'
1. Ao fim do almoço tomando café:
A minha mãe diz: -- Ru, estás mais magro.
-- Lá estamos nós outra vez, não há outro assunto de conversa?, que importa se peso menos ou mais quinhentas gramas?!, querem fazer disso assunto nacional?, tanta criança a morrer de fome e vocês preocupados comigo, tenho quase cinquenta anos, bolas!, já está a altura de descansares, mãe, não é?
-- Nota-se nas calças...
-- Não estou nada mais magro! Há duas semanas admitiste que estava mais gordo, agora emagreci, não há paciência.
-- As tuas calças estão mais largas, essas por exemplo...
-- Isso é porque passei todo o tempo frio com calças de fato-treino por baixo, isso fazia engordar as pernas. Outra razão para parecer que as calças me caem é este cinto que comprei nos chineses, ele fez os furos mas ficou largo, devia ter feito mais um...
-- Foste ao sapateiro fazer os furos no cinto?
-- Ó mãe, se comprei o cinto nos chineses e ele tem a máquina de fazer furos... porque haveria de ir ao sapateiro, duh...
-- Ah tábem.
-- É, ele é mais um terrorista!, diz o meu pai que até então comia uma fatia de melancia.
-- Eheh... quem?, o chinês da loja?, pergunto eu divertido, já conheço as ideias do meu pai.
-- É um espião, está a mandar dados para os chineses!
-- Para o Xi?, eheh então deveria dizer: «Senhor Xi, veja lá se fabrica melhores cintos porque este é já o quarto cinto que compro em seis meses, depois de os outros se desfazerem nas minhas mãos», eheh...
-- Ó Ru, não desconverses.
2. Às seis da tarde:
Saio do anexo, subo a escadaria e abro a porta e casa, dirijo-me à cozinha. Meu pai está sentado a preparar hortaliça para fazer sopa. Eu começo a desmontar a cafeteira para fazer café de saco, o meu pai diz:
-- Tomas muito café!
-- Não tomo nada, estou a tomar metade dos que tomava.
-- Ainda há pouco tomaste um, diz ele.
-- Ó!, tomei um café-galão de manhã que tu viste antes de me deitar, depois tomei um quando acordei no fim do almoço, foi quando a mãe falou das quinhentas gramas a menos, há bocado tomei um cimbalino no café e agora este... quatro cafés.
-- É muito café, faz-te mal.
--- Antes ia ao café oito vezes e tomava oito cafés, agora tomo metade, eu preciso de estar acordado à noite, não faz nada mal, olha... eu já cometi excessos mas agora não, olha... por exemplo, no tempo da faculdade... ia às três da manhã para o bar da associação com os livros e no meio de toda a gente a beber, dançar e a fumar, eu estudava e bebia café!, quer dizer... também apanhei bebedeiras de cerveja mas sempre fui um gajo de tomar café... por isso... agora, estou quase um santinho!
-- É, vais para o céu!, diz o meu pai.
-- Não!, não quero ir, lá nas almofadas das nuvens só se dorme e os anjos não têm sexo, é o que se diz, não se faz nada no céu!
-- É, queres ir para o inferno ser queimado!
-- Ó, que importa!, pelo menos tem lá belas mulheres.
Quando digo isto, reparo que meu pai está a sorrir, ele por debaixo de toda a sua austeridade ainda se ri. É o que vale.
'
Claudio Mur
Sem comentários:
Enviar um comentário