segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

The Assunção o'Cristas o'Coelho as seen by Glenn Branca



O mais engraçado é que a troika já reconheceu que errou
nas políticas que aplicou em Portugal durante o império 2011-2015
Mas nenhum dos ex-imperadores nacionais que governavam
e que agora ressabiados dizem «vc!? vc que perdeu as eleições!? vc!?»
ou dizem «é um homem de grande carácter, de elevação moral»,
estes, que disseram «portugueses, temos de empobrecer, há perspectivas além-mar, emigrem»,
estes...
a estes, que quiseram e só não foram mais além porque não os deixaram ir ainda mais além da troika,
a estes ainda não os ouví admitir que
ERRARAM.
Continuam no exílio e ainda não conseguiram perceber que estão defuntos
a cheirar de podre, os podres sempre se sabem um dia

ou como diria o Imprensa Falsa:
http://www.imprensafalsa.com/ja-comecaram-demitir-os-responsaveis-do-governo-anterior-os-do-actual-governo-demitem-tomar-posse-proximo/

domingo, 26 de fevereiro de 2017

Concept video for Coil



CONCEPT VIDEO FOR COIL
 THE CIRCULATING LIBRARY-ELVES-COIL-THE-MANIFESTO-COIL-SONAR-AURAL-BACKDROP...

ALL WORK REMAINS THE PROPERTY OF COIL\SLEAZY\BALANCE...

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Competência, um caso bicudo

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Era um home tão competente
que inaugurava sempre o marcador
ela prometia o segundo round que lhe daria o empate
mas ficavam a discutir o aluguer da lua e o presente nunca chegava
um dia alugou a língua
com o proveito escreveu anúncio pedindo
«madame sem dentes para durar até aos cento e vinte dando presente
ofereço três castelos uma língua e quatro continentes com muita terra para cavar batatas
comida pralá de quêbê e a lua como condomínio de luxo privado para amigos ocasionais»
ela concorreu ao emprego e doou os dentes ele teve direito ao empate diário de lei
montaram um negócio de tuktuks com serviço de gelados gourmet em sistema de franchise
venderam a ideia a um cientista expatriado em Killarney
tiveram uma quinta de porcos para o fumeiro e as batatas alimentaram a prole
felizes para sempre
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Claudio Mur

domingo, 19 de fevereiro de 2017

Não mostra a cara nem diz o nome, mas pinta o Porto de Hazul


fotos que tirei ao trabalho de Hazul em 2013 numa rua 
em Miragaia no Porto, em Portugal
nas traseiras do agora Museu das Descobertas da Douro Azul,
esta exposição de nome '^Florescer' foi apagada e já não existe:




































sábado, 18 de fevereiro de 2017

Oud Blues



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O dia amanheceu frio. O vidro da janela está embaciado por dentro. Verifico que o scanner está inutilizado porque o seu vidro, onde assenta a folha a digitalizar, está igualmente embaciado por dentro. Terei de procurar uma chave-estrela, abrir a caixa e tentar limpar o gelo. Com um pouco de sorte, conseguirei não ser obrigado a comprar um scanner novo. A verdade é que o dinheiro não abunda. O quarto é húmido, virado a norte, o seu imi extra será talvez nulo, a luz é diminuta, mas permite pintar até às cinco da tarde, abro a janela quando acordo, faço a higiene, tomo o pequeno-almoço, leio informação e emails no computador e começo a pintar logo a partir das onze e meia, páro para fumar, o senhorio preocupa-se com a minha saúde, diz para eu colocar um calço no alçapão que dá para o telhado, assim estabelece-se uma pequena circulação de ar «e vc não morre intoxicado», reparo que as mortalhas se colam umas às outras devido à humidade, as capas dos meus discos de vinil também sofrem mesmo que protegidas por uma capa de plástico, estão a ficar onduladas com o frio e a humidade que entra pela janela, bateram à porta ontem quando estava no banho, era o correio com uma encomenda, deixou o aviso, tenho por isso de ir levantar os discos ao posto de correios, é o que me disponho a fazer agora, acabei de aquecer no microondas as batatas cozidas com pescada e ovo que sobrou da janta de ontem, estava excelente, é um sinónimo de liberdade poder dispensar que me cozinhem o almoço, poder fazê-lo eu mesmo sem recorrer à caridade social, pois não tenho mais de me pôr na fila dos desvalidos para almoçar de graça, permite trabalhar de manhã como fiz hoje, faço-o há três semanas, o quadro está quase terminado, falta secar, o quarto é frio, não apanha sol directo, vai demorar mais de um mês a secar, depois poderei entregá-lo ao Marco, agora saio de casa, caminho e chego ao posto de correios, sou atendido e dizem-me que tenho de esperar, o aviso diz que a encomenda estará disponível para ser levantada às duas horas, são agora uma e meia da tarde, não vale a pena voltar a casa, entro no café ao virar da rua, sento-me, depositam-me o café na mesa e cumprimentam-me, sou já quase «cliente habitual», nas minhas costas um casal na casa dos trinta fala com calor, em alta-voz, acho que nem dão pelo exagero do volume, não está ninguém por perto a não ser eu, mesmo que o quisesse não poderia deixar de ouvir, ela fala do marido que está turistando e passa seis meses de férias no ultramar apaixonado por um miúdo que podia ser seu filho, o amigo ouve com mágoa, custa-lhe ouvir o caso e não poder fazer nada, o marido deixa a mulher sozinha em casa enquanto viaja pelo ultramar, ela sem dinheiro porque perdeu o cartão multibanco da conta dele, onde lhe caem as rendas de duas casas herdadas do pai e também o rsi que recebem em conjunto, ela diz ao amigo que faz serviço em casa da sogra e ela pouco lhe dá além da refeição take-away para o jantar e ainda lhe manda umas bocas de estúpida, ela diz ao amigo que quer morrer e o amigo que gosta dela sente-se impotente perante o caso, apetece-lhe denunciar o caso, a ss tem de saber que este cidadão português, com um nome suficiente longo e cheio de sobrenomes e apelidos para ser descendente dalgum imperador, com duas casas já herdadas, e com mais duas a caminho quando a velha fechar os olhos e deixar de pagar o condomínio de luxo onde o imperador vive de aparência com a mulher mais nova que ele, a ss tem de saber que este cidadão português não está em portugal «de facto» a viver estando a receber rsi sem sequer procurar emprego, portanto, o amigo diz-lhe que ela tem de denunciar a miséria que está a passar, ele, o imperador gay não pode andar a colocar no face os dentes de cavalo do «maisquetudo» e passar impune, enquanto «te impede de teres os teus amigos e saires e te divertires e o mais engraçado é que ele age como se tivesse razão, como se fosse normal trocar a mulher por um menino e ainda impôr condições à mulher traída, só porque é herdeiro de pastel e tu uma pobre que caiu na sua teia!» Eu , perturbado, ouço tudo isto e olho para o relógio na parede, são agora duas da tarde e penso no que ouço enquanto me levanto para pagar e voltar aos correios, não evito olhar para o casal de amigos e reparar nela e dizer «Que mulher linda! Quem é o homem que a troca por uns dentes de cavalo, eu hei-de ajudar-vos, não só pelo que ouvi mas também pelos ciganos, pensar que acusam os ciganos de roubar o estado à custa do rendimento mínimo, pensar que um emigrante ou um sem-abrigo não tem direito ao rsi porque não tem morada registada há mais de um ano em portugal e depois um palhaço imperador engana assim o estado e a mulher... eu hei-de ajudar-vos a ficarem juntos os dois, pelo que vos ouvi dizer vocês merecem ajudar-se um ao outro, eu hei-de fazer um graffiti dizendo em letras garrafais «O imperador é rabo!» e quero ver qual é o amigo ou amiga dele que ao investigar o porquê de todo o escândalo não ficará do vosso lado, nada temais, eu hei-de ajudar-vos, agora vou receber Ahmed Abdul-Malik aos correios e voltar para casa para me deliciar com o oud e escrever esta história. A Ilga não pode dar razão ao imperador, o politicamente correcto não se pode aplicar aqui.
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Claudio Mur

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Desmaios de jazz



https://www.discogs.com/Albert-Ayler-My-Name-Is-Albert-Ayler/release/8489730

Há uns valentes vinte anos espantei-me a ouvir na tv
o Herman José publicitando qualquer produto,
espantei-me porque ele disse qualquer coisa como:
«vá lá, cinco contos... não custa nada comprar, é uma noite de copos a menos»

Vinte anos depois, eu digo que este disco, se comprado,
vale bem um serão passado em casa a ouví-lo.

Leiam os comentários a esta música no youtube:
expressam sentimento e
foi lá que soube que a pintura que adorna o vídeo é do Matisse.

sábado, 11 de fevereiro de 2017

Supus poder responder erguendo o boné

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No fim da refeição, Floritchica dise:
-- Trasnila, queriamos ouvir uma história cigana. Sabes alguma?
Trasnila, jovial, e perfeitamente à vontade, respondeu:
-- Uma história «cigana»? Sei uma, a minha, mas suponho que ela é acima de tudo humana.
-- Pois bem, conta-no-la.
-- Aí vai, honrados boiardos. Não posso esperar que isto vos divirta. Os ciganos são em geral bons para isso. Não é o meu caso. Nem sou eu o culpado.
O princípio da minha história faz-me lembrar um famoso provérbio romeno: Quando um cigano se torna imperador, começa por mandar prender o pai.
Pobre imperador! Devia ter um pai como o meu. Se não enforquei o meu, vontade não me faltou.
O meu pai é um boiardo romeno dos lados de Calafate. Ainda vive, gordo e com saúde. Não sou eu o único filho. Éramos um montão de ciganos, rapazes e raparigas, que lhe devíamos a vida, sem para isso termos que lhe guardar um eterno conhecimento, visto que, a exemplo de todos os senhores, não fez outra coisa que emprenhar as mais belas moças das tribus de que era o déspota, o que os cães fazem com muito mais equidade.
Sabia-lhe a crónica (que minha mãe me contara numa noite de chuva). Tinha herdado toda a fortuna do pai, ainda muito novo, quando iniciava os estudos; nunca se tinha querido casar, porque «as mulheres podem enganar os maridos»; tinha regressado de junto das Frautzouchras farto das mulheres perfumadas e gostava imenso, das raparigas ciganas.
'Quando os meus olhos se abriram para a ignomínia da nossa condição de escravo, estava ele na plena força da vida. Um pouco mais tarde -- tinha então dezasseis anos -- vi indicarem uma jovem cigana e gritarem-nos:
-- Aquele que tocar em Profiritza será morto! Ela nunca mais trabalhará, de hoje nem diante!
Já se sabia o que aquilo significava. Supus poder responder erguendo o boné:
-- Senhor! Que os dias felizes da tua vida sejam sem fim como o número de mulheres belas que poderás ter, mas deixa-me Profiritza! Ela é minha e eu quero-lhe muito!
Disse aquilo dum jacto e imediatamente toda a tribu se pôs a gritar, como é seu hábito nos enterros. As mulheres arrancaram os cabelos. Os homens cuspiam com indignação:
-- Ptrou! Cigano burro! Vai ser morto!
Meu pai, o senhor, desceu as escadas e perguntou-me:
-- Já tocaste em Profiritza?
-- Não!
-- Felizmente para ti!!
Depois dirigiu-se ao intendente:
-- Apliquem-lhe cinquenta chicotadas!
Profiritza lançou-se-lhe aos pés e implorou, com toda a ternura dos seus quinze anos, para me perdoar, mas o coração daquele pai não se enternecia e recebi a minha conta. Não senti nada, porque os meus olhos puderam ao menos fixar durante todo o tempo, os de Profiritza, que flamejavam.
Não devia tornar a vê-la tão cedo: ela foi entregue aos cuidados duma cigana velha que preparava o corpo daquelas que haviam de cair na cama do senhor, e eu, com outros escravos, homens e mulheres, parti no dia seguinte de manhã escoltados por um esbirro armado de chicote. Eramos oferecidos ao superior dum mosteiro muto afastado de Calafate, onde chegamos após uma semana de marcha. Tinha separado o marido da mulher, a mãe do filho, o noivo da noiva, e ficado frio ante os nossos gritos e as nossa lágrimas como se fica perante os balidos das crias separadas dos pais.
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Panaït Istrati
em "O cigano Trasnila"
páginas 101-103
no Volume 'Antologia do conto moderno'
edição Atlântida Editora, Coimbra 1964

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

E viveram felizes para sempre


Ontem, dia 7, na oficina em Serralves com o grupo de utentes do CH S.João

Fotografias da
retroprojecção no canto da sala de formação de sombras recortadas.
Material utilizado:
Acetatos coloridos, cartolina, cola, fita-cola de papel, tesoura e x-acto

Dei como título a este trabalho a primera frase que o formador expressou
quando me viu a preparar este trabalho.


(Esta última foto foi tirada pelo formador)

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

No tears for the creatures of the night



Lyrics to No Tears
No tears for the creatures of the night
No tears
No tears for the creatures of the night
No tears

My eyes are dry
Goodbye
My eyes are dry
Goodbye

I feel so hollow I just don't understand
Nothing's turned out like I-- like I planned
My head's exploding
My mouth is dry
I can't help it if I've forgotten how to-- cry

No tears for the creatures of the night
No tears
Uh oh, oh no, uh oh, oh no, uh oh, oh no
No tears for the creatures of the night
Uh oh, oh no, uh oh, no tears
Uh oh, oh no, uh oh, oh no, uh oh

My eyes are dry
Goodbye
My eyes are dry
Goodbye
Goodbye
Goodbye
Goodbye
Goodbye
Goodbye
Goodbye
My eyes are dry

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Lust in the eye Love in the heart


'Lust in the eye Love in the heart'
óleo sobre tela
40cm por 30cm
2000 2017
ZMB


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Assim conheci Maria por intermédio de um dos meus eus, uma das minhas consciências num baile do enterro com os Mão Morta tocando Aum e nós nos beijando. Movido de uma espiritualidade correcta, saí de casa bem vestido e de barba feita. Joana dissera-me que teria de mudar e entrar num novo rumo. No entanto, meti uma vez mais o pé na poça e sujei os meus novos sapatos de camurça tendo chegado ao café exausto após procurar os meios para os limpar.

O Blitz é um longo rectângulo espelhado. Ao fundo, pequenas mesas decoradas a veludo vermelho; de um lado, um balcão de cabedal preto com lindos cinzeiros de mármore; um café escuro com muito fumo, muita cerveja e onde só falta o piano enferrujado.

A minha consciência senta-se, pede um café e um copo de água, olha em frente e vê, por entre as garrafas, os isqueiros nas prateleiras e a máquina de café, a sua imagem recortada e pulsante de dor. Existem superfícies longitudinais que escondem por meio da multiplicação os seus olhos e/ou deformam certas formas que logo se transformam em outras imagens tão naturais como respirar. Não fosse o problema dos sapatos e tudo estaria bem. A minha consciência sente-se exausta porque hoje é domingo à noite e saiu há dois dias de um centro de reeducação alimentar ou prisão perto de nós, tendo estado algum tempo com a família somente por 'amigos' ser algo do qual foi perdendo o conhecimento, até que veio aqui ao Blitz ter com Maria, talvez por razões de re-inserção social. Para mim tudo bem mas devagar. Para Joana, apenas uma vontade imensa de fazer bem.
São dez horas. É altura de ver uma série americana na tv, de se ler o jornal e procurar emprego, de procurar lugares bons e baratos para viver, de procurar as últimas novidades de toda uma diversidade de mundos normais.

Mas o que é um mundo normal?, pergunta a minha consciência na altura em sente uma violenta pancada nas costas e repara que eu, a pessoa mais normal do mundo, a engasgou.

Então meu já a curtir?
Resposta simples e humilde: Estava a ler o jornal.
We fall onto oblivion...
We fall onto oblivion...
Desculpa lá o atraso. Estás cá há muito tempo?
Há cerca de vinte minutos. Ela ainda não chegou.
Peço uma cerveja e pergunto quem é ela. Ela quem?
Pois, ainda não a conheceste pessoalmente. Repito: é filha do professor O.
Não te lembras? Quando lá foste naquela quinta-feira...
Certo. Quando houve aquela espécie de recolher obrigatório...
Hum... então se ela é filha do professor e eu sou pai de mim próprio...
Hum... que interessante, que perversão mais... que história invisível...
Exactamente.
Pergunto-me o que esta palavra dita em quatro tons de secura, rispidez, segurança e concordância quererá dizer. Penso: É disso que preciso - uma vida de pintor alimentada a ganza e um emprego como engenheiro de software.
A cor do cabelo interessa?
Claro que não.
A minha consciência pensa: vou precisar de comprar uma televisão, com o dinheiro que amealhei o ano passado não deverei ter problemas.
São por vezes engraçadas as coincidências astrológicas, pensa o misógino
R. que entra despercebido pois ninguém o vê, e ainda bem, indo sentar-se debaixo da prateleira da televisão. Após ser iniciado, digo que tive duas elas com o nome da minha avó, eram ambas do signo virgem tendo nascido no mesmo dia de Setembro. Conheci a segunda numa noite de maio que anos mais tarde se veio a revelar a data de anos de uma terceira ela. Talvez os astros estejam ligados. Eu misógino e/ou misantropo digo que não amei mais depois de maio. Pensem talvez moon uterus day 1.
Eis que ela entra. Traz longos cabelos castanhos encaracolados, calças de ganza agul clara e em maio traz uma camisola preta. Nos espelhos ela parece simplesmente fenomenal. Stunning. Pede com modos delicados desculpa pelo atraso e sorrindo fala de problemas domésticos com o seu gato.
Não sabia que tinhas um gato...
A minha consciência pergunta-lhe o que quer beber, aproveita para me apresentar e eu ofuscado por tanta luz retribuo o cumprimento.
Olá tudo bem.
Ela pede um fino.
O Blitz é um cenário apenas. Um foco de luz amarela ilumina o balcão, o chão é de taco encerado e os espelhos abismais.
Eu Claudio sou, vendedor de produtos domésticos, há quem diga que sou um drifter.
Eu sou Carlos, um ressacado da vida.
Eu sou Joana, professora primária.
We are all out, therefore we all are.
Todos se riem da verdade e quem são eles? Todos os nossos ídolos e admiradores.
O misantropo eu levanta-se e vai ao balcão pedir um café. Quando retorna lembra-se que o tempo é algo difícil de explicar, vai-se vivendo e às vezes damos conta de que o tempo passa, às vezes ele voa e ficamos sem saber onde estamos e quem sabe se fomos felizes e de que modo?
Sendo o Blitz um cenário destinado a dar vida social ao eu ressacado para que ele se possa sentir mais seguro na afirmação das suas posições e, por outro lado, permitir que o eu normal conheça a mulher de todos os meus sonhos uma primeira vez, é difícil pensar no que dirão durante toda esta situação. Talvez observando o mecanismo visceral da máquina de ar condicionado, do tabaco, do café, das pastilhas elásticas, do calor humano, das frases que são adivinhadas, tudo... até as que são mal compreendidas.

Que importa o amor numa vida?, pergunto-me eu misantropo. Aos quarenta a ternura dos quarenta e as obsessões religiosas, aos cinquenta a andropausa e a menopausa, aos sessenta a segunda infância, que importa toda uma vida? O humanismo é poesia, as crianças continuarão a chorar por falta de brinquedos e as bombas continuarão a cair. Qual será a nossa função?, seguir o destino?, e qual é o destino?, para que servirá criar se depois tudo cristaliza na nossa falta de vontade, na falta de compreensão das pessoas com as quais é necessário falar, em todo um mundo dito de normal para depois eventualmente ser tudo gravado e esquecido numa placa na via pública.

Do you like the Swans?
Do you like blue swans or Michael Gira's swans?
Como tudo é relativo.
Tenho de me ir embora. Volto dentro de dias. Estou a pensar arranjar quarto aqui. Se souberem de alguma coisa digam. Tchau.
Um beijo. Um beijo para todos os solitários.
Vou apanhar o foguetão.
O que tu não sabes meu querido Carlos é que, no momento seguinte à tua partida, o Armenia será destruído por um meteoro. Mesmo assim, ainda poderás acrescentar algo à história que o professor O. te entregou para publicação.
Claudio e Joana olham um para outro. Um momento depois beijam-se.
Justificação: Atracção fatal! Salvar-me-ás? Claro.
Porquê? Por sentirem o momento. Para quê? Talvez o conhecimento, o que nos distingue de uma máquina é termos um coração ou tomates ou uma cona.
Qual é o valor de um quadro oferecido...
Qual é exactamente a nossa relação com a pessoa a quem se oferece um quadro...
Será que essa relação é especial ao ponto de merecer um quadro especialmente concebido...
Porquê conceber um quadro a alguém especial...
Terá um quadro o valor especial adequado...
… Eu cá só ofereço quadros a elas. Diz Claudio.
… Eu cá não ofereço quadros a ninguém. Diz Carlos. Não sei fazê-los.
… Eu cá não me importo. Diz Joana.
A minha consciência decide ir finalmente para casa sozinha para ouvir rádio.
Nós somos...

e estamos ali na sombra projectada pelos estores como um quadro .

Pedimos dois shots e amamo-nos ao som de Mão Morta em Maio.


Assinado: Claudio Mur, suicida.

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Retirado do livro Kcoillapso, capítulo Z





(fotografia de época)