sábado, 31 de dezembro de 2022
quinta-feira, 29 de dezembro de 2022
Alguns desenhos para a Revista Estúpida nº9
segunda-feira, 26 de dezembro de 2022
A Musical Anthology Of The Orient -- Afghanistan
quinta-feira, 22 de dezembro de 2022
Djamília ou a Padeira da Guerra
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E Djamília gostava também de cantar; estava sempre a cantarolar qualquer coisa, sem se acanhar com a presença dos mais velhos. Tudo isto, sem dúvida, em nada correspondia à representação que se fazia na aldeia da conduta de uma nora em família.
Mas as sogras tranquilizavam-se pensando que, com o tempo, Djamília acabaria por tomar assento. Pois não é verdade que, enquanto jovens, todas são assim? Para mim, em todo o Universo, não havia nada de melhor que Djamília.
Sentíamo-nos muito alegres quando estávamos juntos. Podíamos então rir sem motivo e correr um atrás do outro, pelo pátio.
Djamília era verdadeiramente bela. Esbelta, bem feita, com cabelos lisos e esticados de longas tranças espessas, ela sabia pôr habilmente o seu lenço branco de seda, enviesando-o um pouco sobre a fronte, o que lhe ficava muito bem e valorizava a pele bronzeada e fresca do seu rosto. Quando Djamília ria, os seus olhos amendoados, de um negro azulado, iluminavam-se de juvenil ardor, e, quando ela se punha a cantarolar as cantigas maliciosas da aldeia, então nos seus belos olhos aparecia um clarão não virginal.
Muitas vezes tinham reparado como os djiguites, em particular os soldados que regressavam da frente, a requestavam. Djamília também gostava de brincar, mas o certo é que sabia dar para trás a todos os que pretendiam adiantar-se. Não obstante, esse assédio sempre me atormentava. Era ciumento dela, como os jovens irmãos são ciumentos das suas irmãs, e esforçava-me por importunar de qualquer maneira os moços que dela se aproximavam. Empertigva-me e olhava-os com tal malevolência, que era como se lhes dissesse: «Não armeis em engraçados. É a mulher de meu irmão e não julgueis que não haja alguém para tomar a sua defesa!»
Em tais momentos, com um à-vontade deliberado, surgisse ou não oportunidade, misturava-me na conversação e tentava meter a ridículo esses galanteadores. Mas, se não atingia os meus objectivos, então perdia todo o domínio e exibia claramente a minha hostilidade.
Os rapazes perdiam-se de riso.
-- Oh! reparem nisto! Custa a crer que ela seja a sua djené, é tão engraçado, e nós, que não sabíamos!
Caía em mim, mas o ultraje escaldava-me traiçoeiramente as orelhas e trazia-me as lágrimas aos olhos. Djamília, minha djené, compreendia-me. Contendo a custo o riso, punha uma cara séria.
-- Pensais que se pode maltratar à votade os djené? -- dizia ela, em tom de desafio, aos djiguites. -- É natural que seja assim em vossas casas, na nossa, não! Vamo-nos, meu kaini, e passem por cá muito bem.
Pavoneando-se diante deles, Djamília erguia arrogantemente a cabeça, dava de ombros com ar provocante e, partindo comigo, sorria em silêncio.
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páginas 28 - 31
em «Djamília» de Tchinghiz Aitmatov
edição Livro de Bolso, Portugália Editora
terça-feira, 20 de dezembro de 2022
segunda-feira, 19 de dezembro de 2022
MI com os avós
quarta-feira, 14 de dezembro de 2022
Postal da vida de um filho pródigo
segunda-feira, 12 de dezembro de 2022
sábado, 10 de dezembro de 2022
sexta-feira, 9 de dezembro de 2022
Eu como António Gancho
«Eu como António Gancho»
óleo sobre tela
60cm por 45cm
2022
ZMB
ILLUSTRAZIONE
Faço um poema e nasce uma cidade
invento o conteúdo geográfico das coisas.
Escrevo um nome e nasce Dublin
porque Dublin escrevi.
Se onde ponho um traço nasce uma via de ferro
então é um comboio em direcção a Roma.
Faço uma cidade e vejo-me um néon
ponho um anúncio e nasce cigaretta.
O italiano compõe o soar da palavra
eu dou uma entoação ao segredo do fim
Se há um horizonte para divulgar o Sol
há uma expectação para divulgar o coração
Se há um moinho para os lados de Perpignan
há Daudet a repousar o Sol numa cadeira
Se há Avignon, uma festa, a França, a Península Itálica,
Burgos e todas as catedrais espanholas
há uma cidade cheia de Sol a compor a direcção
Se o mar fica no fim
Lisboa fica ao pé de Lisboa fica súbito
como se o Tejo fosse um braço decepado
e um cacilheiro total o pano de uma bandeira
Pensa-se no rumor tribal que inunda todas as ruas
faz-se um boulevard duma avenida nossa
põe-se Lautréamont a inventar um prédio.
Há a loucura a iundar a parede
o relógio que
se primeiro bateu na cabeça de Poe
bate depois no sangue feito do conto
divulgado no livro
Lê-se o fígado do poeta no álcool derramado
sobre o desmaio de Ligeia
se esta tem as mãos ebúrneas nasce âmbar
nas mãos brancas duma conceição tripartida.
Ah, se onde ponho a imaginação nasce um lírio
derramem-me a história duma amante sobre a cabeça
pois sou o amante duma perversão absoluta.
Não rasgues o sentido do ombro aí onde tens o tatu do destino
e aí onde só a virgindade do teu androceu malino
pode factar a dimensão do totem a inundar de carácter
todo o céu africano.
Ah, nasça-me um árabe de luz com seu corpo moreno
contradizendo a logia
nasça-lhe uma idade de rosto sua idade gidiana
para compor a tenda com precaução indefinida.
Reveja-se o jeep inglês de Lawrence
que inundava o deserto duma celtidade absoluta,
o zénite solar sobre o bico da tenda.
Só a imagem dum rio pode dar ao poema
toda esta noção geográfica que o poema não tem.
Bramaputra
se nasceres no papel vou dizer à ondina do gnomo
que a floresta não constrói.
Ponho uma fonte a cantar na cabeça do gnomo
e o gnomo surge e nasce
como o ícone divulgado.
É rica a mitologia germana
para dar um sentido ao godo que de chifres na cabeça
usa um segredo quotidiano pendular
que é o pulso esquerdo de uma fêmea.
Põe-se-lhe a data
e o poema nasce
rubicundo
como a ponta dum lápis
que escrevesse no registo
o nome macho dum bebé.
I achieve
I finalize
eu acabo
eu finalizo.
É o poema terminado.
António Gancho
quarta-feira, 7 de dezembro de 2022
Bebê bebé
domingo, 4 de dezembro de 2022
sábado, 3 de dezembro de 2022
Mi com os pais
«Mi com os pais»
aguarela sobre papel tamanho A3
2022
ZMB
(A linha preta foi desenhada com marcador de preto permanente)
quinta-feira, 1 de dezembro de 2022
O Senhor Fumo
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O Senhor Fumo sempre foi duro com toda a gente, mas antigamente as suas opiniões e o seu modo de as dizer chocavam mais, as damas saíam da sala a chorar quando ele se punha a bitaitar, as mais velhas benziam-se e diziam «aquele filho da senhora sua mãe há-de arder no inferno, ora lá... pôr-se a dizer ao pai que haveria de fumar uma broca na tumba dele na tarde do seu funeral, não passa de um drógado, cruzes!»
Mas o que nem toda a gente sabe é que o Senhor Fumo sempre foi igualmente mau consigo próprio. E porquê? Havia uma explicação: ele considerava-se uma fraude. Uma fraude porque, dizia ele, nada era já real, verdadeiro e factual, passível de ser verificado. Uma fraude mas, se calhar, era apenas a sua consciência a lembrar o quanto havia mudado de opinião em relação a muitos assuntos, talvez se chame a isso maturidade mas o certo é que estava agora muito diferente dos tempos em que havia sido um jovem rebelde, daqueles que fazem por dar nas vistas pela excentricidade das suas atitudes em lugares de convívio público. Um exemplo concreto: chamavam-lhe Senhor Fumo porque costumava queimar haxe nos bares que frequentava e à vista de todos os noctâmbulos, depois fumava com orgulho, passeando o perfumo pelo meio da pista de dança ignorando todos os pedidos de partilha, ignorando até o perigo de o identificarem como marginal e lhe chamarem a polícia.
Vive agora quase só dessas memórias acontecidas, tornou-se um pouco indiferente ao correr do tempo porque, como dissera à sua mãe num almoço: «Hoje, a vontade existe mas o corpo já não aguenta. Às vezes, não me importava de fazer uma noitada como há vinte anos e voltar no primeiro autocarro da manhã às seis... já não tenho vida.»
O que Fumo quis de facto dizer mas não disse seria a verdade, seria contar que já não tem pulmões para fumar como antigamente, contar que, de manhã, os primeiros charros fazem-no tossir bastante, os lenços de pano salvam-no mas, começou ele em pensamento a compreender: já não tenho qualidade de fumo, tenho que reduzir, tenho de seguir o conselho do Gil e nunca fumar em jejum, ao acordar beber primeiro qualquer coisa quente, pôr um pão no bucho e só depois de bem acordado fumar o bóbe. e aí... ah!, ir ver estátuas egípcias ao museu e, depois, entrar num café com logradouro aberto até às duas da manhã, sonhar com a princesa e fazer o desenho desse desejado evento amoroso escrevendo para terminar um qualquer pormenor psicogeográfico como título para que, no futuro, ela possa ser minha de novo.
Mas tudo isto são apenas devaneios, impressões poéticas, ele sabe que a princesa não voltará. Ela um dia veio na forma de outra mulher, e Fumo viveu com ela duas temporadas. É inútil dizer que a culpa foi só dela. Ele sonhou com um pôr-do-sol a dois mas as únicas coisas dessa relação que sobraram para semente foram a sua tábua de passar a ferro, os seus olhos furibundos e os vampiros de Remon Chambi, porquê?!
Ele lembra-se porquê mas não o disse aos pais nesses almoços de regresso à casa paterna, tal e qual um filho pródigo, tal e qual: volta meu filho que estás perdoado!, não disse aos pais que uma noite, uns anos antes, chorara sozinho num jardim depois de ver um filme, onde um grupo de malucos institucionalizados havia arranjado maneira de ganhar dinheiro com o seu trabalho na Terapia Ocupacional. Sentira-se sozinho, desesperado e sem amigos no mundo. Porque na noite anterior à do filme ele, bêbado, insultara um gajo, que pensara ser seu amigo e que não levaria a mal a brincadeira estúpida. Acabara com um olho negro e com a frase «como vou eu arranjar dinheiro agora, como vou eu manter-me aqui, se todos me olham de lado e ninguém me dá trabalho?», porque acabara internado com delírios paranóicos, na Urgência tinha feito o possível para ser preso numa prisão em vez de no hospital, mas ninguém acreditou nele, julgaram-no doido, só um doido se apresentaria aos doentes em espera ao lado dele na Urgência como fornecedor gratuito de ganza, porque quando finalmente saiu da Casa Rosa, saiu reformado por invalidez.
Na altura, a depressão pós-internamento deixou-o sem vontade de nada, percebeu finalmente que tinha pés de barro, queria ser e desenhou-se leão ou lobo mas era apenas um gatinho alimentado a biberão e, por isso, não era ninguém e ninguém o queria como companhia, tinha andado anos a enganar-se, tinha batido no fundo. Os rabiscos que começou a desenhar não faziam sentido mas desenvolveu uma técnica de desenho: fazer e fumar um charro olhando uma folha branca de papel, deixar cair a cinza sobre a folha e desenhar aí um ponto, às vezes uma linha, repetir o processo todo e, depois, rodar a folha até ver aparecer nessas marcações de tinta um princípio de rosto, a fulguração de um corpo humano ou de um animal atávico, um dinossauro que lesse livros e lhe sugerisse uma frase que colasse todos os cacos da sua consciência, que desse relevância e explicasse o seu dia-a-dia.
O Senhor Fumo chama a esses riscos de desenhos marados, porque surgem muitas vezes do nada, do vazio e do branco da página mas que por captomancia divinatória se transformam em slogans com conteúdo pertinente no seu microcosmos.
O Senhor Fumo não é o pintor ZMB, é apenas mais um alter-ego zeligiano, uma construção, alguém que vos apresenta uma versão distorcida do seu mundo nesta zine.
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Texto de Claudio Mur para uma futura zine da Opuntia Books
http://opuntia-syndrome.blogspot.com/
https://www.instagram.com/opuntialemos/
quarta-feira, 30 de novembro de 2022
Brasile: Musica Nera di Bahia
domingo, 27 de novembro de 2022
Eu disse: você é filho de cobra. Você é cobra também. Seu nome vai ser Urutu.
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Quando fabricamos o primeiro vinho da jurema, fizemos um festa muito alegre. Bebemos e cantamos muito. Era tudo alegre. Cantamos para os nossos mortos em Jacuípe, celebramos nossos guerreiros que tombaram naquele dia para salvar as nossas vidas. Quem cantava contava aquela história, e falava o nome de cada um dos nossos que tinham morrido.
Depois, fizemos muitas outras festas: a festa da colheita da batata, a festa do milho, a festa da mandioca, a festa da caça e também a festa da pesca. Eram muitas festas que fazíamos, alegres, com cantos e danças e muita bebida.
Os caçadores iam longe, reconhecer as distâncias, saber se havia curraleiros por aquelas regiões, porque eles podiam nos atacar de novo. Tínhamos visto que eles eram muito perigosos para nós. Ou eles faziam de nós prisioneiros para seus escravos, ou nos matavam. Eles pegavam nossas crianças e levavam pra suas fazendas. Cortavam nossas mãos, cortavam nossos pescoços, quebravam nossas cabeças com paus, com pedras. nos feriam com muitas balas que saiam de suas armas. Por isso, tínhamos medo que eles nos achassem.
Dinaman fez a cabana pra mim, longe de todos, pra eu poder esperar meu bebê, e depois, pra eu fazer meu resguardo. Me ensinou um caminho por onde eu podia ir sozinha até um lugar no Riacho dos Umbus. Eu ia lá, tomava banho e voltava. Ele trazia caça para eu comer, trazia peixe. Eu tinha panela, tinha ralo, tinha testo para assar a mandioca e fazer farinha. Todo dia eu cozinhava, eu moqueava caça, assava batata e ficava esperando o dia que meu filho ia nascer. Eu ia matar meu bebê e depois comer. Não ia jogá-lo na terra para as formigas comer. Ele ia voltar para o mesmo lugar de oonde tinha vindo, dentro de mim, onde bichos não podiam comê-lo.
Então chegou o dia. Eu estava sozinha quando ele nasceu. Mas na hora que ele nasceu, minhas mãos não quiseram que eu matasse. Meus dedos encolheram quando eu quis tapar sua boca e seu nariz. Eu escutei a voz dele. Ele chorava. Eu fiquei olhando pra ele. Era homem, mas não vi o homem branco nele. Ele era igualzinho aos bebês de meus parentes. Então eu pensei: ninguém vai saber, ele é igual aos outros. Só os olhos. Os olhos eram um pouco descorados. Não tinham o preto dos outros. Olhos de água de lagoa, ou puxando aos da cobra verde. Eu pensei: ele vai ser valente como uma cobra. Traiçoeiro como a cobra surucucu. Vai saber se esconder pra atacar o inimigo quando ele menos esperar. Eu arregalei os olhos dele com os meus dedos pra ver mais, e o meu coração tremeu.
Abandonei o plano de matar. Cortei o cordão com uma pedra e fui mergulhar com ele nas águas do riacho. Eu disse: você é filho de cobra. Você é cobra também. Seu nome vai ser Urutu.
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«O Língua», página 22 - 23
Eromar Bomfim
Edição VS, 2022
https://youtu.be/d2VvBLeCQ9w: «A voz que cura»
sexta-feira, 25 de novembro de 2022
O Pensamento de Shivana Ribeiro, imperatriz do Povo de Além cuidando do Povo de Cá
Não será um pensamento elitista, mas a maioria das damas que anda nas redes sociais, quase que aposto, nem que seja por solidariedade feminina subscreverá estes vinte penáltis, acho mesmo que até a Liga de Chá anti-ZMB poderá dizer alguma coisa eheheh mas isso sou eu a ter soledades do tempo em que todos andávamos a cavalo trocando flores e cigarros.
Atão aqui vai:
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PENÁLTIS
Pensamentos de Shivana Ribeiro:
1
O casal é conhecido no divórcio,
Os irmãos na herança, os filhos na velhice e
Os amigos nas dificuldades.
2
Um bom marido não é um homem rico ou bonito.
É um homem que sabe o valor de uma mulher...
3
Meu pensamento do dia
O coração de uma mulher é como um instrumento musical,
Pois nas mãos certa pode emitir notas incríveis.
4
Seja o tipo de mulher que quando os seus pés pisam no chão todas as manhãs o Diabo diz ó merda, ela está de pé!
5
Descutir com pessoas que não aceita á verdade é como dar remédio a uma pessoa morta.
6
Amizade não se compra e nem se vende
aqueles que vai para o Facebook, o WhatsApp, e etc. E mente não é honesto não tem caráter, e brinca com a confiança das pessoas, espero que não me peça amizade
7
Este pensamento do dia,
é para alguns amigos.
A confiança, honestidade, e o
caráter.
E como papel depois de a maçado
Só presta para jogar fora
Se não tem está 3 coisas não merece ter amigos. E tão pouco ser meu amigo ou minha amiga.
8
A coisa mais preciosa é o tempo.
Então seja sábio e não desperdice
9
Não gastes mensagens como quem
não responde.
Não gaste palavras com quem não te escuta.
Não gaste a vida com quem não merece.
10
Pensamento do dia
A verdade pode machucar,
é sempre mais digna.
11
Na forma ou na lama,
valorize sempre quem te ama.
A beleza chama atenção, mas a dignidade conquista o coração
12
A violência é um
Refúgio dos incapazes
13
Meu pensamento do dia.
A gente só descobri a
Importância de
um abraço
quando precisar de um
14
Bom Dia para ser feliz não tem idade
15
Existe pessoas,
que não procura beleza, mais um grande
amor. Para sua vida.
16
Amigos é com vento
as vezes perto, as vezes longe mais são é ternos no nossos corações.
17
Meu pensamento do dia
A vida te ensinar que nem todo mundo é seu amigo.
18
Meu pensamento do dia hoje é um ditado brasileiro:
Quando me vêm com estorinha eu desço do salto e rodo a baiana
19
Ele me faça um favor
suba ou desça
da Shivana se esqueça
20
Os rios não bebem sua própria água
As árvores não comem seus frutos
O sol não brilha para si mesmo
E as flores não espalham sua fragrância para si
Viver para os outros é uma regra da Natureza
A vida é boa quando você está feliz
Mas a vida é muito melhor quando os outros estão felizes por sua causa.
"
anonim@s do séc. XXIII
terça-feira, 22 de novembro de 2022
O passado explica o porquê das coisas. Comparado com isto não passo de um betinho. Á beira disto, a minha miséria exstencial é apenas «queixinhas»
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Bom... saí da minha cidade onde minha mãe morava em Nova Cruz e fui viver em Natal em Rio Grande do Norte onde eu nasci, morava no Morro da Mãe Luísa, na época lutava capoeira e conhecia todos os traficantes que viviam no bairro e todos eles me respeitavam como também eles tinham o me respeito. Eu era careta na altura, nunca tinha usado droga, não sabia o que era haxixe, só o que era maconha, só nunca tinha usado. Mas passei a usar, e gostei. Pelo menos, eu relaxo, fico tranquila, não faço mal a ninguém, porque as pessoas dizem que as pessoas que usam droga é para fazer mal aos outros... é mentira, isso é uma pura mentira!, isso é uma justificativa, porque não sabem o que estão dizendo, porque eu uso droga e não faço mal a ninguém, deito na minha cama, tomo a minha cerveja, vou para o computador, brinco com o meu jogo, falo com os meus amigos e minhas amigas e olha... estou numa boa, estou tranquila. Mas os preconceituosos dizem que a gente usa droga pra fazer o mal. Isso é mentira. Faz mal quem já está com a cabeça cheia de merda, já com vontade de fazer aquela merda, de invadir uma casa, destruir família, de matar, roubar. Mas não é por influência da droga, não, isso é mentira, uma pura mentira.
E não achas que a droga pode potenciar ou intensificar certos pensamentos ou certas reacções...
Comportamentos...
Comportamentos... ou seja, e a gente está... como a droga nos altera a consciência, nos põe num estado mais...
Elevado...
Elevado mas alterado de consciência...
Sim... passa muita coisa pela cabeça...
Não é pela droga mas não achas que a droga poderá... ou seja, a gente está...
Influenciar...
Certos comportamentos... quando a gente, quando alguém vem de fora falar connosco e nos põe em causa, o nosso ser... nós pra nos defendermos e defender o nosso acto...
Não. Não acho. Eu acho que o sujeito que aborda já vem com pensamento mau.
Exacto.
A gente [nós] estamos tranquilos, estamos fumando um charro, tranquilos, viajando na nossa, pensamento bom, não sei, eu pelo menos quando fumo um charro viajo na maionese, penso em viajar, ser feliz, ter um grande amor, é isso o que eu penso, na minha vida eu quero é ser feliz, eu tenho direito a isso, se Ele me pôs no mundo com algum objectivo foi, Ele não me pôs no mundo à toa, pois não?
A música diz «a tua beleza brilha tanto».
É, a minha beleza brilha um caralho, a minha beleza brilha no cu como estrela.
Concentra-te na música agora.
Mas, menino, tem as fotos, há mais marés que marinheiros, a minha Iansã vai tomar conta, certo?, só pega na rodilha quem pode com o pote e ele não pode com o pote, porque com espírito ele não brinca, porque ele não vê, certo?, e eu vejo, é por isso, Ru, não queira ver o meu lado negro, tu sabes qual é o meu pensamento? Eu vou destruir... eu não, alguém, alguém vai tomar conta dele prá mim...
«your beauty shines so...», canta Sheila Chandra no leitor de cedê.
Era uma vez, uma cachopa bem gira chamada Shivana...
Ainda bem que o meu nome não é esse...
Era uma cachopa que andava no trapézio a fazer malabarismos... foi o que ouvi dizer, contaram-me essa história, ela fumava muita erva.
E falava pelos cotovelos.
Fumava muita erva, ela foi iniciada no morro.
Não, ela não foi iniciada no morro, o morro não inicia ninguém, a gente faz o que quiser, porque eu já conheci muita gente humilde no morro que me deu abrigo, comida, roupa, sapato... e não me ofereceram nem cachaça nem droga. Então portanto, tem muita gente humilde ali dentro, tem muita gente boa.
Pois tem.
Mas o mundo é hipócrita.
Pois é.
O mundo só quer saber Capitalismo, cash, dinheiro, os pobres ficam de lado, certo?, é a massa, a massa podre, é a massa podre, mas sabe porquê?, por conta e culpa de quem?, de nós mesmo, porquê?, porque elegemos esses filhos da puta.
Pois é.
Nós somos os próprios culpados.
É, quem vota e até quem nem vota, porque se formos a ver quem não vota são praí quarenta porcento...
É por isso que... numa coisa... em Portugal...
Diz... «Em Portugal...»
Era uma coisa que eu gostava... era do tempo de Salazar!
Estragaste tudo, ooooó, vou ter de cortar esta história, vou ter de cortar o gravador...
Era igual ao Hitler!
E gostavas do Hitler?
Gostava não, gosto!
Gostas do Hitler?
Gostava não, gosto. Sabe porquê?, porque intruso só atrapalha, intruso tem de morrer, certo?, intruso tem de morrer, mas um pai de família não, um pai de família não deve morrer, um pai de família, ele está lutando pela família dele... e isso eu sou contra o Hitler porque ali...
Mas ele matou muitos pais de família...
Uuuuui!, e não só, e não só, meu querido, matou também criança...
E continuas a defender o Hitler?
Não...
Então como podes dizer que...
Eu estou dizendo que eu, se fosse naquela época, eu apoiava o Hitler...
Mesmo sabendo que ele matava crianças e mães e pais...
Não não, eu aí também me ia revoltar e ele iria me fuzilar claro.
Apoiavas ou não apoiavas, diz lá!
Aos bandidos, aos bandidos...
E se ele te considerasse uma bandida?
Olhe, podia botar no paredão que eu ia morrer pode ser.
Então continuas a dizer que apoiavas o Hitler? Fala lá, diz aí, perante estes factos...
Não. Deixa eu... peraí, eu vou dizer, vou explicar.
Explica bem.
Eu gostava do Hitler numa coisa...
Em quê? Explica aí!
Ele foi um filho da puta que matou...
Seis milhões de pessoas!
Ui!
Pelo menos seis milhões de pessoas!
Isso é o que nós sabemos.
E não foi só judeus [e ciganos e malucos e gays e drogados] que ele matou, matou também muitos na guerra, morreram muitos a combater...
É por isso que eu estou dizendo, seis milhões nas câmaras de gás, criança, pai, mãe, avô...
Eles antes de irem para o gás tiravam-lhes os dentes de ouro, os anéis...
Não venha me ensinar o pai nosso e a avé maria tábem
E ia tudo para o armazém...
Eu sei...
Venderam esse ouro todo...
Eu assistí ao documentário e à Lista de Schindler.
Prontos, então explica aí ao gravador porque é que gostas do Hitler afinal de contas.
Olha, eu gostava do Hitler uma coisa...
Diz aí, explica! Explica!
Calma!
Desculpa. Fala. Leva o teu tempo. Mas explica bem.
Eu queria ser como ele, eu queria ser como ele... mas para fuzilar os bandidos, entende? Era isso que eu queria dizer...
Os bandidos...
Isso.
Sim... os bandidos. Mas que bandidos?
Não pais de família...
Que bandidos?
Por exemplo... estrupador.
Sim, estrupador. Mais. Quem é que querias que ele fuzilasse mais?
Calma, deixa eu pensar.
Estrupador, «violador» em português.
É violador de pessoas, principalmente de adolescente...
E de crianças também.
Pois. Adolescentes, crianças...
Seis anos, às vezes menos, bebés.
Bebés. Isso eu botava no paredão, porque isso não merece viver, caralho!
Num merece, estrupador. Mais?
Deixa, deixa eu pensar, tábem?
Só está saindo «estrupador» porquê? Porque fui violentada?
Claro, mulher, claro! Obviamente que é por causa disso. Isso é grave, o que te aconteceu é grave, é por isso... mas não precisas de ser um Hitler, não precisas de ser um Hitler nem precisas de ser a amante de Salazar, que é a tua fixação. Não é?
Me fizeram mal, entende?
Eu sei. Eu sei. Eu sei que fizeram...
Apesar de... quem me fez mal... está debaixo da terra, já não existe. Quem me fez mal já está debaixo de sete palmos, é assim meu amigo, ele tinha voz de quem tinha tudo na vida...
Que idade tinhas?
Dez anos. É pau para toda a obra. A gente saía galopando a cavalo, eu quase na cabeça do cavalo... eu sei que tu és uma pessoa não-religiosa, mas por eu falar de Deus não vai te afligir, pois não? Minha casa é fria, estou tremendo de frio.
Pois estás, chega aqui que eu aqueço.
Ru...
Diz, querida?
Obrigada por estares do meu lado.
Eu compreendo, eu percebo-te, não penses que não.
Aleluia, feijão no prato e farinha na cuia.
Ela não pode cantar mais, a Sheila tem uma doença rara em que cantar, mesmo falar lhe faz «arder» a garganta.
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anonim@s do séc. XXIII
segunda-feira, 21 de novembro de 2022
Janus diz
sábado, 19 de novembro de 2022
Na paragem de autocarro
quinta-feira, 17 de novembro de 2022
Sobrinhos Bia, Ric e Mi
aguarela em tamanho A3 mais moldura
(A linha preta foi desenhada com marcador de preto permanente)
2022
ZMB
segunda-feira, 14 de novembro de 2022
Tuíte roubado a Satie
domingo, 13 de novembro de 2022
sábado, 12 de novembro de 2022
sexta-feira, 11 de novembro de 2022
Contagion Dub
terça-feira, 8 de novembro de 2022
4 ou 6 dedos: to be or not to be
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Na mão esquerda de Pagreus falta um dedo. Muito se tem dito sobre este dedo, sem se ter dito a verdade. Diz-se, enfim, aquilo que é habitual dizer-se quando nada se sabe. Os restantes dedos são extraordinariamente longos, o que lhe permite abranger mais copos do que o normal.
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página 79
«Cadernos de Bernfried Jarvi»
Rui Manuel Amaral
edição Livraria Snob
quinta-feira, 3 de novembro de 2022
Na Revista eSTUPIDa #9: Ficar sem pilinha
Na Revista eSTUPIDa #9
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As imagens sucedem-se sem cor, desfocadas, quase ao ralenti, uma após outra são imagens paradas de uma paisagem em fogo e onde o único movimento é o fumo esvoaçando das casas queimadas. Deodato acaba de perceber que está dentro do filme porque uma imagem o mostra reflectido num vidro de loja em cacos vestido de repórter fotográfico, as moscas zumbem na imagem, e Deodato dorme no sofá de descanso da recepção do hotel onde trabalha no turno nocturno.
A vida anda pacífica, o trabalho corre-lhe bem desde que conseguiu dar a volta à dona Assunção, a senhora invisual de sessenta e poucos anos que está hospedada connosco há mais de um ano. Dar-lhe a volta significa fazê-la confiar em mim, ela que não é cega de nascença e perdeu a visão devido a um erro médico não tendo sido indemnizada por sendo pobre, iletrada e de um meio desfavorecido, não ter amigos que por ela intercedam dentro da SS, a vulgar assistência social.
Devem ser quatro e meia da manhã, Deodato continua a sonhar, avança pela guerra adentro e vê os soldados forçando as portas, entrando nas casas, roubando o recheio, enforcando os locais suspeitos de sedição, matando os velhos, estuprando crianças, Deodato entra atrás de um deles e vê a dona Assunção perguntando quem está aqui, o soldado firma-lhe o cano da Browning na testa, desaperta as calças, força-lhe a cabeça, Assunção, a cega, debate-se, resiste, leva chapadas, por fim, enjoada começa o serviço, o soldado a princípio relaxa-se, depois excita-se, depois... grita, a valente dona Assunção morde-lho com tanta força que o arranca fora, a boca cheia de sangue, o soldado sangrando das virilhas... numa questão de segundos uma coronhada desfaz o crânio da dona Assunção, Deodato acorda, estão a bater à porta de entrada, é um casal que quer um quarto, digo-lhe que estamos cheios e não temos quartos, olha para o relógio: cinco e meia da manhã, hora de fazer o balanço da noite que termina e abrir o dia no hotel com as reservas de quartos que vão entrar hoje.
— Mas que cena que eu fui sonhar! Vou masé lá baixo ao quarto dela acordá-la, está na hora de a acordar, são quase seis da manhã, nem sei porque sonhei isto, deve ter sido por causa da guerra no mundo, vou fazer um desenho hoje para fixar o momento em que Assunção subiu ao céu onde repousam todas as vítimas deste mundo e, quem sabe, se esta desgraça sonhada e transformada em desenho não faz com que a minha cega receba finalmente o apoio que tanto merece da SS, a assistência social. Eu, por mim, vou continuar a fazer tudo para que ela viva bem aqui connosco neste hotel.
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Claudio Mur
«Ficar sem pilinha»
óleo sobre papel tamanho A2
2022
ZMB
terça-feira, 1 de novembro de 2022
Despojos da guerra
«Despojos da guerra»
óleo sobre papel tamanho A2
2022
ZMB
Este trabalho está presente na Revista Estúpida #9
domingo, 30 de outubro de 2022
Pensamento da noite
sábado, 29 de outubro de 2022
Revista EstúpidA #9 e «O senhor da guerra»
Já está disponível a revista EstúpidA #9 pela mão das Edições Mortas
Quem estiver no Porto hoje, Sábado dia 29, passe pela Feira de Coleccionismo no Centro Comercial Cedofeita até às 18h e se estiver curioso/a folheie e talvez adquira alguma coisa.
Colaboram os autores que aqui se enumeram:
https://edicoes-mortas.blogspot.com/2022/10/olhem-quem-acaba-de-chegar-eis-estupida.html
A capa é da minha autoria
«O senhor da guerra»
óleo sobre papel tamanho A2
2022
ZMB
sexta-feira, 28 de outubro de 2022
As conversas ao almoço sobre ideologia
quarta-feira, 26 de outubro de 2022
The focus of life
terça-feira, 25 de outubro de 2022
segunda-feira, 24 de outubro de 2022
As formas de Rosa
As formas de Rosa
As formas de Rosa
lembram-me peixes.
Elas são brancas, lácteas,
as formas de Rosa
são pura razão.
Nas formas de Rosa
estão os peixes, o lago, o arco, o mar,
está um bocado de Céu a sombrear,
e eu amo Rosa.
Quero Rosa. Rosa quer-me a mim amar.
Eu sei que há entre mim e Rosa
um romance que nunca chegou a começar
e eu então ao pensar em Rosa
faço rios, fios de poesia e falo-lhe sem ser em prosa.
Porque um dia Rosa há-de ser minha
na concepção que tinha
à esposa que nunca tive e não quero
faço a amante
e é aí que desespero.
Que neste poema cante o que quero.
Nas formas de Rosa estão os peixes que me altero.
António Gancho, em «Gaio do espírito»
integrado no volume editado pela Assírio & Alvim em reedição 2022
que reúne os seus quatro livros, este volume tem o nome do seu primeiro livro: O Ar da Manhã
sábado, 22 de outubro de 2022
O verdadeiro trabalhador útil
sexta-feira, 21 de outubro de 2022
«Ontem a IL obliterou Liz Truss da sua ala política. Nem Estaline foi tão pronto a obliterar camaradas.», subscrevo
Transcrevo o final da crónica de Carmo Afonso no jornal Público, dia 21 de Ôutubro de 2022:
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Uma fã de Margaret Tatcher que tentava seguir as suas passadas e resgatar os valores conservadores fundamentais, acaba por ser comparada a José Sócrates. Nada corre bem a Liz Truss. Diminui a receita fiscal entre os mais ricos, mas acabou por assustar os próprios mercados financeiros e provocar uma queda acentuada no valor da moeda. Isto foi o que aconteceu. Mas vamos à análise da IL: Liz Truss aumentou a dívida pública como os socialistas fazem.
Não é má análise política o que está aqui em causa. É apenas sobrevivência e a mais descarada lata. Correu mal? É socialismo. Um político caíu em desgraça? Dizemos que é igual a Sócrates. Era um liberal? Mas dizemos que não era um liberal a sério.
Não é só das lições contidas nos 45 dias de governação de Liz Truss que podemos extrair a falta de maturidade da IL para assumir responsabilidades políticas executivas. O partido ontem encarregou-se em definitivo de mostrar quem é: um grupo de irresponsáveis que acreditam que conseguem confundir os portugueses sobre o que é socialismo e o que é liberalismo, enquanto os próprios vão confundindo política com humor e irreverência com desonestidade.
O neoliberalismo já tinha dado grandes provas de não funcionar, mas nunca tinha sido tão rápido. Liz Truss foi absolutamente exímia nesse aspecto. Devemos-lhe isso e, para quem quiser ver, devemos-lhe também esta oportunidade de decifrar o código ético da IL.
Ontem a IL obliterou Liz Truss da sua ala política. Nem Estaline foi tão pronto a obliterar camaradas. Sim, agora todas as comparações com a IL passaram a ser permitidas.
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Subscrevo, e acrescento:
O capitalismo come os seus heróis e líderes e caga os seus escravos, o rico capitalista come miolos da marca Monsanto e o pobre capitalista come tripas de marca branca, vemos isso em todas as empresas privadas e na pressão que se faz no emprego público: adoramos o líder enquanto o negócio corre bem e quando corre mal pagamos a um alienado para o atirar pela janela e no final metemos o alienado na prisão perpétua do hospital.
quarta-feira, 19 de outubro de 2022
Tuíte da tarde
terça-feira, 18 de outubro de 2022
segunda-feira, 17 de outubro de 2022
António Gancho -- Illustrazione
«Illustrazione»
António Gancho em O Ar da Manhã
página 41 - 43, edição Assírio & Alvim
Dois poemas de Cristovam Pavia
DONZELA
Abelhas do sol
Dilatado e roxo
Sugando-me as veias
Até onde eu possa...
Abelhas do sol,
Gargantas de amor,
Beijai-me, levai-me
E deixai-me em flor...
***
LIBERTAÇÃO
Com tuas mãos firmes, sérias,
Com tuas mãos de criança
Que parecem cabritinhos,
Mãos de mãe e folhas de árvore
Nascidas em algum rio,
Frescas e claras, tão cegas...
Vem depressa, sem demora,
Vem rasgar-me as cicratizes!
***
edição Opera Omnia