segunda-feira, 13 de junho de 2016

... e ali estava Fulano de tal, vivo, numa folha de papel.

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Todo o bairro conhecia o meu irmão como sendo capaz de desenhar «tudo» -- uma bicicleta, uma árvore, um boneco de desenho animado como Lil'Abner --, embora ultimamente o seu interesse fossem os rostos verdadeiros. Juntavam-se miúdos à sua volta, a observá-lo, sempre que, depois da escola, se instalava em qualquer lado com o seu grande bloco de desenho com lombada em espiral e a sua lapiseira e começava a esboçar as pessoas que se encontravam perto. Inevitavelmente, os mirones desatavam a gritar: «Desenha-o, desenha-a, desenha-me», e Sandy fazia-lhes a vontade, quanto mais não fosse para que parassem de lhe gritar aos ouvidos. Entretanto, a sua mão não parava de trabalhar, ele olhava para cima, para baixo, para cima, para baixo... e ali estava Fulano de tal, vivo, numa folha de papel. Qual é o truque, como é que consegues, perguntavam-lhe todos, como se desenhar -- como se a magia pura -- pudesse ter contribuído de algum modo para o feito. A resposta de Sandy a toda aquela importunação era um encolher de ombros ou um sorriso: o truque para fazer aquilo residia no facto de ele ser o rapaz calmo, sério e simples que era. Chamar a atenção, onde quer que fosse, por fazer os retratos que lhe pediam, aparentemente não produzia qualquer efeito no elemento impessoal existente no cerne da sua força, a modéstia inata que era a sua firmeza e que, mais tarde, ele fintou à sua própria custa.
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, página 25

'A conspiração contra a América'
Philip Roth
Edição Biblioteca Sábado

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No meu caso,
não sei se foi modéstia ou desinteresse mas
aos onze, doze anos desenhei em duas folhas de papel cavalinho
as equipas de futebol do fcporto e slbenfica
a partir da caderneta de cromos das equipas de futebol da primeira divisão.
Estes cromos eram caricaturas, penso eu, desenhadas pelo Mário Zambujal.
E eu copiei a lápis de cor alguns jogadores, 
outros, recordo-me, coloquei-os em posições corporais diferentes.
Não sei hoje o quão bem feito foi este meu trabalho porque ofereci os dois trabalhos a colegas da escola, mas posso situar aqui o início de uma habilidade que só, mais tarde,
quando entrei na faculdade para estudar engenharia, se começou a verdadeiramente afirmar.
Contribuiu para isso ter amigos que se interessavam por arte
e que, à maneira deles, também puxaram por mim e me tornaram um autodidacta que se foi afastando
cada vez mais da engenharia e se tornando pintor.



Aguarelas sobre desenho em linha preta impressa a laser
2016
ZMB

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