domingo, 31 de outubro de 2021
Dia de Um Dread de 16 Anos: Drogba Drogba, Drogba Drogba
quinta-feira, 28 de outubro de 2021
Anexus 51: The Derza dream
«Anexus 51: The Derza dream»
desenho a caneta-pincel de preto permanente
colorido com tinta de aguarela
sobre papel 300grms grão fino
50cm por 70cm
2021
ZMB
terça-feira, 26 de outubro de 2021
Lula Pena, Sónia Braga e o mijo das freiras
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Escrevo assim que regresso, chego outra vez a casa, desta vez o cenário é totalmente diferente, porque me quero maluco às vezes e a utilizar o meu último coto, a minha última bandeira, escrevo que o cenário é agora o de um renegado esquizofrénico, aproveito e dislexio palavras e escrevo estas: junkies do desejo, pederastas da prisão, prisioneiros do caos, baralhar as cartas e jogar a sorte na combinação, vai dar tudo ao mesmo, as definições vão mudando, a essência mantêm-se, todos nós queremos ser não apenas o observador mas o actor, as maiores mentes que se quedarão aprisionadas pela liberdade, destruídas pela loucura, quem como eu tem de ir a uma consulta para avaliação clínica faz de tudo isto uma bandeira, isto e aceitar o convite de zaine para lhe oferecer um café e lhe proporcionar hash e vinil musical, fazer a sua memória lembrar epifanias com chet baker e urgi-lo à discriminite do seu próximo título. «Sabes quantos músicos overdosaram em casa dele?, tenho de ir, estou a ter uma epifania, tu compreendes, faço contigo o que nunca fiz, empresto os meus livros, perco-os, vendo-os e depois tenho de pedir mais exemplares à editora… os ladrões roubaram-me!»
Recuso que a minha psicose seja transmitida geneticamente e provoque o tal desequilíbrio químico e tenha como solução estabilizadora a aplicação de neurolépticos e extra pastilhas para os efeitos secundários, a redução de danos. Sei muito bem que a minha psicose tem causas sociais, mesmo que diga: tivessem eles me pago as férias num spa em zurique [mas para uma lady… que mais se pode kerer ai krida...] ou a indemnização prevista na lei [oh meu filho és a vítima, o mártir que por vias tortas desejaste ser].
Recuso considerar-me vítima mas se o for sê-lo-ei apenas de mim próprio ou da minha sede de conhecimento e se sou nada serei apenas vítima de nada, sei que sou inadaptado, não sentindo heróis dentro de casa e ao ver desde cedo o mundo considerar-me o que ele próprio se não considera, um relações públicas pago com sapatos em ouro, construo a minha genealogia, o meu panteão de adn sideral, alimento-o com drogas soft e cogumelos, tento ver uma fuga num pico de heroína mas desisto e logo volto para casa, o seu efeito impede-me de responder ao afecto de quem vem tentar falar comigo, muita mulher vem ter comigo e eu não correspondo, gostarei talvez que elas me sigam até casa. Venho para casa sozinho fumar um bob e ouvir marley, gostarei talvez que elas não me sigam pois ambos poderíamos vir a gostar desse afecto além do erótico entre um futuro casal de possíveis hepatitis aids zumbi duet como se eu viesse a traficar os amados filhos de camisinhas furadas.
Digo que, afinal, gosto de sexo com mulheres bonitas. O zombie, lido no símbolo iconoclasta anar band, transforma-se em zmb, truncado portanto e autoproclamado mestre da realidade hiper ilusória, do artifício e da encenação.
Aquele que viaja sem sair de casa e às vezes procura aquela que lhe devolverá a potência de um brilho nos seus olhos, um sorriso. Aquele que constrói narrativas pescando pontas soltas nos seus cadernos ilustrados, em cafés cada vez mais no smoking… adorava ler o magick e ilustrar o salão do templo mas só como exercício visual, o meu templo ainda assim tem reminiscências de ouro, é um pouco reprimido como o do samurai [que me ensinou uma beleza da qual hoje já me posso afastar e a honra que completei com a leitura de stendhal] e, porque a mística de tanto remoer se desvaneceu como que por milagre ou remissão espontânea, admito ter visto um dos meus pais siderais na fotografia de um condenado à morte… no cárcere, acarinho os meus colhões sempre que leio esse poeta, sem pai e da mãe só a redundância do nome de registo.
O filho de uma possível prostituta, uma profissão que minha verdadeira mãe nunca precisou de exercer, insidia-se em mim e eu fujo tanto do medo de um futuro e nunca desejado electrochoque como do fascismo místico no qual «causa ou consequência» chego a cair algumas vezes. Ainda assim, prefiro o avô desconhecido e imagino-o misterioso, imagino que tenha sido mau, severo talvez, sem história que mereça que meu pai me revele. O meu pai verdadeiro tem apenas a quarta classe, desconfia das novas oportunidades e do euro, numa fotografia de arquivo vejo meu avô sideral de sobretudo e cabelo farto aos dezanove, sei que o seu irmão branco ficcionou o encapsulamento de um espírito brilhante numa borboleta transformando-se em crisálida no ventre de minha mãe e eu, como se cristo ou judas ou qualquer outro mito seja, sei que na minha psicose sem conteúdo racional, eu...
descendo de heróis, tendo eles desenhado psicografias, eu… sem elas me terem ferido de amor os tímpanos eu não poderia ter o fluido, não poderia ser quem eu escrevo, quem eu me assumo perante linhas de open word online, que mitologias recupero e assincronamente incorporo na minha ficção de regresso ao real, traumático às vezes o meu modo de me fazer gente, mais tarde cumprimentar-me-ão e levar-me-ão a ler escritos seus e eu perguntarei se por acaso não nos teremos já visto nalguma instituição hospitalar? Eu acho que preciso de usar óculos.
Falámos certamente, apertámos a mão, trocámos talvez mortalhas, um cigarro… mas saber que existes e que escreves uma página na explicação, na construção do meu delírio (o teu delírio de palavras escolhidas a dedo se tornou real na minha leitura) faz-me dizer não poder ser nunca um apoiante da política anti-drogas. Não seria correcto ser hipócrita porque eu igualmente as utilizo e com uma função definida e mesmo sabendo que algumas queimam o teu caco não posso impedir pessoas como ela, r púrpura, de ter as suas epifanias e sentir, desejar, conhecer e escrever, necessitar de narrar as suas fotografias, acima de tudo viver para poder contar, emitir, transmitir…
… eu também mas eu não vivo verdadeiramente, eu revivo os vários momentos da morte, o pós-morte é o colete de forças e o largactil, re vejo até polícias loiraças e algo feias vestidas com bata de médico fazendo o «diagnóstico» na sala de espera, vejo o que se escreverá a seguir, um dos muitos regressos que faço antes zijn zmb zijn e depois sempre que regresso.
Muitos amigos dentro de lá e de cá, amigos até do momento e dos quais não me recordo, sobrevive-me a solidariedade de em grupo e como classe vos cantar a todos, cantar os teus caprichos de histeria minha ex-senhora nos campos do paupério ou das tuas poses de junkie meu amigo.
Mesmo que não vos cante os caprichos exactamente «per se» e fiquem anónimos os vossos nomes para quem vier, ah sublime, infectar um leitor entre partidas, interlúdios e eternos regressos sem elegância…
… eu, a todos e a tantos mais, vos abençoo como se, como se eu, como se fosse um qualquer cristo e tivesse poder, far-vos-ei como me fizeram: trocarei convosco em timbuktu techno de boa qualidade num último muro ainda não cartografado, ficcionarei a torrente de consciência in e out, eu, espírito autofágico, transubstanciador mesmo [ah… a sublime infâmia do conto], ouvir-vos-ei falar do modo como combatem a vossa hepatite de junkie, do modo como alguns desistem do tratamento com interferon e se afundam na depressão com vinho, pastilhas explosivas, insónia e invalidez física, do modo como alguns estão em coma, do modo como alguns se curam com argila e mijo das freiras, esse elixir de vómito; do modo como alguns se queixam por não saberem se é verdadeiro o diagnóstico de «curado» e, não querendo saber, tudo é desculpa para não beber mas
fazer escândalo por causa da senhora que quer fumar, vós…
tornados dependentes planantes da pastilha [e negam que foram e que são], vós…
sobreviventes rehabilitados da traficância [hum a arte como crime o crime como arte? hum], vós…
fugindo da recaída no caneco ou no ciúme sem culpados, em vós…
procuro a causa, o gatilho da minha psicose, prefiro ter-me tornado um junkie em recuperação do que ser o meu sangue louco e culpar o sangue de meus pais, sou tão vós pareço tão vós receio que me torne igual a vós que em boa voz de todos vós me fartarei — sei-o porque não tenho perfil de substituto da s[eg]s[ocial].
Eu não sou um gajo social e os meus pais não terão culpa, o seu sangue foi igualmente recebido de herança e assim sois todos vós
a minha desculpa, sois todos vós
os heróis que no meio de nós e connosco se sujam ao invés do bom poeta e medíocre pessoa, somos todos nós
aqueles que nunca quiseram rótulo geracional e que agora vendemos o rótulo, todos vós
com quem me cruzo, a quem darei cigarros e livros mal-educados que recusareis publicar: abaixo o artifício, quero fumar, a tomada eléctrica pifou, deixa-me fumar, quero viver, aceita o meu fumo mas retiro o que disse e não fumarei na tua laje por respeito.
«Não publico porque é muito poético e a minha zine é assumidamente rasca.»
Quero deixar de escrever porque sinto que escrevo porque morto estou e vejo doppelgangers por todo o lado. O meu glenn branca é um poeta narcisista ainda mais sectário do que eu e há muito que perdemos o interesse um pelo outro, agora apenas desculpas educadas ao telefone, este morto não quero que pertença à minha colecção de heróis de banda desenhada. Tive uma litania de natas natas natas com a minha dia munda galas pessoal e dela desisto por causa do absurdo de amar o mito em vez do microcosmos que me acarinha à sua maneira. Agora prefiro sorrir quando vejo a lula pena na minha vizinha, ela vende no supermercado do meu bairro, recusa oferecer descontos dumping e eu gosto do seu anonimato, sempre que passo por ela sorrio. A sónia braga também não anda longe e é uma cigana com dois filhos de pais diferentes e nenhum deles é cigano e eu... eu sofro toda a vossa miséria e alguma mea culpa por escolhas perdidas. E que dizer do duplo do vila-matas que vende palmilhas ortopédicas aos residentes da zona turística de derza? Eheh até que acho uma certa graça ao intrujão…
Amanhã escreverei mais, agora vou fumar um intensificador de sonhos. Digo-te agora que o fumei e lembrando e corrigindo o fluir das palavras que inda agora escrevi, digo-te linda r púrpura, tu
transportando o nome do meu primeiro amor,
aquela que costumava esconder as mãos e acabava sempre por levar reguadas da professora nas pernas porque tu
não fizeste os tpc na escola primária, tu
que te cresceste modelo de escola de arte, hostellee e desejas a apanha da fruta para comprar uma câmara de melhor sensibilidade, digo-te r púrpura
tem a responsabilidade de ter alguém que trate de ti
que te cure com beijos nos momentos em que te sentires no fundo de ti, digo púrpura r
se te sentires no mais fundo de todos os poços, digo-te
o mesmo que apliquei a mim próprio: Se estiveres no fundo do poço e se não chover, não te poderás afundar mais só poderás levantar-te.
Digo-te tudo isto antes de vermos o filme de uma revolução, de certo modo manietada pela presença do olho, o observador recolector e criador de elementos dramáticos e retórica, filmando uma revolução romântica numa terra que não conhece ainda a palavra mais universal do mundo: fodere!, na realidade do dia-a-dia quem se fode afinal são os presos sem julgamento à custa de jangadas de bois aparecendo nos jornais fotografadas «como se» cannons, durtrais pios e paisanos vestindo a caxemira do duque, prontos a assassinar o comité dos homens da razão e da ração. E eu próprio, se estivesse lá certamente não seria diferente deles.
O papa benze, o aiatola proscreve, o buda contempla, o brama escreve poemas e o imã vive em segredo, tudo numa terra de amigos e proscritos sem curriculum mediático prontos a sem mácula serem lançados na tv da alta finança municipal, e eu que não quis experimentar tudo, eu descubro mesmo a minha droga e terre d’élection: les égorgers a droite les étrangers a gauche, io sei que mais velho do que tu sou mas nada me impede de me despedir de ti esta noite com um beijo e um sorriso que me faz sonhar e me impede de dormir.
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manuelle biezon
sexta-feira, 22 de outubro de 2021
domingo, 17 de outubro de 2021
terça-feira, 12 de outubro de 2021
Relatório do dia
A novidade boa é ter arranjado um trabalho de média remuneração e com um horário das 9h PM até às 9h AM.
segunda-feira, 11 de outubro de 2021
quarta-feira, 6 de outubro de 2021
Quiditas
«Quiditas»
desenho a caneta-pincel de preto permanente e colorido com aguarela
50cm por 70cm
2021
ZMB a partir de
uns versos no último CD dos Pop dell'Arte
terça-feira, 5 de outubro de 2021
Ah, sim?! Queres-me sentir uma louca? Queres mesmo saber o que eu penso? Para isso, terás de concordar que
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Ah, sim?! Queres-me sentir uma louca? Queres mesmo saber o que eu penso? Para isso, terás de concordar que a ira mira telescópica aponta directamente a nós, o público com impulsos de memória: uma fogueira e o céu violeta e púrpura da minha infância, um amanhã na lareira cheia de turfa industrial.
Lá em baixo a linha do horizonte, carvão, fuligem, smoke, um impulso de memória, uma gestalt de amor à frente, uma ilha no meio de um rio carmim, amor, delírio e reverie onde se queima uma imagem, um produto correndo para montante, para as cataratas de uma cidade-paraíso, um produto vindo da foz morta, uma aparição revertendo o ciclo de vida a traços longos e brancos, uma luz intensa sai deste rio.
Fumo. Uso um chapéu e sinto-me aristocrática, uma freira talvez.
Na mão direita ostento com vigor um guarda-chuva, eu durmo ou desmaiada estou entretida estou estou esculpindo uma caveira num toco de pau, no caos dos instantes em que não sonho, não me tenho lembrado dos sonhos, não me lembro de ter uma ponta afiada, lembro-me de sonhar, tomei nembutal? Não. Bebi cerveja ao balcão e fumei vários paivas em jejum encostada à árvore das caraíbas, perguntei se a antiga colega… quem é ela a fazer de mãe? Sei que a africana leva às costas dois pequenos bebés, nós adoptados.
Um homem olha e imagina que dele sai um outro homem com olhar transparente que sente vontade e deseja ou deseja e vem-lhe a vontade.
Eu vejo um subterrâneo cheio de insectos graníticos e invoco representando uma pose incrustada no ventre de um homem que se atira para o escuro, azul marinho onde uma felina em posição genital se roça ao lado de um velho de nariz vermelho, caminham para a foz morta, ao mesmo tempo vigiam os pontos de luz do subterrâneo, a felina leva às costas dois bebés que se abraçam e o terceiro é renegado, há sempre uma terceira de ciúme e yantras, o número funâmbulo de Seth, talvez a possível explosão da sereia, o demónio vermelho de inveja da plebe, Paracelsus a criança do sol junto à foz morta de um rio com a grila de fora, o meu oceano aceita todos os grilos na minha corrente, diariamente atingida pela ira das águas.
No céu, as nuvens púrpuras do pôr-do-sol ameaçam a esperança do rio revertendo-se azul na realidade que separa a audiência presa a uma perspectiva unidireccional, homens que olham o granítico subterrâneo: o velho e a felina ostentam a fé estampada no guarda-chuva: mudar de vida, mudar de sexo para que os sonhos das nossas luas se tornem reais e não cibernéticas. Vivas.
Dos vários ângulos riscam-se cores, a composição dos contrários. Existe a fuga além do nosso olhar de domingo de trabalho, fundimo-nos no interior das cores, pintamo-nos com óleo chorando quinze minutos disfarçadamente após a anulação do amor-próprio nos vértices.
Na pirâmide a cor esbate-se num último acto tentando ser perfeita e não em looc ser. Leves e suaves nos dias dele, os dias de hoje, os meus dias quando vivo, à minha volta em exacta harmonia desejada com o alfabeto, gamada emprestada comprada nunca devolvida queimada deitada fora dada de presente admirada adorada ou mesmo representada polvilhada com mel e pimenta em contraste saboreada na língua boca olhos saliva peito cores gargantas multicolores focada com luz de néon em strobe preto e fumada com branca no carnaval.
Algo ainda escapa… porque nunca passamos a festa juntos e certas formas importantes como o eyeliner ficaram escondidos com o passar do aqui e agora, essa pomba tão perfumada em fotografias que a tua ex colava à parede.
Já só existe a fuga prá escuridão que as fotografias iluminaram antes de queimar, sobre ela cai a errata: nunca tentara tirar um rolo da câmara e então o acontecimento foge todo pelo vértice maior da pirâmide, a maldição faraónica cumpre-se, assemelha-se ao suave fetiche, a tua pele branca, um tapete branquinho como neve ao sol da meia-noite, a aurora borealis leva ao peito o teu cabelo escorrendo estrelinhas pelos ombros abaixo em direcção de fuga, o teu tronco aparece-me querido vestido com lã de ovelha negra, o céu com estrelinhas reflectidas projectadas num espelho, aos impulsos da minha memória falta harmonia, equilíbrio orgástico, liberdade florida por detrás de ti — meu querido bígamo, asas de anja eu sou rasgada de violeta nas paredes e naquilo que só existiu em ficcionais livros e cds, à balança faltam aparelhos de gravação compacta, afifo-te discos, disco-te o número da sorte, afifo-te a lotaria e pergunto-te se essa vaca dessacralizada te oferece a sua pele, a sua mortalha mais colorida, azul de raiva marinha, aquela por baixo da sorte rádio digital e colunas de trinta vátios.
Tenho vontade de construir uma balança, gostaria que esta comunicação fosse possível sobre a catarata e eu não adormecesse azul clara do ciúme na margem rosa e soubesse que ainda assim te amava, como é difícil ter a certeza, dependo de ti para não ser insegura, e ainda mo disseste inconsciente nos pilares da ramada de outono, vasos de flores, o pénis na sua florida jarra decapitada a alma, o jarro ao ombro do homem fiel, fiel à balança apontando ao céu meus olhos em fuga por onde não me lembro mais. Era um teste eu onde chumbei. Comecei a pensar que era verde, sonho alto que era uma lanterna verde do além terra, gloso altas estrofes sobre o fiel fálico, avistam-se as últimas cores da fuga porque dizes verdades de ruptura nervosa como ainda queres transar comigo acompanhado de rosas brancas e eu feita estúpida duvido, não creio no absurdo, queres clonar-me?, voltava velha à vida, tu não precisas de mais uma ex para eu te foder ainda, não creio no absurdo das palavras debotadas, escuras palavras nada valem, valem o que valem os azuis de raiva, vale a ideia de quem escreveu para não se esquecer e poder comprovar que realmente o mundo pára e aqui se gera a visão da palavra perfeita, a representação imperfeita porque a verdade não pode ser perfumada, cheira mal mas pode ser retransmitida por mim, a mulher que contempla estendendo-te a mão, lutando por ti, sou eu a resistir ser levada pela corrente, nadando contra a foz morta, tu és frágil e mexes com o meu inconsciente que procura modelos para descobrir porque nasceu, e agora não quero ser levada pela corrente, agarro-me a ti e retransmito a tua força, quero que me salves. És forte.
Tudo está em movimento, a foz turbina, não!, as pombas já não se suicidam de encontro às janelas, és forte, a tua pomba é venérea, eu a tua pombinha acasala-te e tu sabes isso, sou a tua súcuba, o teu ponto g na minha vulva, a antiga ponte ligando os vasos de flores ao leme onde tu meu faraó fumas a sobra das nossas priscas virtuais, eu olho para ti minha ganza e vejo uma prisca virtual no meu sonho cibernético, vejo o que sobra de um ouvido no xadrez incendiado, no útero escuro da papagajos com verdinhos bicos aconchegando vermes ovulados em forma de bebés para sempre no rendimento mínimo, uma vez mais os nossos cérebros siameses não se cindiram para observar e registar que continuas a ser só meu e não dos sons de ninfas e narcisos que a multidão deseja por malícia que se confirme, aguarda ao sol de domingo na missa santa, bate quase palmas de ironia sociológica amen.
Olho e vejo. A multidão espera o casamento na foz morta e o meme que a seguir subirá o rio carmim, o meme hermafrodita, olho e vejo: no corpo da bela a cabeça do belo, gatinhos mortos é de mau gosto, olheiras carregadas e cabelos já cãos do bustos ainda não esquecido da tua ex fatal. É impossível definir o significado, a dispersão evolui além do mundo mental e sempre o mesmo vazio, antes de Planck, sempre a anulação dos sentidos e do ser racional gerado pretensamente no momento do último orgasmo que abortou o gatinho e por isso morro de desgosto, um gatinho morto subirá o rio carmim e transformar-se-á na tua cadela, obrigando-nos a anular o sentido do talmude, dos sentidos e do ser racional, obrigando-me a afirmar: parar olhar e sentir paz, amoras a separar o céu da terra, não éramos nós meu amor que nos lambíamos eternamente dentro do sonho recorrendo a dispositivos? A tua ex dizia que pintava aquilo que via e tu reinas no céu, enquanto eu não vejo paz nem amor, só ciúme e enterrada estou e vejo a ilusão ficcionada da distorção esquizofrénica escarrapachada nas vozes que comentam na multidão. É fácil achar que nada é real. Nada é de facto real e o modelo de balança que construí não é perfeito, os sentidos são duplos, negados, sentidos sem sentido, jogos de bisontes-fêmea onde nada faz sentido, bissexualidade ambígua nesta noite de carnaval? O modelo não é perfeito. Sei que adoro uma representação, uma ganza de graça, tu adoras que a tua ex te pergunte se ainda te masturbas e como o fazes, adoro rotações e translações e círculos avançando nas elipses do infinito invisível.
Para quê explicar o sentido? Tu gostas de explicar o sentido, tu gostas de representar. Vive masé! Pra quê explicar o sentido, o homo normalis não vê a verdade da aurora, as imagens cristalizadas em pureza, eu não gosto de ser representada mas sim amada e não adorada como deusa que sou, eu não sou sem sexo, é a força dos impulsos que nos atrai, será que devemos renegar os impulsos minha loba solitária?, o sentido é tão estúpido e procura-se muitas vezes onde ele não está, a mim parece-me que ele existe nesta perspectiva: virgem é a mãe, estamos perante uma cidade paraíso numa foz às portas da morte orgástica mas puramente animalmente bruta, eu serei sempre essa criança nada morta, irmã namorada filha mulher amante médica pintora ou psicóloga mas sem nunca ser digna, essa será a minha última vontade, não quero amigos, que interessa se o próximo me passará as mãos pelas coxas dizendo que muito calada estou, dizendo que anda mouro na costa e eu sempre como criança ingenuamente perversa dizendo: mas onde vês tu essa presença?, não vês que ultrapassar a moral da dignidade... seremos loucos de mais para nos termos?, ainda?, meu próximo ex morto e eu felina abortando a nossa prima obra. Ultrapassar a moral da dignidade e dos filhos, esses que construam a grande obra, lança-os às cadelas para que construam a grande obra: madalena arrependida.
Alegra-te que é noite de carnaval, sonha ganza comigo ao ler:
yours forever manuelle.
Post-scriptum: estas palavras foram escritas num já certificado estado de loucura, talvez nunca consigam perceber o porquê do nonsense em já num escritas foram palavras estas: scriptum-posT
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manuelle biezon
domingo, 3 de outubro de 2021
O radical do meu medo
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Chegamos a rua e separamo-nos dos rapazes. Rob e eu, vamos para casa de Rob. A escuridão, as ruas hoje parecem estranhas, as pessoas, tudo, algo não está bem, pressinto, será esta realidade uma alucinação só porque comi cogumelos ou são os cogumelos apenas placebos?
As situações mais estranhas são aquelas em que eu não sei distinguir a realidade da alucinação, ficar na dúvida. Por exemplo, ao ver uma balança de peso daquelas de consultório médico dentro de um café com um balcão e petiscos, tirar uma fotografia, revelar o rolo e verificar que esta balança não foi impressa nem está presente no negativo, duvidar se, de facto, a balança estava no café em vez de na farmácia ou se era a máquina fotográfica que estava enfeitiçada e funcionando mal, filtrando a realidade como consequência ou se apenas fotografei a farmácia sem me lembrar lá ter entrado.
O radical do meu medo em distinguir a realidade da ficção psicológica é ainda não ter perdido por completo a ilusão do quão grande poderia ter sido no passado, e tendo preferido tudo esquecer renegando o passado e, agora já sem passado, estar em vias de perder a minha identidade na metáfora da cabeça às vezes fálica e, agora já sem corpo pedir, desejar mesmo o mal menor, o toque eventualmente violento de uma nova forma, o implante no meu corpo, já sem forma, de uma metáfora: uma estrutura nova e com afinidades que se desejam sociais.
Mas ainda recuso esta caridade porque não gosto que tenham pena de mim, eu mesmo sentindo-me um vagabundo tenho vergonha e não quero caridade por pena ou por medo do que o meu aspecto possa provocar.
O radical do meu medo é poder explodir e tudo à volta do meu centro ser destroçado nas réplicas. Não é o desejo de morte, é mesmo o desejo de não morrer e não fazer vítimas, de não ser eu ou eles, é aceitar sofrer por um canto, um pouso cujo ângulo se abre para a envolvente de um mundo real que desejo sem ilusão.
Caminhamos calados.
A certa altura, ele toma um caminho diferente. Pergunto porquê e ele diz que quer ir por aqui. Digo-lhe que é mais longe por aqui. Ele repete que quer ir por aqui. Sigo-o. Começa a chover. Subimos as escadas ao lado da catedral de St. Finnbar. Rob pára debaixo de umas árvores. Pergunto-lhe porque paramos. Diz por causa da chuva. Mas já não chove, digo. Continuamos a andar. Eu não quero parar.
Desde que tomamos este caminho mais longo, estou desconfiado. Rob já não é Rob. O casaco que Rob usa, um casaco parecido com os casacos da tropa, já não é o casaco que Rob usa, é o casaco roto e vagabundo de um aprendiz de informações da Inteligência.
É o meu eu. Ele quer queimar-me. Tenho informação sensível. Ele é o irmão que eu nunca tive. Vejo nele a autoridade de um mais-velho, de alguém que, embora mais novo, sabe mais que eu, e ele quer-me queimar, eu sei. Tenho problemas em seguir a autoridade porque, para isso, é preciso fé e a fé é uma espécie de amor, eu sinto que a autoridade se parece impor sobre mim recorrendo à insídia, tentando-me com vantagens, ignorando a minha voz se hesito e rejeitando os seus avanços. Ponto por ponto. Etapa por etapa. A autoridade do mais-velho vai-se impondo como uma fé, como um amor de sangue, de irmão para irmão, o irmão que nunca tive.
Ele tem as mãos nos bolsos. Calça botas cardadas. Parece forte demais.
Desconfio que me esteja a levar para algum lado perigoso onde pararemos por causa da chuva e me assassine dentro de um túnel e invoque mais tarde ser um polícia no cumprimento do seu dever.
Por isso, não paro e caminho no meio da rua alguns metros à sua frente, enquanto ele vai na sua paz pelo passeio. Existem alturas em que detesto o Jean Genet.
Olho as casas, para todo o lado, rio de medo, Rob diz: descansa, apenas quis vir por este caminho mais distante e já vais ver onde isto vai dar.
Olho para o céu e imagino que este azul-escuro com poucas estrelas se move, digo-lhe a rir que este céu parece um grande ecrã de cinema. Vejo um filme onde entro como espectador de «Phaedra’s Love» na sala do teatro e na rua durante a matança final.
I am not so bad, eu não mereço morrer, não tenho tanta culpa como Hipólito que vivia ali entre búrgueres, carros telecomandados e socas inseminadas, que havia também uma mulher para esquecer e que outras havia, vinham, apareciam e se apaixonavam pela nossa rudeza de subúrbio, queriam ajudar queriam ajudar e acabavam humilhadas jurando vingança e produzindo a prova. Não, não sou tão mau.
I am not so bad, mas tinha de ir embora para casa depois do espectáculo dos Corcadorca recusando o convite para tomar chá dos colegas de trabalho que vieram comigo ver a peça. Senti-me Hipólito, identifiquei-me com ele, identifiquei-me com o padre e com Fedra e com todos os que tentam ajudar, senti-me opressor e vítima, nada me bateu tanto, fiquei em choque, vivi o meu assassinato quando o pai esventrou Hipólito. O meu pai matou-me, um padre confessou-se, um amor etéreo subiu ao céu com a santificação da vítima. Existem alturas em que detesto a Sarah Kane. Take it easy, you’re gonna make it man, take it easy.
É verdade, consegui, chegamos a casa de Rob. Cinco da manhã.
Ao entrarmos na sala da televisão, vemos o americano Joe, que vive com eles de borla pois não tem dinheiro, dormindo no chão. Digo a Rob que vou para a outra sala, a sala interior que tem três sofás. Rob fica e eu vou, quero dormir, quero fugir ao que me parece a matança, tenho medo de todos os pais, de todas as famílias que vou adoptando no meu percurso, ou seja, quero esquecer e acordar amanhã num novo dia e melhor, mas não tenho grandes esperanças em adormecer. A minha primeira vontade talvez não seja adormecer mas, sim, ficar sozinho, porque durante o caminho senti um medo inexplicável de toda a humanidade, humanidade que se personificou no corpo de Rob.
Fico só e sinto-me em segurança ao pensar que o pior medo é aquele que sentimos por nós próprios, o medo de não confiarmos na nossa mente, o medo de o chão desaparecer e nós cairmos, cairmos num poço sem fundo, muito fundo, para todo o sempre desligados da realidade consensual onde somos obrigados, por convenção, a viver porque nem todo o humano é ou pretende ser um animal, ou como Caroline me disse uma vez quando eu não conseguia encontrar uma determinada sequência numa cassete vídeo: «take it easy, you’re gonna make it.»
Tento então dormir. Olho para o escuro desta janela dando para o mundo exterior, sem cortinas nem estores, janela carregada, neste momento, com uma tira em vermelho escuro e espesso, difundindo-se no negro vertical do resto da janela à superfície do meu pesadelo. Pergunto onde estará o inferno se existir, se dentro desta sala ou fora desta janela dando para o mundo, a janela, sem sombra de dúvidas, é a porta que dá entrada.
Sempre me perguntei se quando sonho sonho a preto e branco ou a cores mas, uma vez, o sonho veio a preto e branco como normalmente e, depois, acordei assustado após ver surgir a cor, a realidade fotográfica de um pequeno quadro que tinha feito anos antes.
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John Moore