segunda-feira, 15 de junho de 2015

A minha mãe é diabética, já teve um avc mas ainda não usa insulina. Além da dose insuportável de comprimidos, o médico prescreveu-lhe exercício físico. Já tentámos que fosse fazer piscina mas ela tem vergonha. Nos últimos meses temos tentado convencê-la a fazer caminhadas. Comprámos-lhe um fato de treino, umas sapatilhas, para a incentivar. Ela dizia que não tinha mas também a vontade de ter era pouca. Eu pela minha parte tentei dizer-lhe: «Lembras-te quando eu estava doente, tu dizeres-me para eu não desistir, para eu tomar banho, para me fazer gente? Agora és tu que parece que já desististe... vá lá lembra-te do que me disseste há anos.» Esta minha conversa ao telefone pareceu ter resultado com ela, pois foi caminhar duas ou três vezes numa semana pela fresca da manhã na companhia do meu pai. Mas foi sol de pouca dura, tem sempre muitos afazeres. E se a tentativa de eu apelar ao passado e ao modo como eles lidaram comigo parece resultar às vezes com ela (porque me tem amor e vê nas minhas palavras igualmente amor além de preocupação), com o meu pai esta estratégia não resulta, eu tentei dizer ao meu pai: se ele não a acompanhasse na caminhada, ela provavelmente não a faria ou, se a fizesse, estaria sempre a parar para falar com esta ou qualquer vizinha. Quando tentei explicar isto ao meu pai, ele irritado disse: «O problema é dela!» 
Neste momento, o meu pensamento bloqueou e não disse o que pensava, calei-me a pensar: «É este o amor que tens pela minha mãe. Queria ver se ela nos morresse e, se tu de mim pouco pareces esperar, queria ver qual das tuas filhas ia tomar conta de ti...» 
Mas calei-me, não disse nada, minutos depois eram horas de me vir embora, vim para casa, tive dificuldade em adormecer e pensei em quão ingrato é o meu pai que sempre foi uma pessoa doente e sempre teve todo o conforto na convalescença. Hoje em dia, eu que um dia me virei a ele e ele, em vez de me dar o correctivo que talvez merecesse, preferiu ser cobarde e chamar a bófia ao filho... eu que um dia mais tarde fiz com ele as pazes quando esteve quase a ficar paraplégico devido à queda de uma ribanceira na aldeia... enfim, pormenores que não interessam a ninguém. Quão ingratos podem ser os velhos. A bondade humana existe mas só nos faz bem quem de nós gosta. Quando não gostam de nós, o melhor que se pode esperar é que nos ignorem, a partir daqui é sempre a descer, podes ser ingénuo e admitir que erraste mas nunca te perdoarão, olharão até com desprezo a tua tentativa humilde de restabelecimento de relações e se não o disserem pensarão: «vergaste por fim... o respeitinho e a boa-educação...»

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