sábado, 31 de julho de 2021

Terra, a terra


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Foi bom, aquilo de Aristarco ou Galileu nos porem a girar à volta do Sol, em vez de vice-versa, como parecia e continua a parecer; foi bom quanto a isso de tirar o Homem do centro (confio que os leitores já estejam bastante desenganados a respeito das patriotices do humanismo), porque esse tal Homem, sabe Deus quem ele é, gabava-se de ser o rei da Criação e de que as outras coisas tinha sido feitas para estarem ao seu serviço e para serem objecto das suas teorias.

Contudo, passados uns quantos séculos, em que foi parar aquela revolução? Em que é que deu isso de a Terra ser convertida num planeta? A terra era (estão lembrados?) simplesmente terra, terra que o lavrador cavava e em que batia o pé nos bailes das festas, terra de criar árvores e ervas, de fazer potes e jarras, e de ir enterrando os mortos, chegada a sua hora.

Calma (reprendemo-nos apenas com algum tremor de vez em quando), dava-nos o pão e as águas doces e os incontáveis bens da vida. Mãe, lhe chamavam os povos e a cantavam os poetas, cá em baixo deitada a receber do pai Céu, lá do alto, chuva de amor que lhe dava crias. O que ganhámos nós pondo-a a rodar pelo próprio céu, dando voltas como uma louca?

«Ganhámos», dir-me-ão talvez, «que agora, graças à Ciência, vemo-la de fora, como uma bola azulina, como uma lua grande.» E quem é que a vê? «Ora, quem diabo há-de ser? O Homem!» Ou seja, aqueles tolos olhando boquiabertos o televisor ou o céu do observatório, comprovando com os seus olhos que sim senhor, é verdade: que não é só redonda, mas que circula pelo Espaço como outro astro qualquer.

Grande negócio, amigo! Tirámo-la do centro e lancámo-la por aí fora, mas nós, os seus filhos, não nos descentrámos coisa nenhuma. Pelo contrário: com a nossa Ciência colocámo-nos no centro de todas as galáxias, viajamos por entre elas através de filmes e tornámo-nos tão grandes que não só a destruímos quanto podemos, como até inventámos o terror de um dia o próprio Homem a fazer estourar como uma bomba, tão admiráveis e terríveis somos! Para semelhante viagem, bem podia Galileu ter deixado o telescópio na adega.

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Agustin García Calvo


traduzido por Júlio Henriques

em «Flauta de Luz, Boletim de Topogradia nº8»


quarta-feira, 28 de julho de 2021

Questionário

Na Rádio Paralelo ( https://radio.indymedia.pt/), de vez em quando aparece um jingle engraçado ouvindo-se uma conversa de rua entre um pregador e angariador evangélico e um rapaz abordado e que veste tshirts com bandas de heavy metal. O pregador fala e tenta convertê-lo, o rapaz em voz arrastada diz que não gosta dele (de deus), e o pregador diz que se não acredita nele ele também não pode fazer mal e pergunta se pode rezar por ele, e por causa da tshirt preta acaba a perguntar se ele gosta do demónio (lembrou-se), e o rapaz diz após perceber o porquê de ter sido abordado pelo pastor: «são bandas de música meu!»


Questionário do pastor, 

imaginado e traduzido há anos por Claudio Mur de um qualquer site ou fórum esquecido na net:

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És um bruxo?

És um adorador do diabo?

Em que acreditas acerca de Deus?

Tens uma Bíblia?

Disseste magia? Acreditas no oculto?

Mas eu pensei que disseras que não eras um adorador do demónio?

Como te tornaste um tu?

Ouvi falar de bruxas em orgias e tal.

Tu também?

Vi nas notícias que vocês usam uma estrela dentro de um círculo como vosso emblema. Isso não é um símbolo satânico?

Opões-te ao Cristianismo?

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Claudio Mur

domingo, 25 de julho de 2021

Júlio Iglesias Cantor das Fontaínhas

 



«Júlio Iglesias Cantor das Fontaínhas»

aguarela A3 sobre papel Canson de 160grms

2021

ZMB

sábado, 24 de julho de 2021

The Ghost & The Fairy - ZMB - Opuntia Books -


«The ghost and the fairy»
edição em papel A5, numerada e limitada a 30 exemplares
2021
Opuntia Books

Podem adquirir directamente pela editora aqui:

ou pedir-me a mim através do email zmb_mur@yahoo.com



quinta-feira, 22 de julho de 2021

quarta-feira, 14 de julho de 2021

Quem dá esquece Quem apanha se lembra

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Dizia ela no outro dia no caminho de volta à estação do metro:

-- Sabe o que foi que ele me disse? Disse bem assim: «ela pensa que eu não sei por onde ela anda e com quem vai!»

-- Mas ele ao dizer isso, estava só a fazer blufe, a meter medo, ele não sabe verdadeiramente, e se o soubesse não reagiria assim, com tanta calma e desprezo...

-- Se afasta de mim agora, desce e segue em frente...

Eu escuto, olho para o lado contrário, vejo um gajo aproximando-se da entrada do metro, e desço a escadaria da estação, no final olho para trás, ela vem a descer, espero por ela e pergunto:

-- Atão, o gajo viu-nos?

-- Não, era amigo do Acá, pedi-lhe um cigarro, ele não deu, disse que ainda ia tomar café antes de ir embora.

-- É melhor eu ir embora, o metro é só daqui a oito minutos.

-- Sempre o mesmo, me deixando sozinha à espera.

-- É no teu interesse.

 

Hoje, de manhã, ela saía novamente do metro, mas noutra estação, eu vi que ela saía e caminhei à frente sem olhar, ela vi-me e deu-me uma palmada no braço, disse:

-- Segue em frente, o insistente vem ali atrás...

Eu não olhei e segui, subi a escada rolante para a rua, andei mais devagar, ela chamou--me, eu olhei, ela vinha e não me pareceu ver o insistente, ela disse para eu esperar por ela:

-- Você parece o pilotão, sabe que no Brasil, há um dia em que há uma parada com carro militar e soldado marchando, há sempre um que vai à frente, é o pilotão, é você que não espera por mim.

-- Ele já não vem ali?

-- Não.

-- Não vinhas a falar com ele no metro?

-- Não, ele vinha com o filho.

-- Olha, e como correu, naquele dia?

-- O amigo do Acá chegou não sei como primeiro que eu, e mal eu cheguei à esplanada o Acá disse bem alto à frente de toda a gente, me humilhou, estavam os amigos dele, as amigas, ele bebendo cerveja, o insistente bebendo café, eu fui para casa com as palavras dele zoando dentro da minha cabeça: «desapareça da minha vida tire as suas coisas de minha casa»

-- O gajo até deve ter pegado um táxi, estes chibos não olham a despesas.

-- Pois, eu quero que você escreva e passe para uma pen, o relatório do que eu escrevi, sobre o que ele me faz, é abuso, é violência doméstica psicológica.

-- Está bem.

-- Que é para eu depois ir à polícia. Agora, eu queria uma coisa, sabe onde eu posso pôr uma película no meu celular?

-- Sim, sei, há ali um sítio barato.

-- Mas agora as coisas estão mais calmas, eu lhe escrevi uma carta dizendo tudo o que ele me tem feito passar e disse que ia na polícia, e ele leu, saiu de trombas, foi comprar pão, foi ao talho, grelhou três bifes para mim.

-- Sim, tentou comprar a paz, e ele sabe que tem de ter cuidado, não foste tu que disseste que ele foi chamado na Segurança Social, ela lá o deve ter avisado, até já foste à polícia e aos bombeiros e que te disseram eles?, escrever tudo.

-- Sim, você passa o que está no caderno para a pen, imprime, e depois eu venho cá e levo à polícia para lá eles lerem.

-- Sim. Já reparaste no poder da palavra?, na importância de saber ler e escrever e expressar um sentimento?, a palavra, a caneta é uma arma, não faz sangue mas leva as pessoas a agir, dá esperança, vê que tu escreveste uma carta a ele, disseste o que sentias, disseste a tua verdade, soubeste escrevê-lo e ele leu, e quis fazer logo a paz, essa era uma carta que até eu queria ler...

-- Ele rasgou. Agora me explica: porque é quando eu venho você está alegre e quando eu vou você fica de tromba?

Eu sorrio, sei que faço assim porque me preocupo com os seus casos e fico pensativo pensando em maneiras de lhe resolver os problemas, digo-lhe:

-- Eu gosto de você, mas você não acredita, sugiro que o seu pensamento do dia seja hoje este: «pensar no que disse o Ru.»

-- Ah tábem...

-- Sim, pensa na palavra, no poder de expressar um pensamento. Às vezes, um escritor vende centenas de livros, ganha milhonas de dinheiro e ninguém o lê...

-- Ora não lê...

-- Não lê não, a gente compra e coloca na prateleira, eu ainda tenho livros que há anos não li, e tu foste cirúrgica, é esse o papel da palavra, tu escreveste a tua verdade e atingiste o alvo, mudaste a tua situação perante ele, ganhaste a batalha.

-- Cessar fogo.

Despedimo-nos depois de passarmos na loja de telemóveis, na rua que dá acesso à estação do metro e eu venho para casa, aqueço no microondas o almoço, tomo café, vejo as novidades do mundo nos jornais online, descanso meia-hora e começo a transcrever o caderno de Raíssa, segue em baixo.

 

«Relatório

 

03 de Outubro

 

O Acá inventou de ficar de tromba para mim, hoje, sem eu fazer nada, eu já estou cansada disto tudo, ele sai, não dá satisfação e depois quer que eu fique satisfeita

 

 

04 de Outubro

 

Hoje ele só falou comigo à noite, veio com um pretexto falando de uma camisa que eu dei a ele

 

 

05 de Outubro

 

Mais uma discussão só porque eu lhe perguntei: se ele ia à rua que passasse na Tatiana para comprar o pão, ele começou a me gritar e falou que já estava farto, eu só queria que Deus tivesse misericórdia de mim e me arranjasse um trabalho para eu ir embora daqui, até lá vou aguentando as humilhações, de uma maneira ou de outra eu tenho de dar um jeito na minha vida. Às vezes, não me apetece beber mas sou obrigada para esquecer tudo o que estou passando. Depois de me separar a minha vida virou um inferno, só tristeza e humilhação, quando eu penso que está tudo bem volta tudo novamente: as discussões. Eu aqui não tenho paz, só tristeza. Depois, voltar a Portugal foi o meu maior erro, não foi por falta de aviso mas eu ainda tenho fé de que vou ser muito feliz mesmo com espinho ou pedra no meu caminho, sei que Deus não me abandonou, eu vou vencer, e eu sou uma guerreira porque eu acredito em Deus

o meu pai tarda mas não falha, por isso não desisto de lutar para ser feliz, Deus só dá a cruz a quem a pode carregar, se hoje estou passando por tudo isto ele sabe o que está fazendo, se eu venci dois cancros é porque ele tem um propósito para a minha vida, só basta esperar, a minha vitória mais cedo ou mais vai chegar, posso perder tudo na minha vida mas não perco a fé no meu pai que é Deus, vou viver um dia de cada vez, esperar pelo meu pai, meu visto que ele nunca me abandonou, mas também aprendi uma coisa: algumas pessoas gostam de pisar nos que não têm nada, gostam de humilhar e depois dizem que são humildes. E vêm com pedidos de desculpa e como se nada tivesse acontecido, e quem sai magoado finge que esqueceu mas, no fundo, é mesmo uma lição de vida para quem passa por tanta humilhação, mas nós não esquecemos, só fingimos que esquecemos, é como o ditado: quem dá esquece quem apanha se lembra. Quando eu conheci o Acá, tudo era flores, agora se tornou espinho, eu às vezes tento sorrir para não chorar na frente dele e das outras pessoas, mas um dia tenho fé que vou voltar para a minha terra e para a minha família e esquecer tudo que passei aqui em Portugal e um dia depois se voltar a Portugal só se for para passeio, porque eu amo Portugal de coração, como é duro viver no país quando não tem ninguém por você, não trabalho, é muito triste ir atrás de um emprego e só levar um não, eu sinto tanta falta da minha família e me vejo presa no país sem poder voltar para perto de quem me ama de verdade

 

 

07 de Outubro

 

O Acá tomou um porre e falou que eu era um monstro e que não me queria mais e que eu desaparecesse da sua vida, ele me magoou muito, eu preferiria que ele me desse um tapa na cara, estou muito triste com ele, este é o meu sofrimento aqui em Portugal

 

 

11 de Outubro

 

Eu não presto, ele também falou que eu era ordinária, manda-me sempre ir embora, diz que sou uma mentirosa, eu acho que para m bom entendedor meia palavra basta, mas a minha palavra é o silêncio

 

 

21 de Maio

 

mais uma briga, eu não posso estar com ninguém, não posso ter amigos, eu antes de conhecer ele não tinha de tomar remédio e agora tomo

na Sexta-feira saí para tomar uma cervejinha e só cheguei às três da manhã porque já não aguento mais este cativeiro, ele diz que eu tenho amante, que me drogo, ele fica fazendo jogo psicológico, diz que eu não faço nada, também falou que os amigos dele mandaram ele jogar as minhas coisas no lixo, ele falou que se eu fosse um homem ele quebraria a minha cara. Eu não posso deixar ele comandar a minha vida assim, ele quer mandar nas roupas que eu visto e quando eu recebia o rendimento mínimo eu pagava gás, comprava comida para pôr dentro de casa e nós comermos

 

 

19 de Junho

 

mais uma briga entre eu e o Acá, já não aguento mais, sou tão infeliz, só gostaria que acabasse este sofrimento que estou passando, só queria que Deus me escutasse, mesmo com esta tempestade que eu estou passando, eu coloco Deus à frente de tudo, ele falou que os amigos dele mandaram jogar as minhas coisas no lixo

 

 

05 de Julho

 

Mãe, hoje mais uma briga, estou farta mãe, porque é a vida tão madrasta comigo?, eu não mereço, e porque tenho de pagar um preço tão alto, mãe?, eu queria que a minha vida acabasse porque eu já não aguento mais, mas nunca vou perder minha fé em Deus, quem me faz mal eu entrego, porque se Deus é por nós quem será contra nós, às vezes sou tão estúpida, homem que me humilha, que me tortura»



Diz-me ela hoje que ele afinal não rasgou a carta: «ele me perguntou se era uma carta de amor, o que ele rasgou foi outro papel, eu vi, ele pôs as duas folhas lado a lado e quer pôr moldura na parede, me deu hoje dinheiro para o autocarro e para a comida da minha filha Pandora.»

Que bom, a cobra Pandora não passará fome de ratos descongelados, a mãe com a carta elevada a quadro de arte ganhou igualmente janta e cigarros por alguns mais dias, pelo menos até à próxima briga.

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anónim@s do século XXIII


terça-feira, 13 de julho de 2021

São João Arrieiro

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A norte da ria, timidamente metida para o interior, achava-se uma pequena e isolada formação montanhosa a que os habitantes locais apelidavam de Montures. "Assim foi: Deus meteu o dedo salgado num pedaço de nenhures, remexeu, e ali fez arrebitar um espinho montuoso -- Montures". Com pedra a fazer lembrar granito, não o sendo, algo mais consentâneo com a geologia e clima da ria, e coberta de espessa vegetação. Despontando da lezíria sem arbítrio, a irregularidade, um cravo numa cara linda. Desde sempre cenário de histórias e lugar de refúgio para as gentes silvanas, salvatério fácil para quem o procurasse ou para ele fosse empurrado. Dizia-se, por exemplo, que os órfãos da região iam todos lá parar, estabelecendo comunidade -- hipótese meio descabeçada está visto, pois nem haveria espaço para tanto, nem as crianças fundam cidades quando reúnem. No que nos interessa, foi lá efectivamente que São João Arrieiro foi parar quando a vida se lhe desgovernou. São João que colhia a urina das suas cavalgaduras em potes, gesticulava um simulacro de benção -- não se atrevia a mais --, e dava-a depois a quem lha pedia, aos pobres, sofredores, doentes prestes a expirar, sedentos do espírito; aos mais e menos necessitados, por igual. Até que, num dia de Inverno, saiu com os animais à conta do ofício e nunca mais ninguém soube dele. E isso deixou as pessoas a pensarem, e o pensamento das pessoas não foi bom para a memória do santo

ele que nada dava e tudo vendia, cabotino que fez da vida fartança, usurou com a saúde alheia, fez como se o sangue de Cristo se pudesse confundir com mijo, trocou raíz de mandrágora por dentes de criança e humores ainda castos, falava a língua das bestas e com palavras mansas beijou muitas partes vergonhosas, quer humanas quer animais, além dos doze filtros que preparou e com os quais seduziu turmas inteiras de mulheres, aliou-se ao Esgana-Cães num surto infame, infame, infame ainda hoje, teve escolta conhecida de pássaros negros que mais pareciam as fúrias, ferozes e malignos, e com o compasso do pé coberto de cerdas atraiu répteis, insectos e pequenos animais domésticos, apinhados para seu exclusivo repasto, maquinou indolente com uma larga hoste de divindades, deitou mão à carranca demoníaca que lhe conferiu salvo-conduto entre os dois mundos, olhou de frente o vazio sideral, tingiu a ria de sangue e fê-la confluir com as torrentes do Estige e do Aqueronte, nessa mistura gerando monstros e quimeras nunca vistas, nem sequer do lado de lá. E quando interrogado acerca da própria identidade, repetidamente respondeu em dissonância com o nome que recebeu por graça do baptismo: "o meu nome é soldado, porque sou apenas um"

ora mateiro, ora fascista, São João recolheu pois ao serro selvagem, ao bosque habitado pelas estações. Ali chegado, tirou arneses e varais aos jumentos que o acompanhavam e deixou-os à sua sorte. Se o fossem procurar, dariam com ele deitado contra a parede dum cabeço, famélico e levantino. Com os joelhos encolhidos, igual ao boi merceano. Se não o encontrassem, diriam qe o desaparecido se fundira às árvores, suas feições tornadas indistintas pela amálgama.

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páginas 69 - 70


«56 / 25 - 31»

Esménio

edição Flop, 2018


sexta-feira, 9 de julho de 2021

Alberto Pimenta: Ilhíada, páginas 83-89
Edição: Edições do Saguão 2021

 

Um poema de Júlio Allen Vidal

 

Dor... horror y não era fantasia
‘1973’

Na noite de espectros
y de cancelas fechadas
de negras e reforçadas vigias
na noite sem dia de virgens desfloradas
sonâmbulo ou não eu não dormia
No meu jardim-cenário
travavam-se batalhas,
e os meus olhos alucinados
divisavam cobras nas floreiras
3 papoilas vermelhas de sangue
estrebuchavam humilhadas
em prantos de carpideiras.
Havia tochas
em vários pontos!
e o sangue escorria
do tronco das árvores
vários dementes, abortos ou monstros
sorviam-no sedentos, insaciáveis…
Uma obesa concubina
prostituia Portugal
e em Belém
o deus Marcelo
que o diabo lá tem
lança taxas
e fala também
das vantagens do mal
que era por bem.
O filme continuava
com dentes partidos
e outras torturas
portas que davam acesso
a cemitérios
em noites escuras.
Violetas negras
decoravam o fundo
do hediondo cenário
morcegos cinzentos e outros paisanos
tingiam de gritos
o meu sono contestatário
horror dos meus olhos flagelo dos meus ouvidos
Pesadelo mórbido
na criminosa noite de insónias
Alguém pendurado por uma corda
Ao contrário
Lentamente
Na sucessão de imagens apreendidas
Aos meus olhos écrans
Vestida de Arco-Íris
tu surgiste Sorrindo
Sim! eu sabia que virias
mas porque troçou Júlia
na noite de espectros
y de cancelas fechadas?

Praia das Maçãs
Bibió

quarta-feira, 7 de julho de 2021

domingo, 4 de julho de 2021