domingo, 15 de outubro de 2023

Um poema de Roger Wolfe

 AS AUTORIDADES LITERÁRIAS AVISAM:

SER FELIZ PREJUDICA SERIAMENTE A SAÚDE

Cheguei a acreditar que a felicidade

não é assunto para os seres humanos

Félix Grande


Alguns -- por incrível que pareça nestes tempos --

ainda se iniciam nos copos

por influência dos poetas simbolistas.

Outros -- de modo igualmente incrível --

acabam a chutar heroína

porque múmias como William Burroughs

bradavam aos quatro ventos que o faziam.

Por motivos semelhantes

negaste sempre a felicidade,

que como se sabe

é um assunto muito mal visto

entre as mentes pensantes deste curral [de moinas, padrecos rabis e moinantes].

Até que a felicidade te caíu em cima 

como um prato de sopa

que alguém te entornasse no colo.

Que diabos era isto?

Não estava programado.

Era um novo contratempo;

uma autêntica vergonha.

Como, em menino, mijar a cama

ou fazê-lo nas cuecas.

Tremendo embaraço.

Quem poderia livrar-te desta?

Mas a felicidade insistiu em agitar-se dentro de ti;

percorria-te de alto a baixo

como um fluxo de seiva electrizante.

E ocorreram-te ideias deveras bizarras:

abandonar tudo,

[bombardear Gaza e os dois milhões que as mentes pensantes chamam terroristas]

desatar a correr saltando gritos de alegria,

pintar a manta [e deitar cimento para dentro dos poços de água na Cisjordânia]

e mergulhar de cabeça na vida.

[e alegrar-me de por cada judeu morto morrerem cem palestinianos.]


Ficaste sem pinga de sangue.


Os filhos-da-puta [dos apoiantes da causa palestiniana] tinham esvaziado a piscina.


Roger Wolfe em «Fazer o trabalho sujo», edição Língua Morta

com [] de ZMB





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