quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Uma vergonha esta câmara ao nada fazer de concreto
além de oferecer medalhas e apoiar a construção de hóteis

http://www.jn.pt/local/noticias/porto/porto/interior/julio-machado-vazdevolve-medalha-da-cidade-em-protesto-5402497.html

https://www.facebook.com/julio.vaz.777/posts/886869708124113

transcrevo na totalidade e subscrevo a publicação de Júlio Machado Vaz:

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Em Outubro a Paulo Vallada terá deixado de existir.
Neste momento as nossas meninas/mães vão sendo encaminhadas para outras instituições ou seguem os trajectos de vida já iniciados. Desejo-lhes toda a sorte do mundo, com uma tristeza não isenta de culpa. Racionalmente, digo-me que esgotei todas as portas a que podia bater, mas lá no fundo sobrevive a dúvida, “fiz tudo ao meu alcance?”. À equipa uma enorme gratidão pelo profissionalismo e entrega com que se tem dedicado ao trabalho, como se não vivesse uma preocupante contagem decrescente no que ao futuro diz respeito. O mesmo reconhecimento aos nossos voluntários, sem os quais este desenlace teria acontecido há muito tempo e cuja dedicação é demonstrada pelo último pedido das nossas meninas/mães antes de partirem – com eles se reunirem uma última vez.
Sabendo de antemão que pecarei por defeito, deixo outros agradecimentos: ao Juiz Armando Leandro, por ter aceitado presidir à Assembleia Geral da Associação, emprestando-lhe a credibilidade de toda uma vida ao serviço dos mais carenciados deste país; à Fundação Montepio, nas pessoas do seu Presidente, Engenheiro Tomás Correia e da Dra. Paula Guimarães, sem a sua ajuda não teríamos durado nove anos; ao senhor Ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Dr. Vieira da Silva, que não se limitou a acusar a recepção do meu relato das necessidades da Paulo Vallada – simples gesto de cortesia que durante dois anos o seu antecessor não teve… -, mas desencadeou mecanismos que, triste ironia!, se poderiam traduzir num auxílio precioso a curto prazo; ao Centro Distrital da Segurança Social do Porto, que colaborou nesse processo e foi de uma gentileza inexcedível para connosco; ao senhor Engenheiro Luiz Oliveira Dias que, com o seu exemplo, mobilizou a nosso favor a solidariedade do Mercado Abastecedor do Porto; ao Dr. Carlos Abrunhosa de Brito que, na qualidade de Presidente do Conselho Consultivo da Fundação da Juventude, tudo tentou pela sobrevivência da Paulo Vallada aos mais diversos níveis; ao senhor Provedor da Santa Casa da Misericórdia do Porto, Dr. António Tavares, que fez o mesmo, desde a primeira conversa que mantivemos sobre a necessidade de encontrar novas instalações para a Comunidade. E a tantos outros, a quem, obviamente, expressarei o meu reconhecimento pela palavra dita ou escrita.
Aos que muito prometeram e nada cumpriram deixo o que já lhes pertence - espelhos e consciências. Com a excepção da Câmara do Porto, à qual deixarei algo meu. De imediato um esclarecimento: refiro-me à Instituição porque, embora quase todos os contactos tenham sido mantidos com o Dr. Manuel Pizarro, o meu colega deixou bem claro que falava em nome do Executivo, o que, de resto, o Dr. Rui Moreira teve a gentileza de também sublinhar durante o processo. 
Há quase dois anos pedi auxílio para estabilizar a Paulo Vallada. A resposta foi afirmativa, com a legítima exigência de uma redução de custos do funcionamento. O que foi feito em três meses, com dois despedimentos e redução da restante massa salarial. A equipa, que nunca fora a justificada, passou a ser de tal modo “espremida” que, como já disse, o trabalho dos voluntários passou a ser indispensável ao funcionamento quotidiano. Informei o Dr. Manuel Pizarro da nova realidade, fornecendo os números, como era minha obrigação. E esperei. Nada aconteceu, de um momento para o outro os canais de comunicação deixaram de funcionar; silêncio absoluto.
Até ser contactado no sentido de ser agraciado pela Câmara em 2015. Honrado embora - tratava-se da “minha” Câmara e do “meu” Porto -, salientei que precisava mais do cumprimento de promessas feitas do que de honrarias, eu cumprira a minha parte do acordo e a Paulo Vallada continuava em risco. As promessas foram renovadas. E eu deixei passar o Verão, todos sabemos como Portugal funciona au ralenti em época estival. No Outono nada acontecera e as minhas perguntas voltavam a esbarrar no silêncio. 
Em Janeiro, foi-me pedido para fazer a apresentação de um livro nos Paços do Concelho, o que fiz com todo o gosto, atendendo a obra e autor. De resto, ao longo de todo este processo colaborei com o pelouro da Cultura sempre que para tal fui solicitado. (Colaborei e continuarei a colaborar!, o Porto está acima de qualquer amargura pessoal). Na referida sessão de Janeiro todas as promessas foram repetidas.
Foi no início do ano que ficámos a saber que até ao Verão teríamos de encontrar novas instalações. Eu e o Dr. Carlos Abrunhosa de Brito fomos bater à porta do Dr. António Tavares. E os três chegámos à conclusão que a melhor hipótese seria tentar uma abordagem inter-institucional do problema. Escrevi ao Dr. Manuel Pizarro, solicitando uma reunião a quatro, comigo pela Paulo Vallada, o Dr. Carlos Abrunhosa de Brito pela Fundação da Juventude e o Dr. António Tavares pela Santa Casa. Nenhuma resposta. Um mês depois repeti a diligência, salientando a urgência da situação. Silêncio mantido. 
Sejamos claros: surgiria de tal encontro uma solução? Nunca o saberemos. Mas é aceitável não existir sequer resposta ao pedido? Aqui é preciso evitar o fascínio pelo umbigo, seria fácil argumentar que, se eu servira para apresentar um livro no mês anterior, por que não tinha direito a uma resposta ao pedido de vinte ou trinta minutos de atenção? Tratar-se-ia de um erro, o registo certo não era o pessoal. A questão punha-se noutros termos – por que não merecia a sobrevivência de uma instituição portuense, há nove anos dedicada à premente problemática da maternidade adolescente, uma simples reunião? Não mereceu.
Vivo nesta cidade há sessenta e sete anos. Nasci em Anselmo Braamcamp, cresci em casa e nas “ilhas” que lhe eram vizinhas. Joguei ténis de mesa no Mocidade Invicta, frequentei a Escola Normal e o João de Deus, gastei as cadeiras do Majestic na adolescência, ensinei nas duas Escolas Médicas desta cidade. Aqui recebi o privilégio de filhos e netos, os quais, por sua vez, ainda cá estão, nos tempos que correm ter o clã inteiro à nossa volta vai-se tornando raro, no consultório cada vez mais gente me diz que fala com os seus através de Skype… Espero, assim, que os caprichos do Acaso me permitam acabar os meus dias no Porto. Cujas regras de conduta julgo conhecer razoavelmente. O Porto não avalia os seus filhos pelas honras acumuladas, embora nada tenha contra elas, pede-lhes, isso sim, a intransigente defesa da Honra, que, como Cidade, tantas vezes defendeu até ao limite.
Nunca abordei a questão neste espaço. A razão é simples, qualquer um de vocês poderia pensar que me dedicava a estratégia que por aí campeia – fazer pressão sobre pessoas ou Instituições através dos média. (Manda a verdade admitir que alguns só assim conseguiram ser ouvidos…). O risco já não existe, como disse, na Comunidade já se “lavam os cestos”. Quero acreditar que fiz tudo o que podia pelas nossas meninas/mães e seus cachopos e pela minha equipa. Preciso de acreditar, em minha casa também há espelhos. Mas se a Paulo Vallada fecha as portas no concreto, é minha obrigação defender-lhe a dignidade, de que sou um dos garantes, e que não será devolvida com as chaves. E por isso, amanhã mesmo, a minha Medalha será devolvida à Câmara. Dir-me-ão que se trata de um mero gesto simbólico. É verdade, mas por trás dos símbolos vivem ideias, maneiras de ver o mundo e de nele estar. E, quem sabe?, talvez a próxima IPSS que solicitar vinte ou trinta minutos de atenção tenha mais sorte.
Não voltarei ao tema em público, a menos que alguém insinue falsidades da minha parte. Está tudo dito e feito; é tempo de luto.

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