segunda-feira, 31 de maio de 2021
sexta-feira, 28 de maio de 2021
-- Quero dizer, há homens que amam as mulheres deles.
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Descobri que a única altura possível para estudar era antes de dormir. Como estava sempre demasiado cansado para fazer e comer o pequeno-almoço, comprava uma embalagem de seis cervejas, punha na cadeira ao lado da cama, abria uma lata, dava uma boa golada e depois abria a folha do esquema. Quando chegava à terceira lata de cerveja, já tinha que largar a folha. Um gajo só consegue marrar um tanto de cada vez. Depois, bebia o resto da cerveja, sentado na cama, a olhar para as paredes. A última lata punha-me a dormir. E quando acordava, o tempo era à justa para ir à retrete, tomar banho, comer e voltar para o trabalho.
E um gajo não se adaptava; ia simplesmente ficando cada vez mais cansado. Comprava sempre as minhas cervejas ao voltar para casa, e houve um dia que estava mesmo de rastos. Subi a escada (não havia elevador) e meti a chave à porta. A porta abriu-se. Alguém tinha mudado a mobília toda do sítio e posto um tapete novo no chão. Não, a mobília também era nova.
Estava uma mulher no sofá. Tinha bom aspecto. Nova. Boas pernas. Loira.
-- Viva -- disse eu --, aceita uma cerveja?
-- Olá! -- disse ela. -- Está bem, pode ser.
-- Gosto da maneira como a sala está arranjada -- disse-lhe eu.
-- Fui eu que arranjei.
-- Mas porquê?
-- Apeteceu-me -- disse ela.
Bebemos cada um a sua cerveja.
-- Tu és porreira -- disse eu. Pousei a minha lata de cerveja e dei-lhe um beijo. Pus a mão num dos joelhos dela. Era um bom joelho.
Depois bebi mais uma golada de cerveja.
-- Sim -- disse eu --, gosto mesmo do aspecto com que a sala ficou. Isto vai-me mesmo levantar o moral.
-- Que bom. O meu marido também gosta muito.
-- Mas por que é que o teu marido... O quê? O teu marido? Olha lá, qual é que é o número deste apartamento?
-- 309.
-- 309? Que grande merda! Estou no andar errado! Eu vivo no 409. A minha chave abriu a tua porta.
-- Senta-te, fofinho -- disse ela.
-- Não, não...
Peguei no resto das cervejas.
-- Qual é a pressa? -- perguntou ela.
-- Há homens que são doidos -- disse eu, enquanto me encaminhava para a porta.
-- Estás a falar de quê?
-- Quero dizer, há homens que amam as mulheres deles.
Ela riu-se.
-- Não te esqueças onde é que eu vivo.
Fechei a porta e subi mais um andar. Depois abri a minha porta. Não estava ninguém lá dentro. A mobília era velha e gasta, o tapete quase já nem tinha cor. Latas de cerveja vazias pelo chão. Estava no sítio certo.
Despi-me, fui para a cama sozinho e abri outra cerveja.
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páginas 124 - 126
«Correios»
Charles Bukowski
tradução de Marisa Mourinha
edição Canguru
terça-feira, 25 de maio de 2021
segunda-feira, 24 de maio de 2021
Jogo do sério, inconsequente e tudo, pim
sábado, 22 de maio de 2021
«A Female Gipsy Youth Found My Lost Pen»
quinta-feira, 20 de maio de 2021
Dr. A. R. Spider na Alameda das Fontaínhas
segunda-feira, 17 de maio de 2021
Artur Rockzane -- O Forró dos Astronautas
domingo, 16 de maio de 2021
«O campiom da moedinha»
sábado, 15 de maio de 2021
Patrulha do Espaço, nº 4
sexta-feira, 14 de maio de 2021
Música do dia
ouvi a versão em estúdio desta música na Rádio Paralelo,
online at https://indymedia.pt/
para que não pensem cenas paranóicas: eu também tenho «manuel» no meu nome
mas nós todos, que gostamos da pinga, devemos reflectir nas palavras desta música,
senão leiamos:
«tua mulher já está passada
quer foder e tu... nada
qualquer dia dá à sola
já não tens força na mola
Manel, larga o vinho»
quarta-feira, 12 de maio de 2021
O cínico poderia dizer: mas o hobo diz :
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Ao passar na damrak vejo num armazém um anúncio pedindo empregados, fico interessado e entro, dirijo-me ao balcão, apresento-me e dizem-me para voltar daí a um mês. Ok, agradeço e volto à rua sabendo que talvez não voltarei lá e, olhando a sujidade nas minhas calças, penso no que a minha mãe uma vez me disse, ela uma voz anónima do povo em ditadura: nunca descures tua imagem. Às vezes dizia-me isso e eu ficava a pensar: mas quem é pobre pode andar asseado, arranjado?, ao que ela respondia: podes ser pobre mas fazer por não parecer. Ao que parece a higiene pagará todas as promessas mas… entre mim e a higiene há toda uma luta de classes e eu tenho algumas dúvidas de que queira ser manager ou até formar um partido lóbi. Sou assim: às vezes on às vezes off eu prefiro o estado de ov, um germe eternamente gerado e sempre pronto a renascer para um novo mundo numa nova ponte, quantas vezes já não mudei de vida?, tentar pelo menos. O cínico poderia dizer «às vezes ainda me ofereceram camisolas» mas o hobo diz «nunca tive estabilidade nem ilusões, apenas sonhos, tenho de me adaptar ao mundo mas o mundo quer que eu deixe de ser eu», para ser ele — o mundo que rende juros ao gestor de activos; para ser com ela — a munda, a mãe levando o pequeno-almoço à cama ou a mulher «faca e alguidar» com jantar romântico no dia de anos.
No fundo, minha mãe leva-me a deduzir a simulação futura, a intoxicação com um copo de água e talvez, agora é capaz de ser já um pouco tarde… um louco é-o muitas vezes por repressão ou impossibilidade de descarga sexual, farto de não ter alguma toura como parceira sexual, simula o amplexo na sua imaginação e usa as suas duas mãos em si próprio, sente-se senhor anarca monarca absoluto pondo e dispondo de si próprio, dizendo até que não precisa de gadja, que se basta a si mesmo. Porque não acredito em desequilíbrios químicos genéticos e tão só em espíritos que incubam no futuro em crianças da lua, às vezes o louco ou o joker joga contra si próprio, chega mesmo a escrever coisas reaccionárias, frases como: já não acredito na anarquia, na guerrilha criativa, eu nem sequer encontro uma gaja interessante, quanto mais mudar o mundo, a guerrilha significa spam, noise informativo, gosto de informação estruturada, organizada, não gosto do noise quântico da web.
Dito isto, nego tudo o que escrevi desde o último dois pontos. Há sempre alguém a processar a informação que me chega. A verdade é que ainda não cheguei ao nível necessário de conhecimento para eu próprio poder organizar o meu dia-a-dia, o excesso de informação que ainda não consigo processar convenientemente, sou um hobo ficando sem dinheiro a cada pacote de bolachas que compro, a cada grama de thc que compro e, claro, eu… dizem para eu voltar daqui a um mês porque vêem o modo como estou vestido, vêem que estou de passagem, um turista momentâneo suado e com as calças manchadas, alguém que não estará aqui por muito mais tempo.
Dou por mim a pensar tudo isto quando entro no prix d’ami para tomar café, compro uma grama e começo a enrolar. Um holandês corpulento vem falar comigo, se calhar já me tinha topado ao longo destes dias, fumamos o meu e um dele, fala-me que tenho de me registar oficialmente, podes ganhar mil e duzentos euros no mínimo mas tens de estar registado com residência. Digo-lhe que estou numa pousada e que não a aceitam como morada e depois é cara. Fala-me que no croydon hotel se arranja diárias de vinte e poucos euros. Where is that?, ele responde que passando a damrak fica na primeira rua depois do grasshopper. Fico interessado e pensativo e ele pergunta se eu o percebi, há aqui uma espécie de tensão sexual flutuando na névoa verde mas caminho noutra direcção, tenho de sair e atravessar para o lado de lá da damrak. Procuro o croydon hotel, viro na segunda rua à direita e encontro. We’re full! Ok regresso, nada feito, nada de quartos, sufoco, resigno-me à frustração e amargurado penso no meu futuro na rua ou na miséria da caridade alheia, resisto, digo-me que nada me impede de sonhar, imaginar mesmo uma cabana diferente: um espaço onde dormir, comer, defecar e mostrar o meu trabalho e vender claro, obter um rendimento mínimo de subsistência que pague a conta do supermercado, a tinta e a tela, a ganza e a conta da net e claro!, o aluguer da cabana.
Vivendo hoje o momento como se hoje venha a acontecer, penso aproveitar a voz de ka-spel, será uma epifania sonora adequada para descrever o momento que não se escreveu, até porque a revolução do microcosmos não é nunca televisionada: nobody waits forever, not even me for you on a desolate onway on a desperate lock in a forgotten universe ik waited so long for me to plant my flag half mask half way between two empty spaces lost but I will raise my white stick I’ll wave I always think I heard a voice your voice my love yes till a walkway towards the light you see I had no choice our life must go on well that’s all we always say isn’t it? our liiefffe muussst goooo... on.
segunda-feira, 10 de maio de 2021
Devo ter sido picado pela tarântula eheh
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Está um calor abafado. Sinto o calor quando paro na passadeira. Um senhor com uma mala com rodas olha-me com o que poderá ser apenas um olhar de curiosidade, mas transformo-me a seus olhos num suspeito através do modo peculiar com que encaro as interpretações das personagens e sinto que ele me veste com linho de renegados gone to croatan, renegado por renegado sinto-me orgulhoso por pregar partidas à tia sáli, é assim que eu sou, devo ter sido picado pela tarântula eheh.
Entro num hotel info centre e tento arranjar um quarto para ficar a noite. Como a empregada está muito ocupada, pergunto a que horas fecha e o outro empregado diz às dez, pelo que saio e me dirijo à primeira coffee shop que encontro. Peço um café e pergunto se têm erva. Dirijo-me ao balcão da erva, vejo o menu, a preguiça lê muitas palavras que a ansiedade não elucida e pergunto apenas se não tem super skunk. Compro duas gramas por doze euros e venho para o balcão beber o café. Ao pagar flirto com a empregada toura, quero dizer loura, quero dizer morena boazona e pergunto-lhe onde posso arranjar quarto, digo-lhe com uma nota na mão e ela fala-me de um barco-hotel e até me dá indicações.
Fumo o primeiro charro em território livre holandês. Como todo o junkie é ciclista, corro em passo de vitória supersónica para o barco passando por mercados, esculpindo letterings de corporações no átrio de entrada, fotografando oficialmente associados e futuras presidentes do fmi, venerando taxas de juros e greves de taxistas em cidades mausoléu de lenin ou outro deus harmonioso que o valha, olhando sem comentar as horas em que o gato voltará a sair pela janela para descer os degraus e registar o próximo fix como um ivan de sombras gigantescas mugindo o seu império mas sobressaindo a sua sombra no fundo em graus de cinzento. O barco é grandioso mas dispendioso e não tenho capital. No entanto vejo um casal de mãos dadas. Param de caminhar, olham um para o outro e beijam-se.
Um homem do mar produzindo ilusão com a sua aparência de endinheirado e… reparo que este charro… a princípio, noto uma certa restrição de certas partes do meu cérebro em aceitar a moca, ondas de arrepio na superfície frontal, uma breve e aguda dor nos ossos temporais e é como se desdissesse os policiais científicos da mente e os neurónios ao se dissolverem não se reduzissem a cinzas mas abrissem sinapses e novas ligações para um futuro hospedeiro, há muito tempo andava o meu cérebro escondido sem poder imaginar. O calor abafado, o sabor a café, o sistema respiratório sendo progressivamente desentupido com recurso a lenços de pano, sinto-me vivo e funcional, iié!
Com grande moca imaginativa vou de gás ao hotel info centre às dez menos cinco. A empregada atende-me, verifica no sistema e arranja-me um quarto por cinquenta e cinco euros a noite. Tenho que fazer o checkout às onze da manhã e o pequeno almoço entre as oito e as dez da manhã. Chego ao quarto às dez e meia. Todo suado, dispo-me e vou tomar um banho gelado, deito-me por cima do lençol todo molhado, fumo outro charro e rio-me num flash, grito qualquer coisa sobre um pensamento que de súbito se torna realidade, tenho alta resposta mental, tenho o prazer fabulástico aliás de imaginar incendiar a santa maria sendo, como se, um santo daime sem consumir huasca até.
No entanto, digo que a moca é tão grande que até estou a ver estrelas. Ela acha banal e expressa um sorrisinho como se dizendo: ele está com uma moca, mas eu insisto: olha não acreditas?, olha elas ali, estou mesmo a ver estrelas, olha práli. E ela olha, ela que não acredita e pensa ser esta uma conversa com sorrisinhos marotos entre as partes. Olha e vê mesmos estrelas, vê as estrelas e ao mesmo tempo um pequeno clique, um jeito na espinha. Eu disse-te que nunca tinha visto estas estrelas na minha vida, ela acaba por concordar. Ela? Mas quem é esta ela? Sorrimos ambos e dizemos: na maria se formula o desejo e na joana a vontade se concretiza, é a moca… são estrelas de oito pontas num céu azul cobalto, ouvimos o franque zappa.
Penso que talvez me esteja a passar, ando meio desligado mas rio-me e sei que é só a ganza a bater, uma sensação que volta a acordar, a erva faz milagres e durante estas linhas, rodeado pela estrela maria e esta estrela joana que partilha comigo o seu charro, leio nas mortalhas de papel de arroz com goma de açúcar: grown in the earth, nourished by the water, powered by the wind, burned by the fire.
Se eu puder rir em vez de chorar, porque não procurar o riso?, nem que às vezes seja algo absurdo: imagina-me numa fotografia de jornal com a resenha do segundo prémio de pesca desportiva, eu, a cana de pesca e um atum de dois metros… no entanto, anoto mentalmente o desejo de este «nós» ser às vezes apenas o desejo de haver Alguma que pense como nós, ou seja eu e «tu» que sejas esta «alguma». Anoto ainda que quando se está acompanhado é possível dizer: olha ali tazaver aquela estrela? Mas olha… tu és mais bonita que ela!, e no entanto também é possível registar que quando se está só recorre-se frequentemente ao artificio, buscando a estrela e ela descendo até nós e… no dia seguinte o sol acorda e levanta-me do chão, eu canto-lhe a minha mais sofrível imitação do xano: seu guarda, pescar é para mim quase um acto de meditação, eu não sou delinquente, sou um homem carente, dormi na praça pensando nela, o peixe mordeu a linha. E depois quem pode dizer nunca ter acordado e visto estrelas!? Toca a circular eheheh, o peixe mordeu a linha e eu, que no sonho levitava em pose de mestre zen, caí ao chão e você, seu guarda, pôs-me a circular.
E ela sai para ir viver o seu modo de se fazer gente. Não me lembrarei mais do teu rosto mas considero-te bela o suficiente para que fiques anónima neste século vinte e três «e meio». E eu, de qualquer modo por precaução, vou ao saco e busco a dose de comprimidos enquanto a zero-cinza se carameliza. Responsabilidade num benha tardi!!
domingo, 9 de maio de 2021
«We feel like babies in the brine»
sábado, 8 de maio de 2021
kkkkk
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sexta-feira, 7 de maio de 2021
A representação subjectiva da sua essência numa imagem
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Continuo a segurar a minha cabeça e observo pequenos nadas à frente dos meus olhos, pequenos nadas como se os meus olhos chorassem e a realidade aparecesse refractada pelas bolhas de lágrimas, olho, fecho os olhos e tenho medo do escuro, abro os olhos e sonho, sonho de olhos abertos pequenos nadas que não dão uma história coerente.
Vou à casa de banho no primeiro andar. Sento-me e fico durante uma eternidade de quinze minutos, esperando que algo aconteça, olhando pelo janelo da casa de banho, olhando por esta, uma nova janela do tamanho da minha cabeça emoldurada, olhando o mundo que parece em paz fora da janela.
O vidro, no entanto, é branco e baço. A parede continua a ser branca. Não está forrada a papel. A claridade reflecte-se na parede que é uma massa não uniforme, pois se fixar um pequeno ponto deste espaço branco ou ligeiramente matizado pela presença sombra de um outro todo branco, ele logo se transforma numa infinita quantidade de ínfimos pontos de várias cores surgindo à medida da percepção, da tomada de consciência que adquiro a cada instante, sempre diferente, como se um pontilhista estivesse a criar um quadro só para mim ou se fosse eu que tivesse a criar um quadro pontilhista ao longo destes momentos brancos com uma mão invisível chamada Eu.
Valerie e as amigas acordam num quarto ao lado e começam a conversar, a rir-se. Analiso-me perante elas, digo que é bom ouvir todas estas vozes que parecem de crianças, confundindo-se no som de pequenos risos ao longo de um espaço onde dormem.
Estou numa casa de banho, fechado, sentado com as mãos a tentarem esconder a claridade angelical e silenciosa, fechando os olhos, abrindo os olhos, segurando a cabeça que pretende cair para um dos lados por causa do peso dos sonhos e do pescoço que parece estar podre.
As raparigas foram sair a noite passada, acordaram agora, tem dezoito, dezanove anos, falam de um modo que há muito tempo já não ouvia, aquele de acordar acompanhado, sonho uma banda desenhada compostas por memórias bonitas carregadas de inocência, alegria, aspiração alcançada, tudo aquilo que já não tenho.
Quão longe parece o dia em que, durante uma festa, uma rapariga entrou no meu quarto e olhou para o quadro que eu pintara e gritou quase histérica: foste tu que fizeste isto?, quão longínquo parece o dia em que fiz um quadro num ou dois dias, a pedido de uma amiga, e quando lho mostrei, ela gritou quase histérica: é para mim?
A histeria revela verdades, às vezes difíceis mas sempre válidas, hoje esse histerismo desapareceu do meu caminho, já não sou capaz de provocar qualquer emoção nas pessoas, gradualmente vou ficando inválido, vou morrendo dia após noite, noite após dia, ao longo de um tempo em que tento aprender e conhecer cada vez mais pintores e escolas de arte porque penso que se quiser ser aceite terei de perceber a história e dominar a técnica, esquecendo a minha memória, o meu inconsciente, tornando-me cada vez mais racional, racional até ao infinito da invalidez, da morte, do inferno minimal que vi naquela janela da sala, agora vejo nestas paredes pontilhistas angelicais, e vejo neste postigo angelical.
Sim, esta janela é do tamanho da minha cabeça, daria uma bela fotografia se alguém, estando do lado de fora da casa, a fotografasse.
Vou à sala grande onde Joe já não dorme. Depois, vou a cozinha onde, no meio da confusão de pratos sujos, copos, tostas de pão, manteiga, facas e garfos, toalha, lava-louça, lavo um copo e bebo um pouco de àgua. Volto à sala dos três sofas e sento-me no sofá a olhar para a lareira.
Aqui todas as casas tem lareira, lembro-me dos tempos em que não havia nem televisão nem rádio e passávamos o tempo a esquecermo-nos nas cores surgindo da fogueira enquanto se contavam histórias antigas: eles estão a queimar a recordação que guardam do seu nascimento ou a adorar a aparição que surge da fogueira... não sei, a mãe, ou a mulher que toma conta do filho que nasce. Ao mesmo tempo que a memória esquece, ela observa calmamente com as mãos nos bolsos a imagem e as palavras enigmáticas gravadas na parede, ela recusa ver a realidade daquilo que ele nunca lhe disse porque nunca o soube, pressentiu ou teve medo, ela esconde-se da realidade de ele estar a tentar transferí-la da realidade para a representação subjectiva da sua essência numa imagem.
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John Moore em
'Mushrooms or a procura do espaço e a identidade'
quarta-feira, 5 de maio de 2021
segunda-feira, 3 de maio de 2021
dia da mãe em desenho:
antes de apanhar o metro para o almoço
e depois de almoçar com três mães em casa de famíliaem fundo, vê-se um dos meus cunhados em pé e a meia silhueta do meu pai sentado,
no desenho, apenas falta para completar a foto:
o meu segundo cunhado, o meu sobrinho e a minha sobrinha mais crescida