusões and I move on with my world. Eu nunca me senti uma vítima mas não quero ser um mártir. Dizes que existe uma corrente que nos liga, que sempre nos voltamos a encontrar ao fim de anos. Concordo. Mas nos últimos nove anos quem procurou fui eu, apenas eu, sempre eu. Tu procuraste antes, isto a avaliar pelos telefonemas e cartas que só mais tarde recebi. Lamento não ter estado perto nessa altura. Sinto que nesses momentos gostaste de mim, ou então tiveste a inveja muito portuguesa da vida lá fora, ou então sentiste que eu estava longe e que nunca mais voltaria porque lá, na terra dos sonhos e dos cogumelos, a realidade seria mais bonita. Não sei mas sinto que naquele verão quando no carril lemos a petra e a karin numa passagem escolhida especificamente para tu me beijares, e tu beijaste-me algo curiosa e eu subi ao céu, após anos em que te desejei, ah como seria bom matar es per ma to zói des nas tuas superfícies esponjosas… dias depois fomos passear para as salinas e beijamo-nos, desta vez a sensação não foi tão boa, faltava emoção à coisa, era literária, referências e tal… um domingo mais tarde apareceste bonita com um vestido de alças vermelho laranja (creio eu), estávamos sentados na cama, beijávamo-nos, e eu quis pôr a mão por baixo do vestido vermelho mas tu recusaste de um modo quase patológico, não ofendida mas quase com uma aversão espontânea ao meu acto. Compreendi neste momento que nunca nos completaríamos fisicamente, ao nível do intelecto talvez mas não no acto instintivo mas lembro-me de os teus olhos brilharem e das tuas palavras dentro do uno: não desapareças agora. E então fui-me embora, não era ainda hora de espernear mas de qualquer modo não tive paciência, o platão é uma seca. Porquê agora? Se me tinhas recusado mas contudo os teus olhos brilhavam, devia ser amor tal como devia ser amor em novembro ao perguntares se eu voltava, como se tivesses medo da possível tragédia mas é preciso reconheceres que coloquei a minha mão na tua que segurava a caixa de velocidades do teu ford e tu recusaste. Uma vez mais. Os teus olhos brilhavam, devia ser amor mas nunca me falaste do teu amor, desse tal amor por mim (oh soberba oh glória de ser amado), sempre falaste do amor que vinha nos teus livros ou em pequenos pormenores com um «amigo». Voltas?, perguntaste, e eu disse claro, que volto, eu não vou a lado nenhum, vou só esperar por segunda-feira e assinar a rescisão e receber a indemnização e irmos passear. Tinhas planos de ir a londres com «ele», eu sempre voltei para ti, eu sempre esperei por ti e ainda espero, sempre espero, tu és a minha deusa, foi assim que construí o meu amor por ti, estás mais no meu campo de ideias apenas ou porque tu nunca me quiseste fisicamente ou porque quando o quiseste, e se quiseste eu não quis reparar, mas tenho a dizer-te que icata é algo já não terrestre, e que eu te quis na terra comigo ao teu lado, espero ainda mas até quando? Espero que me envies o malina por correio, há anos emprestei-te um livro do vernon sullivan, há muito tempo desisti de reaver, enfim… recusas-me com o teu silêncio, com tons mal-humorados dizendo que tens de ir jantar e que telefonas depois, até hoje… espero eu espero ainda tendo de ter infinita paciência, lendo que esperneio e que é necessário uma distância de segurança. Não tens tempo para mim, nunca tens tempo, não tens tempo para escrever a um gajo que se interessa por ti, já não no aspecto anestesiante da coisa sexual, mais como uma memória de amizade de pequenos momentos que na altura em que se vivem são belos e parecem que durarão para sempre, eternos, até que chegamos à recordação e se verifica que os malmequeres murcharam na luz ao fundo do túnel. Tudo porque para sair do túnel ou para escavar uma terceira saída são precisas duas pessoas, duas toupeiras, dois lobos, gatos e gatas, eu e tu em suma. Por isso minha querida marguerite, esta carta é uma tentativa de forçar a abertura do túnel, para chegar à luz, para que haja passarinhos e nenúfares frescos. Tens todo o direito de te aborrecer com estas tentativas, esgotou-se a tua curiosidade por mim, terei sido talvez perverso nos meus actos ou palavras mas tu nunca foste minha ou única nos meus pensamentos, e eu ofendo-te a tal ponto que silêncio mas esse silêncio só será válido quando tu mo disseres ou escreveres, requisito essa objectividade se for o caso, pois por muito masoquista que uma pessoa possa parecer, existe sempre um momento em que se desiste do troféu, ex-genet.

Ouve agora este final, meu filho:

kill me, kill me... I’m listening to the nails.

Gravo a minha voz como radialista. Improviso a pensar nela, na maior gaja, gata, goddess, ga...nza. Nunca haverá ninguém como ela. Improviso em inglês com sotaque zombico. A verdade é que nestes últimos dias ou noites, um sonho talvez me regrava a memória. Desejo que ela não tenha andado no tempo mas… talvez a verdade seja apenas uma vida profissional estabilizada e filhos de um cowboy. Sobretudo desejo que a mensagem que hoje lhe envio pela rede de informação chegue a ela ainda hoje e que amanhã na volta do correio acorde e obtenha uma palavra… dela, da verdadeira, da genuína, da única. Ah ganza! Como te amo, juro-te prometo-te devoção eterna, lembras-te do sempre nunca ou nunca sempre em formato convite que tu rasgas à frente do pastel de bacalhau como eu lhe chamo? Compreendo ou penso que te compreendo. Porque eu naquele momento limite não quis, não te quis, quis seguir o meu caminho, superar a crise sozinho sem ajuda, sobretudo longe de ti, tu anihilavas-me com com o teu toque, com os teus sonhos, com a tua voz, com a tua pele, com a nossa pele colada pelos cinco sentidos dos nossos fluidos encharcando de sémen e corrimento a nossa pele cheirando a esmegma, o teu cheiro, a tua ausência de perfume artificial, e no entanto tinhas dinheiro para comprar perfume de dez milenas e depois há, eu sei que tu sabes, coisas mais valiosas que um cheiro artificial, coisas que eu te dei ou poderia dar mas enfim… a nossa pele. Yr sweet voice, not a flower monika voice, that’s another story all the way completely and absolutely. Yr sweet voice your skin. You were really my woman. Em realidade na realidade dentro e fora da realidade, a merda acontece. Devo estar a ficar velho pois é verdade que o cabelo começa a ficar esparso, os dentes caem quando como bolas de chocolate pelo natal, eh eh acho que como uma cabeça de pai natal e como paga parte-se-me meio dente, quase que o mastiguei e, no entanto, tomo conta da ocorrência na mesa de jantar e disso não faço caso, porque morrer só uma vez and after that nenhum mal nos pode fazer, que se lixe. Hoje, já não tenho medo da melancolia ou do armário ametista da sexualidade, pois como disse esse meu tio soldado que morreu morto ou suicidado ou por acidente, que interessa isso agora ainda?, pay respect to the vultures for they are your future, esse mesmo tio soldado morto suicidado acidentado pederasta drogado maluco... De tudo isto poucas coisas não sou e se divirjo a nível físico da sua opção sexual, seria capaz de dizer à ganza como ele disse ao seu parceiro: paint me as a dead soul. Ah ganza, digo que estou velho porque tu estás sempre lá, no futuro que não se viverá junto mas sim no presente que se já não vive, tu estás sempre lá na imagem tua aos dezassete anos na tua cidade do interior, nessa fotografia que faço o obséquio de deixar queimar por uma distracção com as velas surripiadas ao john quando vou à cozinha comer um pão e fico a saber da morte do sinatra pela TV, um el grecco, um relógio, o único que tenho, um despertador com rádio, a tua imagem. Mas vives em memória eterna. Depois e antes de ti, só projectos, ideias, mistificações, ernestas com metafísica recusando terminantemente aceitar a metafísica dos outros tentando incutir a sua própria metafísica mas enfim… ah claro, o guardador de rebanhos não é? Ri-te querida ri-te querida tu a verdadeira a genuína a única, aos teus calcanhares a mistificação minha da icata que nunca se materializará e ficar-se-á pela auto-masturbação, apenas um projecto, um projecto forte é certo mas que… it’ll never come to fruition. Ri-te querida ri-te tanto como eu agora rio quando escrevo estas linhas, pensar em ti afasta a melancolia, faz-me… lembras-te da triste beleza?… pois é, há-de ser sempre assim. Tu hoje estarás bem com o teu marido com os teus filhos talvez. Estou a ouvir «queremos paz» dos gotan project, tango lembras-te querida?, lembras-te. Eu lembro-me das tuas palavras: «parce que je t’aime», lembro-me de tripares comigo por causa de nos vermos ao espelho que tu escreves com baton e eu te dizer que tu pareces galás e tens razão: foste única e querias ser reconhecida pelo teu próprio ser personalidade, encontro-te mais tarde numa aparente réplica com cabelo violeta numa padaria às sete da manhã de um domingo antes do meu comboio de volta ao ninho «paternal» e tu, essa possível réplica de cabelo violeta, tu comprando pão para ir dar ao teu Senhor, que não eu. Tudo teve, tem e terá uma lógica interna, a percepção como sabes é transformada pela invocação de um determinado sigilo, as coisas acontecem as if as now, o difícil é não ser apanhado pelas malhas da autoridade mental superior, pelo phallus já sem pele, daqueles que tentam arrastar a asa para cima do meu ombro, ah as referências!, prometendo mais do que a gente nem pede, oferecendo ideias, ajuda, promoção, criação de mitos em conjunto e tal, é pena, tenho pena desses pastores de rebanhos, desses espíritos livres científicos ou espirituais que só admitem a sua liberdade e a de mais ninguém e que todos se juntem à sua ideia voluntariamente, e quando a gente corta essa mesma asa fálica eles retiram o tapete que eles próprios colocam para eu tomar banho enquanto ou antes até de escrever que ninguém chama porco a ninguém mas sim que cheira mal. Para esses guardadores de rebanhos tão bem-educados só vale dizer: lixo, e não apenas um, vários que dizem tal do meu cheiro, lixo sou lixo sois, pois então. O meu cheiro tem em memória a pele da ganza, a minha, a que tive, a que tudo deu em troca de mim [ah a ilusão de te salvar incorporando-te na história…], do meu cheiro, do meu corpo, do meu sexo, da minha piça dentro e fora do teu corpo e o teu corpo essa lua dentro do meu sol… e depois é preciso que diga que me estou a cagar para o que os supostos amigos antigos «companheiros de longínqua jornada» disseram dizem ou dirão de mim ou do meu cheiro, se ainda eles fossem mulheres talvez pudesse ter interesse na sua amizade e mudar outra vez. Cada qual tem o seu modo de filtrar o passado. A eles nem byebye valerá a pena dizer nem mesmo fuck off. Já o disse. Mais vale o desprezo e o silêncio, é o que me fazem, dizem até que é sinónimo de boa educação. De qualquer modo, lamento nunca obter resposta das pessoas por quem ainda me interesso, silêncio solicitado para sempre, escrito numa mensagem de corte de relações por g. Silêncio inexplicável por icata. Esta diz o que eu disse a g há quase décadas: a minha vida não tem nada de bom para te oferecer. Mas para arrancar esta frase é preciso dizer-lhe para me mentir, inventar ao telefone uma qualquer história. E depois silêncio. Por isso do passado, do meu passado só duas imagens perdurarão: a maria talvez, estas duas mulheres e a linda svieira, a única que verdadeiramente me seduziu e por mim lutou. Ela era uma linda e saudável mulher com quem fui feliz mas eu já na altura sabia que eu não era saudável. Deixei a amante e fiquei com a mulher, meses depois a solidão. Alivio a minha miséria mentindo agora e dizendo que o futuro se projecta risonho: os meus sobrinhos já dizem tété ao seu tio soldado pintor maluco drogado and straight. Queremos paz. Os mortos como eu poderão agora ir dormir e talvez invocar a sucedânea de g, vale a pena pôr os mutantes: oba oba she’s my sho-sho and she knows I’m her sho-sho mitomania… para todos os outros, a frankenstein doll for joseph and a little baby doll for baby jesus e uma bola de natal com recheio de esperma enviada do meu anexus 51 misantropia. Contra o pai natal e as janeiras nada tenho, pois recordo quando me abriste a porta. Um beijo grande e votos de felicidade para o vosso futuro com os vossos. Minhas queridas, tratem bem os vossos. Eu sei aquilo que convosco vivi e as repetições começarão assim a rarear.

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manuelle biezon

segunda-feira, 8 de novembro de 2021

quinta-feira, 4 de novembro de 2021

Erros de casting

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Quando volto a casa vindo do hospital, tenho o meu terceiro moks após o café à espera, igualmente a televisão espera por mim para amostrar um magazine de cinema sobre últimas estreias em festivais. Estão lá todas as estrelas de cinema, todos os realizadores e todos os microfones de radiotransmissão, fala-se deste ou daquele desempenho, de história e de quando a história é um versículo retransmitindo uma ideia — um interessante comentário que leva mister cool a puxar do seu organizer e começar a escrever: o processo de criação fotográfica envolve um espelho ou várias lentes, um fotógrafo, um objecto entidade a ser fotografada e o espectador que se quer público voyeur. Olhar o espelho é ver o modo como nos vemos integrados no mundo, fazer um auto-retrato fotográfico é ver o modo como o mundo nos integra. Se eu tivesse duas séries fotográficas em que todos estes elementos entrassem, então verificaria que a combinação possível sugerida pelos meus sentidos é aquela única em que o fotógrafo se confunde com o objecto no espelho por detrás das lentes e no momento em que tira a fotografia. É como se tivesse medo, é como se recusasse que o público se possa identificar com o sujeito não lhe retornando o olhar, frente a frente eles não se vêem velhos projectados no futuro com cataratas. Tudo é êxtase, intemporal e o único elemento que envelhece é a dupla projecção sujeito/objecto, imagem/público.

Onze e meia da noite, horas de dormir e de escrever uma possível definição de hobo: uma, mais ou menos, espécie de guna que faz arte enquanto procura trabalho, sublima amor e ambiciona conhecimento. Esta procura é caça e eu tento caçar, o desfecho previsível é o falhanço no objectivo específico germinar um falhanço genérico cheio de efeitos colaterais imprevisíveis. Esta procura é pesca e eu tento pescar, o desfecho secundário aleatório e colateral é, porque apenas objectivo genérico, não haver um falhanço específico mas sendo este processo um efeito colateral encarado como uma experiência científica de conhecimento, try catch continue. Esta procura pode ser igualmente vegan, um artifício refinado e mais luxuoso e que muitas vezes só engana a fome, uma espécie de fuga para a frente após o falhanço, uma mudança de paradigma, de objectivo genérico. E então... se temos de comer algo seja carne, seja vegetal, seja peixe e se tudo falha… que sobra, que solução?

Não comer significa ascetismo, esse fascismo místico. Podemos comermo-nos a nós próprios e nossos semelhantes siderais e a psicose surge. No fim, já estabilizados com medicação, voltamos ao cioran e ao inconveniente de ter nascido, voltamos ou à culpa de acusar os pais e a sociedade de nos ter posto no mundo ou instruímo-nos sobre o princípio do síndrome de estocolmo.

Imaginem mesmo a ponte entre estocolmo e copenhaga interpretada… pode um gato interpretado agora como morto agora como vivo e ao mesmo tempo, portanto com resultado acausal, ultrapassar e não ultrapassar a ponte do amor/ódio entre o prisioneiro id e o governador gangster superego?

Só porque a teoria de jogos diz que se ambos se derem bem daí nascerá, na minha particular definição, uma claudia mura racionalmente artista proletária que se me complemente como uma Outra?

Será que do outro lado da ponte estará malmö? [no google maps a ponte até existe]

É isto uma distorção sem sentido da realidade e dos factos?

Será que em cima desta ponte deverei fazer mural do meu absurdo e local do meu devaneio, reflexivo reactivo revolucionário?

A verdade é que a ficção desta ponte só se torna útil se um dia, mais tarde que cedo, eu a ultrapassar e a passe a considerar simplesmente um posto fronteiriço entre um passado de merda e um futuro em que poderei ser virtualmente quase tudo o que quiser ou simplesmente ser o que tiver vontade de ser, o objectivo continua o mesmo: Ser.

A verdade é que a distância entre um Eu e um Outro tende a ser mínima e, em solidão, esta distância torna-se absurdamente nula, e tudo se passa como se fossemos muitos, a nossa cabeça fragmenta a identidade e a distância entre o eu Id e o eu Superego. Esta relação quase narcisista leva a que, em momentos de auto ironia bem disposta e com a ajuda da substância, se deseje que o Outro, esse pai polícia esse superego, se transforme numa Outra com quem possamos ter prazer, alguém a quem eu com paixão possa oferecer uma camélia ou pelo contrário talvez um camelo quando… bem vocês sabem: amor/ódio nada saudável, abstenho-me aqui de erros ortográficos explícitos.

Criar a ficção da Outra, essa ilusão quebra a distância e o sentido da comunicação, a Outra torna-se o Eu e o Eu a Outra: manuelle biezon — gatinha negra a quem eu dei uma lata de sardinhas e uma malga de leite; claudia mura — a segunda alcunha da mulher invisível.

«Analogias sempre repetitivas caminhando em cima da ponte, jauntando para a frente e para trás no tempo, psicogeograficamente construindo desenhos mnemónicos, vivendo na ilusão de não saber se predigo os pensamentos dos outros, se sou uma súcuba sem género sexual que os outros interpretam ou se simplesmente sou um emissor/retransmissor sincronicista numa rede global à volta do evento actual publicado em notícia, arte hobo procurando o quê?»

Digo que este local, esta ponte, esta espécie de casa… digo que estou em casa mas de facto existe aqui um lapso temporal e afinal… estou mesmo em casa, na casa onde me resigno, apesar de parado à força. Integrado no grande salão do wc hotel, peço até a via láctea que me grave a reportagem de um canal de cabo, que entretanto mudou de mãos como o outro, aquele que igualmente me fornecera subliminares imagens caóticas com informação pertinente sobre o meu microscosmos. Digo a via láctea: olha estes são os meus!, olha o aspecto daquela senhora, levou electrochoques, olha a sala da psicoterapia. A emoção, que o meu polícia interno às vezes não controla, sobe-me aos olhos e por empatia a emoção sobe também aos olhos de via láctea. Hoje nesta parte do conto, estou de facto em casa no hotel dos condes e rumino sem ainda compreender que a melhor opção é pescar «mas a peixinha é cara prá mundial e como pode um bói pescar?» Portanto, falar só coercivamente. Urros casmurros me saem e também a vontade de explodir um colete de bombas, um mártir sem ideologia?

Assim, alivio-me entre cigarros partilhados, sublimo a minha tensão sexual lançando em silêncio fulminações a toda a autoridade que me coage. A eterna luta entre a criança rebelde id e o superego cria um ego danificado, acontece escrever epigramas: lembro a minha idade, nove ou dez, não caminhei mas corri aquele muro de cinquenta metros de pedra sem medo de cair abaixo da ponte do comboio. Sempre fui desportista mas às vezes a preguiça sussurra.

«Então o chefe decide que não e eu venho-me embora pensando em pôr um processo em tribunal contra a empresa, o que pode levar anos, então lembro-me que mais vale receber às prestações até ao términos se não rescindir de mútuo acordo, dado que não entro no jogo da empresa, da autoridade. Sinto culpa e expludo ao ver aparecer um homem de gás para entregar uma botija no office. Cria-se o pretexto para que seja internado e uma carta de despedimento seja acusada aqui em casa, logo seguida a contra-resposta: baixa psiquiátrica até ao final de contrato e depois o jogo diz que todos nós obtemos benefícios se colaborarmos.»

E hoje cá estou com os meus sonhos e desejos cancelados, estou preso porque a minha explosão j trata mal minha mãe [erro de casting: o j não devia ter entrado em cena], porque o microcosmos… toda uma espécie de santidade com aspersões de eucalipto e chá de melancia… eles dizem que estou doente e que preciso de tomar comprimidos e ficar aqui mais algum tempo.

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manuelle biezon

domingo, 31 de outubro de 2021

quinta-feira, 28 de outubro de 2021

Anexus 51: The Derza dream


 

«Anexus 51: The Derza dream»

desenho a caneta-pincel de preto permanente

colorido com tinta de aguarela

sobre papel 300grms grão fino

50cm por 70cm

2021

ZMB