Ao preparar-me mentalmente para escrever este texto lembrei-me que o chefe gaulês das histórias do Asterix tinha medo do céu lhe poder cair em cima, pois foi isso que me aconteceu há quase trinta anos: o céu caíu-me em cima e, voltando a parafrasear desta vez o Wilhelm Reich, o estranho seria que tal não acontecesse, ou seja, estranho seria que eu não me revoltasse, é claro que me revoltei e o céu na sua qualidade de autoridade mental me caiu em cima e me reprimiu e me alienou durante mais de dez anos, eles dirão que me curaram e que tudo foi necessário, eu digo ok, ainda bem que não morri da cura e estou vivo e lúcido para contar.
O certo que uma das razões para o meu colapso foi a minha família, em especial o meu pai, eu hoje que estou de bem com ele, porque no fundo mais vale ter um pai do que não ter nenhum e como diz adasilvao@gmail.com (meu amigo editor que tem um filho adolescente) entre pais e filhos não deve haver lutas entre fascistas e comunistas, querendo ele dizer que a relação deve ser saudável... dizia eu que há trinta anos eu revoltei-me contra o meu pai por sinais que não estavam claros para mim e hoje eu sei que tinha razão e estando hoje são consigo comunicar com o meu pai e ter conversas com ele, no fundo agora é como deveria ter sido sempre, agora temos confiança um no outro, quero dizer que temos diferenças e conversas acaloradas ao almoço mas pelo menos comunicamos e ainda temos tempo de ensinar alguma coisa ao outro, já não é como antigamente quando o meu ódio latente, perante a sua indiferença ou a sua incapacidade em ser um pai para mim e me ajudar quando eu precisasse, fazia com que simpelsmente não houvesse comunicação, tudo isto a propósito das polémicas com a igreja católica: ele e a minha mãe são pessoas que vieram do meio rural para a cidade há 50 anos e tiveram a sorte de ter emprego fixo sem falha, portanto estão hoje relativamente bem, enquanto fazia o meu café de saco após o almoço, o meu pai diz a minha mãe:
-- Abuso é qualquer abuso. No nosso tempo eles fechavam-se lá dentro no confessionário e ninguém os via, às vezes a gente nem sabia se não era um pide que estava lá dentro.
[continuação dia 12 de Outubro]
E esta afirmação do meu pai mostra que nem ele pode continuar a ignorar o problema dos abusos provocados pelos padres, o meu pai que nesta sua posição continua coerente, ele sempre preferiu não saber das coisas, foi o que eu disse um destes dias a adasilvao «o meu pai nunca me deu dinheiro mas nunca me proibiu de nada, mas ele preferia não saber e não lhe chegar nada ao nariz, assim ele poderia dizer que não era culpa dele», é uma posição semelhante que alguns rebeldes tomam quando interpelados na rua por um jornalista a propósito de qualquer coisa, dizem «ah não sei ler...» e afastam-se.
Há dias, o meu pai dizia «não sei porque não investigam as outras religiões, só os padres é que são maus!», a minha mãe comentava «Isto é tudo porque eles não podem casar...» Eu na altura respondi-lhes: -- Pai, todas as religiões abusam dos fiéis, mas vivemos numa sociedade que embora laica é largamente católica, não podemos resolver os problemas das outras religiões sem resolver o problema da nossa, e não, nem todos os padres são maus, olha... o padre Mário da Lixa de quem também vocês já ouviram falar era um padre bom e outros bons há, mas há padres maus e basta um caso para manchar a honra da igreja... até o padre da nossa paróquia, ele é um bom padre mas... já quando eu era adolescente se falava que ele andava com a Geo... e olha, eu não tenho nada contra ele ter uma criada mas...
A minha mãe aqui comentou: -- Ela chegou a dizer que os filhos dela não eram do marido e a verdade é que o padre tem estado doente e ela continua a ajudá-lo.
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