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Galás é baixa e até já pode ser avó, a sua voz é uma referência. Dia munda tinha, para mim, uma expressão de afinidade, desenho-a mesmo avó de nariz partido, fazemos a asa um ao outro, súmula, crio combinações de fonemas, desdobro-me eu próprio em anagrama, compartimento o meu amor em identidades, em acrónimos para a escrever e para não escrever o seu nome a partir do momento em que a recusei e, no entanto, quando a ela voltei não posso deixar de pensar que ela se vingou nanando com o caubói, prefiro-a anónimo anagrama, não aos títulos de revista de tv, de jornal mas vim eu o meu ser e nós nas notícias?, houve um momento em que perdi o rasto à unidade de emissão com excesso de informação.
Nada mais foi é será igual, tudo muda: o modo como vejo o mundo e a minha percepção do modo como o mundo me vê a mim, começam-me a cair os dentes. No entanto, a minha técnica de engate consiste após a ruptura em descrever, como se um morto seja, a vida, o passado num misto de sorrisos velados e umas citações e um endeusamento cada vez maior, sempre para que a presa seguinte se sinta levada aos píncaros e condescenda comigo, me deixe roer-lhe a rata, lembro-me de duas ratas que não roo mas que recebem epitáfios tentando que elas percebam que há uma sequência cronológica infalível que me leva a ti, próxima presa tomada de espianto: tu és o meu apogeu, a combinação de nomes de todas elas, as datas, quando acontece o primeiro beijo e quando nasce, vês como tudo faz sentido?, não pode ser só uma coincidência, há um plano cósmico sabes?, tudo leva a que tu krida khalo icata ellen marguerite te queiras minha e me queiras teu, eu por ti deixava de fumar…
Talvez.
Então porque chumbas no teste do comprimido?
É surreal sem dúvida, entre um comprimido sem nome e uma injecção escolho pôr-me a pensar que galás afinal canta português [ah!, ouvir galás cantar em português, galás é uma psiquiatra de serviço no hotel dos condes, tem cabelo vermelho púrpura e calças justas e é alta como um abismo e dia munda agradece meu tabaco em espanhol], escolho pôr-me discutir a pronúncia da médica espanhola que faz a triagem psiquiátrica de manchester: agora a polícia contrata freelancers?, obrigada por su tabaco.
Eles respondem assim que terei de levar um shot no cu.
Eu, lembrando-me das famosas tatuagens no cu entro na personagem que vou desvelando, faço um grande chiqueiro teatral e, entre coacções várias e risos colossais, ponho-me a dizer que não quero, que não sei qual a finalidade deste comprimido e que não o tomo. Então, entre coacções várias e risos colossais, arreio as calças já com algum desprendimento para seguranças de várias qualidades e batas de várias cores não me darem afinal a pica, simulam apenas a injecção, não acho que tenha passado o teste do comprimido.
Existe ainda o teste da banheira do qual chumbo a primeira vez: põem-me a dormir mais uma noite na solitária, obtenho mais tarde uma vitória e a bata-mor que assistiu à esta torturazinha é [quiçá ilusão ambicionada] transferida, eis o início da mobilidade, eu vejo o olhar dele zangado ao entregar o cartão de sócio. Da segunda vez perante este teste com audiência constituída de batas brancas requisito um banho privado de chuveiro e admitem-me na sala de fumo: é aqui que troco ossos em timbuktu, assim parece, pela primeira vez com zaine. Techno desta vez creio que não seja, não me lembro dele ele lembra-se de mim, fica o osso para referência futura.
Tantos ossos há: desde o mineiro que, pedindo trocos, telefona para casa e nós ouvimos pelo seu desespero verbal as respostas negativas que recebe; desde o grande cesariny senhor danz que um dia assina o termo e volta no dia seguinte na hora de pequeno almoço quase de livre vontade apenas por não aturar a irmã; desde aquele mano de casaco de cabedal com pins que empresta o walkman com cassetes de metal construtivo, diz ele eu digo iiiieeeé; desde a vera malandreca que não me dá o número de telefone porque o marido não deixa e que está aqui devido aos berilaites; desde a rosa que anda sempre a pensar em comprar uma pistola e me diz para pôr de lado o senhor ventura do livro do torga e vir jogar umas copas; desde o bigode do antónio de quem dizem ter pegado fogo à casa e que, um lustro mais tarde, a minha falta de memória nas faces que passaram um dia pela minha vida tem a ilusão de imaginar ele vir a ser o meu mestre encadernador. Fizeram a folha ao bruno, pareceu-me vê-lo hoje na hora do almoço, perguntou-me se percebia de internet no telefone. Respondi com uma qualquer banalidade e ele concordou, só o reconheci debaixo do boné quando cheguei a casa e pesquisei …the feeling of being dead… devolveram-me cotard, a prosopagnosia, e em inglês …when you will have made him a body without organs… não consta que os caranguejos tenham amígdalas ou sentimentos.
Tantos tantos tantos cantar-vos a todos, justificar-vos, devolver-vos a g lória e no final…
Tantos tanto tantos e no final… há vários finais de admissão e eu, talvez apenas, precise de experimentar a matéria para melhor me escrever, há quem diga que chego algumas vezes ao pódio, vinte porcento do público dar-me-á [tantos?, talvez, ah! gloria] uma menção honrosa, o resultado: a sala iq do wc dos condes e voltar seis semanas depois à gravidez, err… quero dizer, à gravidade do ponto de partida, mais uma volta ao estádio, eu zmb sempre a renascer, eis o eterno retorno do erro. Apetece até citar cioran e o nosso inconveniente sempre que caio ao poço como o lobo enganado pela raposa, usando a lua como artifício, pensando que o seu brilho é um queijo lá bem no fundo para onde, agora e sempre, olho verde: a realidade da hiper ilusão e eu sou igualmente a raposa. Eu uma vez disse ao telefone para espantar alguém: eu sou todas as personagens.
Contam-me até na primeira pessoa, alguém que como eu se sente importante, que perde a amiga porque à saída do bar e, na altura de se dirigirem para o carro, ele lhe diz para esperar até ele abrir a porta e dar à chave: sabes o carro pode explodir, a mossad anda atrás de mim, eu não quero que tu sejas um dano colateral.
Também eu, uma vez ou outra em registo humorístico, percorri os passeios olhando para o topo dos edifícios à procura dos atiradores como se eu fosse um alvo subversivo em segredo, eu? Desde cedo que pareço importante pois ao português não pareço português mas sempre de fora, exilado ou gestor em missão de acompanhamento. Acho até que, às vezes, é bom nos desiludirmos de todas as cores e por muito que pense que sou alguém, que ponho e disponho do mundo… a verdade dura é que pouco mais sou do que um hobo, psicótico? Talvez mas não acredito que seja para sempre. Sei que coisas que vivo podem ser como tal encaradas e sei que tal me pode dar um rótulo mas não acredito que seja para sempre, irreversível nunca. Li no entanto philip k. dick dizendo que a psicose é um salto em frente que fracassou e o que eu mantenho é a certeza que pelo menos tentarei: amor, trabalho, conhecimento e a responsabilidade de se puder não roubar a tv da mãe, tanto melhor. Deixemo-la rezar, essa reza dá-lhe força, mãe de santo que você se salve por mim.
Ah: «se eu fosse e não fosse e fosse poderia respirar».
A anti-matéria aniquila-se
com a matéria que está à sua volta,
destruindo-se
e dando origem ao mistério da luz,
sensação
e emoção
em movi
ment
o.
E o que tens a dizer sobre este quadro, recordas-te que estamos a ouvir cheriecherie dos suicide?
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manuelle biezon
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