sábado, 31 de agosto de 2024
sexta-feira, 30 de agosto de 2024
segunda-feira, 26 de agosto de 2024
Ligação directa
https://mynationunderground.blogspot.com/2024/08/almas-riscadas-no-muro.html
Muito obrigado pelas palavras.
domingo, 25 de agosto de 2024
Mimos para elisa
sábado, 24 de agosto de 2024
Boliquei-me
É claro que Rogério, depois de aos dezoito anos ter deixado Gloria Filho de Cisne pendurada na paragem do autocarro às três da manhã numa noite de greve dos motoristas em que os serviços mínimos dificilmente seriam cumpridos e seguido num uber chamado com a aplicação do telemóvel emprestado pelo pai, depois de aos vinte e cinco anos se ter formado em advocacia e haver conseguido tirar o estágio profissional com o alto patrocínio do homem do cadeirão seu primo na alta finança, depois de aos trinta anos ter conseguido apropriar-se com a ajuda dos ácaros das criptomoedas aconselhados pelo grande especialista em informática da marquise lisboeta de Boliquei-me das accões e títulos em caixa de várias nano e micro e mini e pequenas empresas e ter construído o seu império na área dos serviços, sentiu uma necessidade enorme de oferecer bolas de futebol e frigoríficos ao seus vizinhos, porque passou numa feira do livro e comprou um livro do Orwell onde ele passa fome vivendo num hotel com seis francos por dia há um século. Seis francos vezes trinta e três escudos do câmbio dá aproximadamente um euro hoje um século depois. Rógério foi eleito com aclamação popular.
Rogério hoje, tendo caído do cavalo e sendo um presidente destituído e reformado por invalidez, lembra o seu tempo há setenta anos quando o pai lhe pediu o telemóvel de volta e o pôs fora de casa porque a mãe da Glória não perdoou a afronta feita à filha e a enorme conta de prozacs e rapé de nariz usados na convalescença dela. O pai pensava à antiga e Rogério teve de se fazer à vida. Eis um primeiro relato do seu diário:
09-10-21,12h43 PM
Estou em casa. Já almocei. Aqueci no microondas um prato com arroz, massa em meia lua com sardinhas em molho de tomate refogado juntamente com finas fatias de alho, cebola, cenoura, azeite e pimentão vermelho. Já tomei café. antes de almoçar, lembrei-me de transcrever do caderno finado as duas anteriores e primeiríssimas entradas neste novo caderno.
Reparo que o facto narrado de não haver troco, uma moeda de cinquenta cêntimos, para a cerveja ser falso. Há de facto um estojo cor-de-laranja que contém o dinheiro em caixa das bebidas que estão no frigorífico do hall de entrada à disposição dos hóspedes. Havia, de facto, dinheiro em caixa mas era a minha primeira noite de trabalho, não me lembrei da existência do estojo e disse ao hospede que não tínhamos troco, acabando ele por mo oferecer e eu registar como entrada. Na noite seguinte, o patrão deu-me a gorjeta que eu tinha registado.
Recebi uma segunda gorjeta na segunda noite de trabalho, ontem, quando admiti completamente fora de programa um casal português às sete da manhã num quarto sobredimensionado, pelo qual cobrei erradamente o preço económico. A minha gorjeta consistiu em o cliente arredondar o preço e oferecê-lo a casa. Eu registei a oferta e o patrão chefe quando chegou, ou melhor, quando a segunda chefe filha-do-patrão chegou às nove da manhã ofereceu-me o euro da gorjeta.
Em relação a bebidas, esta noite vendi uma garrafa de água a um cliente num quarto económico na cave.
Neste momento, é uma da tarde do segundo sábado de Outubro. Terminei a minha terceira noite de trabalho às nove da manhã. Ao sair, levei o lixo ao contentor e acendi um charro a caminho da estação de metro. Resolvi reactivar a assinatura mensal do transporte público porque o vou utilizar todos os dias e compensa tirar o Andante. Foi logo na primeira manhã de descanso; antes de chegar a casa passei na Loja Andante da Trindade, tirei a senha e esperei a minha vez, havia setenta pessoas à minha frente e eu estava com pressa; resolvi ir sem bilhete a outra loja andante onde eu sei que o serviço é mais rápido porque é uma loja menos central que tem menos procura; concluí o processo em quarenta minutos. Voltei para casa com o propósito de dormir.
Dez e meia da manhã e eu sem sono. Foi há dois dias. E ontem também não descansei, não dormi de dia e hoje também não. O que eu pensei hoje às nove e meia da manhã quando esperava o metro de regresso a casa era que hoje também não iria dormir. Pensei também que me esqueci de despejar o cinzeiro utilizado por mim durante a noite. Levei o lixo ao contentor mas antes esqueci-me de despejar o cinzeiro. Não foi por mal, foi apenas esquecimento, tenho de melhorar os pormenores, afinar o meu trabalho.
Por exemplo, hoje servi pela segunda vez o pequeno-almoço a um casal de polacos. Hoje correu bem, ontem foi mau demais. Servi-lhes o café antes do leite, eles levantaram-se para ir procurar uma malga para pôr os cereais, o que é uma tarefa minha e que hoje corrigi. Ontem, tive a desculpa por ter sido a primeira vez, hoje correu melhor: até lhes falei dos quarteirões locais com exposição e venda de arte para eles explorarem enquanto estão na cidade.
O chefe patrão vem sempre às seis e meia da manhã fechar as contas da noite e abastecer a Residencial de alimentos e outros artigos, pão e croissants frescos para o pequeno-almoço. Ontem, ensinou-me a montar a mesa com os pratos, pires e chávenas, a colocar celofane no pão e no croissant, a preparar as fatias de queijo e fiambre; mas ontem esqueci-me de colocar o açúcar e as colheres para os cereais. Hoje corrigi. Montei a mesa às seis da manhã e quando o chefe chegou, meia hora mais tarde, mostrei e ele aprovou.
Bom, hoje correu melhor mas a polaca pediu um chá e eu reparei que não havia água engarrafada para aquecer no bule ao fogão, perguntei se podia ser de torneira, ela disse que sim. Pus o bule no fogão eléctrico e demorou quinze minutos a ferver. Foi quando reparei que ao lado do fogão havia uma chaleira pronta para aquecer água. Foi mais um erro por inexperiência e distracção, e também serem oito e meia da manhã e estar há quase doze horas a trabalhar, ajuda a desculpar. Mas no próximo pequeno-almoço não vou errar neste pormenor.
terça-feira, 20 de agosto de 2024
sábado, 17 de agosto de 2024
Queixa das almas jovens censuradas
quinta-feira, 15 de agosto de 2024
Fiufiu é um escovinha
Periodicamente no seu dia de descanso, Rogério costuma ir tomar café com um canário (como diria Jorge Fallorca) no fim do almoço familiar. Enquanto o canário Fiufiu conduz, Rogério comenta:
-- Gostei do frango assado do mercadona, é melhor que o churrasco do grelhador. O do grelhador é assado na brasa e fica muito torrado quase negro e seco; o do mercadona também é assado na hora mas num espeto e depois colocado em embalagens. Hoje, a minha irmã foi lá e trouxe, olha!, tostado como se fosse assado no forno, gostei.
Mas Fiufiu estava mais interessado em conversas existenciais, dizia ele:
-- Afinal, não vou comprar a mota, era um bom objectivo para ter na vida, mas iam ser sete anos a pagar o crédito, cem euros todos os meses e depois dois mil e tal euros só de juros... e eu tenho já uma moto.
-- E não era só isso, o acordo com a tua mãe incluía deixar de fumar, ias privar-te de um prazer...
-- Ó, até que não era mau e deixar de beber também, limitar-me à meia caneca, que até dá quatro copos, tenho de deixar-me disso, ainda esta semana no escritório, menu completo por sete euros mas depois vi um doce no mostrador, nem sei que era, nem sei ao que sabia, era gelado, nem sei quanto custava, mas comi dois, tinha vinte euros na carteira, não quis saber, soube-me pela vida.
-- Iá.
-- Mas não é isso o que eu te ia contar, é daqueles casos em que me lembrei de ti Rogério e do teu caso com o Manco e os vinte euros que ele não te pagou. quando eu lhe falei disso, o Manco respondeu: Já que tenho a fama fico com o proveito. E eu pergunto-te como conseguiste lidar tão bem com isso, porque olha lá no escritório um tipo veio falar-me que a companhia de electricidade lhe havia reduzido unilateralmente a potência contratada de energia e que ele nem sequer reclamou com eles porque tem duas facturas em atraso e está com medo de lhe cortarem a luz. Eu devia ter feito como todos, ouvir o caso, dar uma, duas palmadinhas nas costas, um afago no ombro, pôr um sorriso a iludir esperança e dizer: Vá lá, tu vais conseguir o dinheiro para pagar a luz... Mas não, eu disse-lhe: Dá cá as facturas, vou ver o que posso fazer. E assim, eu trouxe as facturas, fui ao multibanco e paguei-lhe os oitenta euros, no dia seguinte entreguei-lhas pagas e combinamos ele pagar esta sexta e nada, fui comido, quis ajudar e fui comido, é certo que ele não me pediu nada, como conseguiste tu com o Manco ficar tão calmo?
-- Bem, no meu caso com o Manco, foram só vinte euros, não fiquei pobre, foi menos um disco que eu comprei, e ele deixou-me em casa uns discos dele, na maioria merda mas um fixe do Nelson Ned, e ainda umas cápsulas de café e eu nada tinha pedido, e depois não tenho que ver o Manco todos os dias, não tenho de levar com ele e as merdas dele, por isso, olha, foi ela por ela.
-- Tou a ver, o problema é que o gajo é o meu chefe, e está-se bem, é um gajo fixe e tudo, não há problemas no trabalho com ele, só que isto, entrou no escritório e nem uma palavra, nada de quando vai pagar.
-- Ah... emprestaste dinheiro ao teu chefe que até ganha mais do que tu.
-- Eu devia era vender a dívida a um ressacado da Pasteleira, e depois ele ia-lhe bater à porta de casa, mas era muito estrondo...
Aqui Rogério começa a ficar cauteloso com o que diz, Fiufiu tem conhecimentos do submundo, aliás Fiufiu é uma espécie de broeiro que quer ser rico mas não estudou para isso, tem apenas o sétimo ano, na ânsia de ser rico mata-se a trabalhar, mas depois zanga-se que o Estado lhe cobra quase a totalidade das horas extraordinárias. Fiufiu é um iludido do capitalismo, ele quer subir porque vê os outros subir e não consegue ver que não sobe porque não tem capacidade pessoal de subir, é vê-lo como se comporta na fila para pagar o café, abre tantos os braços que Rogério fica com medo que alguém leve uma cotovelada, fala tão sem filtro e tão alto que parece um bandido. Por isso, Rogério diz apenas:
-- Não te metas nisso.
-- Não, mas é o que ele merecia, eu até já tenho o dinheiro, a minha mãe para me calar deu-me o dinheiro.
No final do café e de volta a casa, Rogério grafitou no seu caderno: Fiufiu é um escovinha.
terça-feira, 13 de agosto de 2024
Ria e o mundo rirá consigo, chore e chorará sozinho
segunda-feira, 12 de agosto de 2024
Eris, Goddess of Discord
Parece que Zeus estava a preparar um banquete de casamento para Peleu e Tétis e não queria convidar Eris por causa da sua reputação como causadora de problemas. Isto zangou Eris e ela produziu uma maçã de puro ouro e nela gravou a frase Para A Mais Bonita. No dia da festa largou a maçã na mesa do banquete e partiu dali solitária e alegremente para ir comer um cachorro quente.
Agora, três das deusas convidadas (na realidade. eram cinco deusas mas os Gregos ainda não conheciam a Lei dos 5): Atena, Hera e Afrodite, cada uma delas pretendeu logo ali que a maçã dourada era para ela só, já que ela era a mais bonita. Começaram a lutar e a arrancar cabelos, deixaram o banquete de pernas para o ar.
Finalmente. Zeus acalmou as coisas e declarou a necessidade de seleccionar um árbitro e todas concordaram. Zeus enviou-as a um pastor em Tróia, cujo nome era Páris porque a sua mãe tinha ganas e havia casado com um francês. Mas cada uma das cobra-deusas tentou ganhar na secretaria viajando mais cedo para oferecer um suborno a Páris.
Atenas ofereceu-lhe Victórias heróicas na guerra, Hera ofereceu-lhe Dinheiro e fortuna, Afrodite ofereceu-lhe A mulher mais bonita na Terra. Páris sendo um saudável rapaz de Tróia imediatamente aceitou a oferta de Afrodite. Afrodite ficou com a maçã e ele ficou feito num parafuso.
E tal como Afrodite prometeu, Páris conseguiu namoriscar com Helena que na altura vivia com o marido Menelau Rei de Esparta. De qualquer modo, toda a gente sabe que a Guerra de Tróia aconteceu porque os de Esparta pediram a rainha Helena de volta.
Principia Discordia, page 00017
Eris. goddess of discord
óleo sobre papel tamanho A2
2024 ZMB
sexta-feira, 9 de agosto de 2024
Robert Anton Wilson -- Secrets of Power
domingo, 4 de agosto de 2024
Requiem para Gisberta
«Requiem para Gisberta»
https://archive.org/details/requiem-para-gisberta
Nota do músico ZMB:
Eu não pedi autorização ao poeta Alberto Pimenta nem a ninguém para utilizar as palavras do poema.
Limitei-me a comprar o livro e a gostar do que li e a desejar fazer algo também pela memória da Gisberta.
sábado, 3 de agosto de 2024
Havia uma música até que dizia
sexta-feira, 2 de agosto de 2024
quinta-feira, 1 de agosto de 2024
Semelhante a um sol que aparece no mundo
No átrio da estação de Lyon, no cais des Chiffres, com destino a Sens, os pobres, os mendigos, os Apolis, os Estrangeiros, os Sem-Abrigo, os Vagabundos eram espancados à bastonada, eram arrastados por terra pelas axilas, eram levados para dentro de furgões por homens armados com bastões pretos e fardados de azul-eléctrico. Onde estão os contos onde os malditos penetravam nos palácios dizendo simplesmente aos guardas: «Sou um estrangeiro»? Estrangeiro era então a palavra mais bela e abria as portas. A hospitalidade era um dever, nem sequer uma virtude. O estrangeiro sentava-se no melhor lugar junto ao rei, à sua direita, semelhante a um sol que aparece no mundo, comia e bebia até se fartar. Depois, virava-se para o rei e perguntava:
-- Sire, quereis saber porque tenho o queixo rapado e um olho a menos?
E o rei prosternava-se diante dele e dizia:
-- Dizei-me! Dizei-me, meu amigo! Quais foram as vossas aventuras?
Pascal Quignard em «Os desarçonados»
tradução de Diogo Paiva
Edição Edições Cutelo