A Teodora sentia-se muito bem instalada no salão restaurnte do hotel de luxo. A Elli, de quem aquela fazia as vezes de elefante, escrevia cartas, onde contava que estava a ter uma vida regalada.
As criadas do restaurante deitavam a sopa nos pratos.
Isselstein e Hopfner surgiram aos pulos e a conversa animou; tenho tão pouca capacidade na arte de me saber expressar como um miúdo!
Ão-ão! Quem fez este barulho?
O nosso Hopfner, que deixava o olhar deslizar em torno da silhueta de Teodora.
Esta estremeceu, mas, na sua qualidade de elefante, manteve-se provisoriamente em silêncio. Os elefantes têm a arte de estabelecer relações. Para si próprios não têm em mira nenhum objectivo. Teodora não passava de uma espécie de apêndice.
Voltemos então a Hopfner, que gostava de dizer: «Deus me livre!» E também aqui me assemelho mais uma vez a um miúdo, porque não domino a arte de imitar.
Os desejos de Isselstein centravam-se cada vez mais na Elli, a qual não estava a notar nada do interesse de Hopfner pelo elefante.
Panorâmica da discreta natureza alpina e um novo «ão-ão» de Hopfner.
A correspondência era cada vez mais animada.
«Porque é que não diz nada?», implorou Hopfner. O belo seio dela agitou-se. A incapacidade de fazer prosa elegante apresenta as suas desculpas.
Ele prosseguiu: «Será que acha impensável que a tomem a sério?»
«Tenho de me habituar primeiro a essa ideia.»
«Não suporto mais continuar a ficar privado de um sim dito por esses lábios tão queridos.»
Ela fixou nele o olhar; ele compreendeu a resposta.
Isselstein e Elli encontraram-se também um ao outro; os quatro regressaram ao local de onde haviam vindo.
O papá não queria nada com o Isselstein, estava a contar com o Hopfner, que lhe fez saber da sua predilecção pelos elefantes.
Wally, a mãe, achou propícia a ocasião para fazer sobressair o seu sobressalto. Elli defendeu com sucesso a causa do seu Isselstein. Teodora espantou-os a todos. Verificar que um fenómeno acessório pode ter quem o deseje era para todos uma novidade absoluta.
Os pais deram-se por satisfeitos. A Elli ficou abraçada ao seu eleito, que continuava, como dantes, a chamar-se Isselstein.
Hopfner não fez mais ouvir o seu «ão-ão» nem, também, o seu «Deus me livre!» Fez uma coisa muito mais significativa.
Declarou à Teodora: «Tu agora és minha, mas eu nem consigo ainda acreditar que isso é verdade.»
«Eu tão-pouco! Somos os dois muito parecidos nisso de não-conseguir-acreditar-ainda-que-tudo-isto-seja-possível.»
O Cupido aconselhou-os a beijarem-se.
Hopfner levou ainda algum tempo a fazer tentativas até que conseguiu executar a sua obra e ambos confundiram os seus hálitos em ternas audácias até que o menino à boca de cena fez correr o pano.
Robert Walser
página 116 - 117
em A Rosa
edição Relógio d'Água
tradução de Leopoldina Almeida
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