sábado, 1 de junho de 2019

Dandy, monk and clown

O texto abaixo faz parte do meu segundo livro (editado apenas em pdf) e é uma reflexão sobre a opinião, pública ou daqueles que comigo se cruzaram até 2002, e que me marcaram ao ponto de eu me estilhaçar e ser internado. Até 2002, havia sido internado por duas vezes e das duas vezes havia uma mulher diferente no meu coração, a primeira havia sido minha namorada uns anos antes e a segunda era uma antiga amiga que eu andava a tentar cortejar. Quero deixar claro que não as culpo de nada do que me aconteceu posteriormente e foi até necessário que «eu caísse»: ao menos ganhei raízes. Agora se eu não as culpo, houve quem as culpasse e na sombra lhes fizesse mal. A mim, insultavam-me, ofendiam a minha auto-determinação, a minha vontade de viver sem ninguém ter nada com isso. Destas duas vezes, os insultos deles surgiam nos cafés, nos comboios, em aulas teóricas. E eu ficava calado, não compreendia o porquê e chegava a casa agoniado e alienado com a estupidez de, por exemplo, quem nunca apreciou oferecer um minete à mulher. O que eu na altura se calhar deveria ter feito era usar os pulsos contra aquela manada de ótarios que vai às putas por um menu de broche e cona (o extra é mais caro) mas seria apenas eu contra a manada. De modo que me vinguei escrevendo o primeiro livro (também apenas editado em pdf) onde ficcionei e confundi ainda mais toda a minha história, disse: se eu sou o mau, o mau vai viver para vos atormentar.
E foi assim que houve, da terceira e quarta vez que fui internado, novas mulheres por quem me interessar, mas se anteriormente eu era jovem, belo e de grande potencial futuro, agora era apenas um gajo sem emprego, a quem tinham caído os dentes e o cabelo e portanto já não era (e hoje também não) um gajo atraente e com sex-appeal. De certo modo ressabiei e larguei a condição de vítima inocente, a opinião pública agora via-me como um palhaço alegre, ria-se de mim e eu ressabiei, disse: vocês vão pagar e comecei a escrever cartas bomba, é obvio que não entreguei nenhuma em papel, lembro-me no entanto que enviei alguns emails e comentários em blogs nos quais se tinha alguma razão logo a perdi devido aos insultos utilizados, isso deu-me moral para começar a discursar pelas ruas sózinho, falando, insultando para o ar, tornei-me bandido, tão criminoso como a opinião pública.

A actualidade é pacífica, continuo um gajo com má imprensa porque sei que as minhas palavras tornam feios os meus pontos de vista, mas estou sossegado. a minha pulsão sexual diminui, a minha vida amorosa está tão estabilizada que é inexistente: o amor faz-me mal, foi isso que aprendi com os meus erros. além disso, tornei-me conservador, já não quero morrer, mas sei que morrerei em solidão. também já aceitei que, para a opinião pública, as dores do outro são mais aflitivas que as minhas, vejo isso todos os dias comparando-me com os meus vizinhos, eu estou bem melhor do que eles, eu queria fazer alguma coisa por eles mas eles próprios estão-se marimbando para as minhas tentativas de ensino, tudo neles gira à volta da doença do dinheiro que não têm, eternas vítimas que não lutam por si, eternos conformistas que se limitam a aceitar as esmolas, a sua mente não vê mais longe do que isto. E depois quando uma mulher me renega porque outro homem precisa mais de companhia que eu, eu digo: vai à tua vida e não me ligues mais, nada mais há para dizer, não vou fazer chantagem emocional para que comigo fiques, talvez não te ame e logo não me humilharei nunca mais por ninguém. São sempre palavras que eu digo definitivas, que eu quero defnitivas, mas são sempre temporárias. Eu cedo sempre e o que disse antes logo perde a validade porque, se o amor me faz mal, eu quero amor, dar e receber em igual medida mas não sou eficaz, não descobri ainda a maneira de continuar a dar liberdade ao amor e impedir que ele me fuja.


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Da primeira vez, o mundo está contra mim porque tenho um segredo tenebroso escondido na minha mente. Frequentemente, em comboios surreais ou aulas teóricas insólitas ouve-se falar de limpeza com a língua antes do acto, ou que se já se sabe da verdade em determinada altura e só falta saber a realidade após essa altura, isto porque alguém foi descoberto, posto a nu e agora fala com ódio. O mundo é tão odioso nos sua repressão ou supressão de sentimentos ou memorias moralistassexuais indesejadas! Então, não acredito na realidade que está a acontecer, é demasiado incrível tudo o que acontece, sou um céptico à procura de microfones, lutando contra a realidade, impondo a minha presença perante este mundo, este público estranho e acusador. As vozes dizem talvez: «Que nojo, está apaixonado por uma mulher nojenta e bruxa!» 
Da segunda vez, o mundo está já em paz comigo, o mundo é hilariante, cómico, isto porque eu já aceitei a realidade de mim próprio e da minha relação com os seres humanos e parece que eles, se não compreendem, pelos menos aceitam a minha realidade. As vozes dizem agora: «oh que fixe, ele está apaixonado por uma mulher grande e bonita!» Então, acredito, sou um crente, na minha realidade e na minha relação com o mundo, sou um andarilho cómico espalhando a minha langonha na web, rindo-me de tudo, tudo é bonito, não compreendendo ou não querendo saber que esta realidade é uma ilusão.
Deixo ao vosso critério escolherem qual das duas situações é a mais aceitável e a mais "real". Pergunto como será a próxima vez? Que sensações e realidades existirão? O que dirá o público e o jornal? Ai minha noxa xenora minha xanta engráxia... o que dirão eles, as pessoas? Talvez me passem a adorar e me tirem uma fotografia anónima, turística ou talvez me chamem de doce vampiro ao tentar sugar a identidade e propor-me como alternativa para a mulher que no momento me atrai visualmente. Não, nada disso se passa, apenas bater no fundo e ter de começar de novo morrendo da cura, o cinismo e a misantropia são o evitar de assuntos sociais e origina reflexões, reacções e revoluções. Ascetismo, eliminar a vontade?, bela merda! Será que devo eliminar o desejo, a ambição de me superar a mim próprio? Afinal de contas, quando morrermos esta vida, vamos ser julgados, como eles dizem, mesmo que nos flagelemos numa cela escura a la santo agostinho e tenhamos visões êxtaticas devido à supressão voluntária da comida ou que mais outras tretas e supostas técnicas os místicos e outros teóricos que se fossem mais espertos fariam apenas mutus libers e não apregoariam ao mundo o quanto bons são e o quantos céus e anjinhos belinhos e deuses ou deus poderão lamber o cu se de facto forem bonzinhos ou contribuírem para a causa de corpo, alma e dinheiro, cegamente, sem discussão, como em Auschwitz ou Nuremberga ou Jenin ou Washington ou Moscovo ou todas as outras ditaduras disfarçadas de democracia ou sociedades ditas de secretas e detentoras, como dizem, de toda a verdade e um só ponto de vista, arrogando-se o direito de dizer que tudo foi provado pelo método científico postulado por Francis Bacon quando às vezes nem sequer o fogão sabem acender.
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Claudio Mur em 'Manual de Sobrevivência'


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